Tim Lancaster foi arrancado para fora do avião em pleno voo

01/02/2021 às 15:004 min de leitura

Apelidado de “Condado de Glamorgan do Sul”, a aeronave de curto alcance do tipo BAC 1-11 foi produzida pela British Aircraft Corporation (BAC) e teve seu voo inaugural em 8 de fevereiro de 1971, mas só chegou 17 anos depois à companhia aérea British Airways. 

No fatídico 10 de junho de 1990, um BAC 1-11 estava sendo preparado para o voo 5390 da British Airways, partindo do Aeroporto de Birmingham (Inglaterra) para o de Málaga (Espanha). 

O capitão designado a levar 4 tripulantes e 81 passageiros era Timothy Lancaster, mais conhecido como “Tim”, então com 42 anos e detentor de mais de 11 mil horas de voo, das quais 1.075 eram em um BAC 1-11. O copiloto era Alastair Atchison, de 39 anos, com 7,5 mil horas de voo, sendo que 1,1 mil horas era só naquele tipo de aeronave.

(Fonte: JetPhotos/Reprodução)
BAC 1-11. (Fonte: JetPhotos/Reprodução)

Às 8h20 de 10 de junho, Atchison realizou a decolagem do avião e depois passou o controle para Lancaster, enquanto ainda continuavam a subida. Cerca de 13 minutos depois, ambos soltaram seus cintos de ombros, sendo que Lancaster foi o único a afrouxar o cinto abdominal. Quando eles já estavam a cerca de 5,3 mil metros de altura, a tripulação começou a organizar os preparativos para iniciar o serviço de café da manhã para os passageiros.

O comissário de bordo Nigel Ogden tinha acabado de entrar na cabine de comando para entregar o café aos pilotos, quando foi atingido por um estrondo violento: o painel do para-brisa esquerdo, do lado de Tim Lancaster, havia-se separado da fuselagem. A descompressão imediata não só arrancou tudo do lugar dentro da aeronave, em um turbilhão feroz, como também impulsionou Lancaster de seu assento e o “sugou” pela cabeça para fora do avião por meio do para-brisa destruído.

Um homem no ar

Tim Lancaster. (Fonte: NZ Herald/Reprodução)
Tim Lancaster. (Fonte: NZ Herald/Reprodução)

O que impediu o piloto de ser arremessado pelo céu foi suas pernas ficarem presas contra os controles de voo da cabine e o reflexo rápido o suficiente de Ogden para segurá-lo pelos tornozelos. Porém, o tronco de Lancaster dobrou para fora, colando-se ao teto da aeronave e sendo fustigado pelo vento congelante.

Além disso, eles tinham mais alguns problemas: os pés de Lancaster tinham empurrado o manche, desligando o piloto automático e, com a explosão do para-brisa, a porta da cabine de comando foi lançada contra o console central, bloqueando o acesso às alavancas do acelerador. Então, o avião mergulhou em uma queda, ganhando velocidade à medida que descia, chegando a atingir 650 km/h.

Dois comissários, Simon Rogers e John Heward, tentaram ajudar Ogden a trazer o piloto para dentro do avião, mas a força de sucção era forte demais para eles, então chegaram à conclusão de que teriam que aguentar até que um pouso emergencial fosse feito. Eles conseguiram tirar as pernas de Lancaster do painel de controle e posicioná-las sobre o encosto do assento para poder ajudar Atchison a tentar recobrar o controle do avião.

Mayday

Dramatização do acidente. (Fonte: BT/Reprodução)
Dramatização do acidente. (Fonte: BT/Reprodução)

O copiloto reativou o piloto automático enquanto gritava Mayday! desesperadamente para o controle de tráfego aéreo, porém o ruído do vento o impediu de ser ouvido. Ele tentava descer o avião o mais rápido possível para que pudesse alcançar uma altitude com pressão de ar suficiente, porque não havia máscaras de oxigênio para todos, além de que precisava se manter longe da rota de outros aviões (visto que estava em uma das regiões com maior tráfego aéreo do mundo).

Assim que Atchison atingiu uma altitude razoável, ele começou a desacelerar o avião e a nivelá-lo. A essa altura, o corpo de Lancaster já havia deslizado para baixo, expondo seu rosto todo machucado de tanto bater na fuselagem do avião. O piloto estava com os olhos arregalados, e a pele de seu pescoço, à mostra, em um tom acinzentado. Tudo indicava que ele já estava morto, porém Ogden se recusou a soltá-lo porque seu corpo poderia atingir os motores das asas ou o estabilizador horizontal, derrubando o avião.

Até que Atchison finalmente conseguiu ouvir a autorização do controle de tráfego aéreo dando permissão para que ele realizasse um pouso de emergência no Aeroporto de Southampton, na costa sul do Reino Unido. O copiloto levou o voo 5390 até o local indicado, conseguindo fazer um pouso seguro e controlado às 8h55 do horário local.

(Fonte: La Razón/Reprodução)
(Fonte: La Razón/Reprodução)

Os 81 passageiros não sofreram nenhum ferimento sequer, porém a tripulação não teve a mesma sorte. Entre os comissários Ogden, Rogers e Heward, alguns deles sofreram congelamento e tiveram o ombro deslocado. No entanto, a maior preocupação era com Lancaster, que havia sido exposto a ventos de 600 km/h e a temperaturas de até -17 °C pendurado do lado de fora da aeronave.

Alguns minutos depois que os paramédicos removeram o corpo do capitão, ele começou a mexer os olhos e a recobrar a consciência. Tim Lancaster sobreviveu com algumas ulcerações, fraturas no braço direito, no polegar esquerdo e no pulso direito, além de outros hematomas menores.

O que aconteceu no ar?

(Fonte: Clarin/Reprodução)
(Fonte: Clarin/Reprodução)

O Departamento de Investigação de Acidentes Aéreos do Reino Unido (AAIB) abriu uma investigação para apurar o que havia acontecido durante o voo, considerando que um acidente como aquele é muito incomum de acontecer.

Aproximadamente 27 horas antes, às 3h, o Aerospace BAC 1-11 que seria destinado para o voo 5390 estava sendo preparado na garagem de manutenção da British Airways, em Birmingham. Uma das tarefas de revisão foi substituir o para-brisa lateral esquerdo da aeronave, onde ficava o assento do capitão. Então, em vez de o gerente de manutenção daquele turno supervisionar e fiscalizar o trabalho realizado pelos técnicos, ele mesmo decidiu que cumpriria aquela tarefa de troca, embora não fizesse isso há muitos anos. Para piorar, ele também não consultou o manual de manutenção do BAC 1-11 para saber como realizá-lo adequadamente naquele tipo de aeronave.

Enquanto soltava os parafusos do para-brisa, o homem percebeu que alguns deles apresentavam sinais de corrosão, portanto decidiu substituí-los também. No total, eram 90 parafusos do tipo A211-7D, sendo que só 6 deles estavam em perfeito estado de conservação. Ele foi até o depósito local à procura de mais parafusos, mas só encontrou 4 do mesmo tipo no estoque.

(Fonte: BT/Reprodução)
(Fonte: BT/Reprodução)

Antes que pudesse sair, o gerente do depósito alertou-o de que os para-brisas laterais normalmente eram presos com parafusos do tipo A211-8D, que tinham o mesmo diâmetro, mas eram cerca de um quarto mais longos, de acordo com o manual da aeronave. A pessoa que substituiu da última vez já havia feito o serviço errado, mas o gerente de turno simplesmente desconsiderou ambas as informações.

Ele foi até uma ala de autoatendimento de peças e pegou 84 parafusos do tipo A211-8C acreditando que eram do tipo A211-7D após compará-los visualmente com os que estavam em boas condições. Isso porque ambos tinham o mesmo comprimento, mas eram 0,66 cm mais estreitos. Como o espaçamento da rosca era o mesmo dos parafusos, o gerente não notou diferença durante a instalação devido ao ângulo em que ele empunhou a furadeira elétrica.

(Fonte: Alchetron/Reprodução)
(Fonte: Alchetron/Reprodução)

No dia seguinte, não havia ninguém para reavaliar o trabalho feito, pois o gerente de turno tinha sido o responsável pelos reparos e porque os para-brisas nunca foram motivo para dupla checagem. O resultado foi que os parafusos desceram nos orifícios que prendiam o para-brisa à fuselagem e não suportaram a diferença de pressão do ar entre a cabine e a atmosfera externa durante o voo.

O relatório da investigação que acusou a British Airways de negligência impôs análises de garantia de qualidade na companhia aérea, proibição de gerentes de turno autocertificarem o próprio trabalho e realização de dupla verificação em todos os setores de inspeção. 

Além disso, foi decretado para todo o Reino Unido que os engenheiros de manutenção fossem recertificados periodicamente para renovar a licença e garantir que eles não repetissem maus hábitos que geravam insegurança.

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