Nesta semana, notícias reveladoras dos gastos do governo federal com alimentação em 2020 levaram aos trending topics do Twitter uma marca conhecida no mundo inteiro, mas que dificilmente havia frequentado o noticiário político anteriormente: o Leite Moça, ingrediente básico da cozinha brasileira e um elemento básico em festas de aniversário.
Do total de R$ 1,8 bilhão gastos em alimentação pelo executivo federal, o leite condensado ocupou posição de destaque com despesas de R$ 15,6 milhões, um valor considerado salgado por alguns críticos, mas justificado pelo ministério da Economia, afirmando que o leite condensado destinou-se à alimentação das tropas das Forças Armadas.
Dentre as diversas marcas do produto, o Leite Moça, da Nestlé, é a mais conhecida e uma das mais queridas dos consumidores, não só pela tradição, confiança e qualidade, mas também por associá-la a momentos doces, como infância, família, festas, brigadeiros (os doces) e aquele momento em que abrimos uma latinha escondidos e tomamos tudo.
A origem do leite condensado: alimentação de tropas

Associar gastos com leite condensado à alimentação das tropas faz todo o sentido quando consideramos que a invenção do produto, patenteada em 1856, só fez sucesso quando eclodiu a Guerra Civil Americana, em abril de 1861, após longa controvérsia sobre a libertação dos escravos negros nos Estados Unidos.
O fazendeiro Gail Borden descobriu, ao tentar desidratar o leite comum para fazer leite em pó, que o produto se transformava antes em leite condensado. O inventor passou a transportá-lo para os combatentes. O inventor também colocou o produto no mercado e, em 1867, fundou sua primeira indústria dedicada a produzir o leite condensado.
Em 1905, o leite passou a ser produzido na Suíça, fruto de uma fusão entre a Anglo Swiss Condensed Milk Co. e a Nestlé. Na primeira embalagem já aparecia uma primeira versão da jovem camponesa com trajes típicos do século XIX, que vemos hoje e que se chamava La Laitiére.
Chegada do Leite Moça ao Brasil

O leite La Laitiére chegou ao Brasil em 1890, como uma alternativa ao leite fresco, cujo abastecimento era problemático pela falta de refrigeração. Porém, a opção inicial dos fabricantes foi vender o leite condensado em drogarias, com o nome inglês de Milkmaid, pois não havia uma palavra equivalente em português (leiteira era o vasilhame).
O produto fez muito sucesso, pois era misturado à água para se obter o leite integral, que já vinha adoçado, além de poder ser armazenado por muito tempo sem estragar. Porém, a dificuldade de pronunciar o nome em inglês, fez com que os consumidores passassem a pedir nas farmácias o “leite da moça”, referindo-se à camponesa.
Por isso, quando a Nestlé abriu sua primeira fábrica no país, em Araras no ano de 1921, começou a produzir o produto com o nome criado espontaneamente pelos consumidores: Leite Moça. Em pouco tempo, o Brasil se transformaria no maior mercado mundial de leite condensado, posição que mantém até hoje.
A chegada do Leite Moça às cozinhas
Durante a Segunda Guerra Mundial, o leite condensado deixou de ser consumido apenas como leite, e chegou às cozinhas do mundo, passando a ser utilizado pelas donas de casa como um ingrediente fundamental no preparo de doces e sobremesas. A partir daí, as vendas do produto dispararam.
No Brasil, a chegada foi ainda mais espetacular, aproveitando uma paixão pelos doces que vinha dos nossos colonizadores portugueses. Em 1945, um relato folclórico garante que o docinho brigadeiro foi criado por apoiadoras do Brigadeiro Eduardo Gomes à Presidência da República. O militar perdeu, mas o repertório das festas infantis ganhou mais um docinho.
A concorrência e a liderança absoluta

No início dos anos 1960, as receitas passaram a vir no rótulo do Leite Moça: pudim, doce de leite (cozido em banho-maria). Nos anos 1970, os rótulos traziam sugestões para festas típicas: Festas Juninas, Festas de Aniversário, Natal, entre outras. Durante 60 anos, a marca não teve concorrentes no Brasil.
Com o surgimento dos primeiros concorrentes diretos, na década de 1980, como o Mococa e o Glória, o Leite Moça, mesmo com uma liderança de 60% do mercado, decidiu lançar o leite condensado em sabores, o que se revelou um tremendo fracasso. A empresa recuou e apostou tudo no Leite Condensado Tradicional.
Hoje, após diversificar o produto e lançá-lo sob a forma de cereais, chocolates e sorvetes, a marca é líder absoluta. Segundo estatísticas da própria Nestlé, são consumidas por segundo no Brasil aproximadamente 8 latas de Leite Moça, um número que pode ter se elevado a julgar pela relevância do produto nas compras do governo do Brasil.