Juana Barraza: a estranguladora

18/11/2019 às 14:005 min de leitura

Juana Dayanara Barraza Samperio nasceu às 8h30 da manhã do dia 27 de dezembro de 1957 no norte do México, numa cidade de área rural chamada Hidalgo. A sua infância começou corrompida desde o minuto de sua concepção até o dia em que nasceu. De lá até sua vida adulta, tudo apenas piorou de maneira drástica.

Sua mãe, Justa Samperio, era uma prostituta alcoólatra quando conheceu o policial Ted Avila Barraza, com quem manteve uma relação conjugal livre, continuando os seus trabalhos noturnos enquanto passava um pouco de seu tempo com ele. A relação durou cerca de cinco anos até que ela desse à luz Juana e resolvesse abandonar o que possuía com Ted para se dedicar totalmente à vida de amante com Refugio Samperio, um homem casado que conhecera em um dos bares onde usava como ponto de prostituição.

(Fonte: Vanguardia/Reprodução)

Durante sua infância e um pouco antes do início de sua adolescência, Juana não se lembra de ter mantido nenhum contato verbal com a mãe, com quem não possuía absolutamente nenhum vínculo afetivo. Justa a espancava boa parte do tempo quando ela estava por perto. Seu padrasto, a única figura paternal reconhecida por ela em toda a sua infância, também não se importava muito com o que a mulher deixava ou não de fazer com a filha.

Juana nunca foi à escola, por isso jamais aprendeu a ler ou escrever. Aos 12 anos de idade, ela foi vendida por sua mãe para um alcoólatra chamado José Lugo em troca de três cervejas. Durante os cinco anos que Juana viveu encarcerada na casa do homem, servindo como empregada doméstica, ela foi estuprada centenas de vezes, assim como foi agredida. Por conta de toda essa violência sexual, ela engravidou dele duas vezes, sendo uma aos 13 anos de idade e outra quando tinha 16. Em ambos os casos, ela sofreu abortos espontâneos.

A Dama do Silêncio

(Fonte: PWA Wrestling/Reprodução)

Por volta de 1980, quando sua mãe, Justa Samperio, morreu de cirose, Juana finalmente pôde deixar a cidade onde morava para viver na capital do México. Com o passar dos anos, depois de possuir a própria casa e enquanto trabalhava como empregada doméstica e vendedora ambulante, acredita-se que ela encontrou na luta-livre uma maneira de canalizar toda a raiva inconstante que acontecia dentro dela e que, aparentemente, não conseguia entender de onde vinha.

De 1980 a 1990, com um porte robusto e musculoso, Juana passou de aluna a aspirante a profissional, integrando o painel de lutadoras de um dos muitos centros de lucha libre que existiam na Cidade do México. Caracterizada com máscaras e roupas extravagantes e coloridas, a luta livre conferiu à mulher o nome fantasia de "A Dama do Silêncio", por conta de sua timidez e introspecção, tanto dentro quanto fora do ringue.

Em meio a turnês de cidade em cidade pela área central do México, Juana Barraza teve quatro filhos, todos de pais diferentes. E apesar de aparentemente possuir uma relação estável com eles, como mãe e pessoa, o infortúnio continuou a seguir Juana como se fosse sua própria sombra. Seu filho mais novo morreu ainda bem jovem depois de ser atacado por assaltantes que o espancaram até a morte com um taco de beisebol. Sua segunda filha casou-se e deixou a casa onde moravam quando ainda era menor de idade, embora tenha permanecido pelas redondezas.

Juana ficou com os outros dois filhos, um garoto de 13 e uma menina de 11 anos de idade, que logo foram deixados aos cuidados de sua irmã mais velha depois de todo o horror que viria a acontecer. Apesar de tudo, a mulher se orgulhava de ter sido o mínimo do pai e da mãe que não teve durante a sua infância.

No decorrer dos idos anos de 1995, com pouco dinheiro entrando das faxinas e do que ganhava como lutadora, Juana passou a cometer furtos em lojas que rapidamente evoluíram para assaltos a residências. Assim, em 1996, junto de sua amiga Araceli Martinez, elas começaram a se vestir como enfermeiras para conseguir acesso à casa de idosos e poder roubá-los. O que a mulher não imaginava era que Araceli, que estava em um relacionamento com um policial federal corrupto chamado Moisés Flores, traçou um plano junto com seu namorado para poder extorquir 12 mil pesos de Juana em troca de não prendê-la durante um asssalto no qual a rendeu.

No início dos anos 2000, quando Juana se aposentou da luta livre, onde chegava a ganhar 500 pesos por luta, a sua situação financeira atingiu um nível alarmante e tudo o que havia dentro dela quis saltar para fora.

“El Mataviejitas”

(Fonte: TKM/Reprodução)

Foi durante o ano de 2002 que o índice de assassinatos e roubos a propriedades de idosos começou a aumentar na Cidade do México. Era o desespero de Juana Barraza ganhando finalmente liberdade, em combustão com toda a raiva armazenada dentro dela por tempo o suficiente para destruir o resto dos sentimentos bons que ainda podia nutrir. Acredita-se que, apesar do momento de dificuldade financeira que ela atravessava, os assassinatos não foram motivados por dinheiro.

Foi no dia 25 de novembro de 2002 que Juana Barraza bateu à porta de uma senhora chamada Maria de la Luz González. Usando uma credencial falsificada, ela alegou ter sido enviada pelo governo para prestar um tipo de assistência médica. Uma vez no apartamento da idosa, a ex-lutadora disse ter ficado com raiva dos comentários depreciativos que Maria fez e, por isso, espancou-a e a enforcou com as próprias mãos até que ela morresse.

Depois do primeiro assassinato, levaram três meses até que Juana atacasse novamente. Pois, em contraste com essa sua fúria desenfreada, havia uma coerência sistemática e maligna na maneira como planejava e encontrava as suas vítimas: através de uma lista de mulheres que estavam em um programa de assistência médica do governo que ela acabou conseguindo adquirir, Juana identificava apenas mulheres idosas e que moravam sozinhas.

De um crime, rapidamente Juana chegou à marca de 40 assassinatos, todos eles por estrangulamento, sempre com as próprias mãos ou com objetos que possuíssem fios. Ela as espancava, geralmente com golpes na cabeça, mas não fortes o suficientes para que levassem à morte imediata. Todas as vítimas eram mulheres com mais de 80 anos de idade, solteiras ou viúvas, que moravam sozinhas em suas casas. A motivação de Juana era apenas a raiva, o que fez os psicólogos concluírem de que a mulher projetava em suas vítimas o rancor do relacionamento deficiente que ela tivera com a mãe.

Essa onda aterrorizante de assasinatos em série que ainda não havia sido documentada na história do México deu o título à Juana de “El Mataviejitas” (O Matador de Velhinhas). A polícia acreditava que o assassino era um travesti por conta das descrições das testemunhas, que confundiam a aparência musculosa e mais masculinizada da estranguladora.

Operação Parque e Jardins

(Fonte: The Woman Who Kill/Reprodução)

Em 28 de setembro de 2005, com a sociedade ainda horrizada com os crimes e o fato de o assassino ainda estar à solta, uma mulher de classa alta e mãe de um famoso criminologista mexicano de nome Luís Rafael Moreno vendeu às autoridades a ideia de iniciarem uma operação especial intitulada "Operação Parques e Jardins". A força-tarefa consistia basicamente em patrulhas de oficiais nas áreas em que o asassino era mais ativo e a distribuição de panfletos, aconselhando os idosos a desconfiarem de estranhos e a não abrirem a porta de suas casas para ninguém.

Num movimento altamente criticado, a polícia chegou a prender cerca de 49 travestis e prostitutas para colher suas digitais. Nenhum delas, no entanto, eram compativeis com as encontradas nos cadáveres das vítimas. A essa altura, os investigadores estavam convictos de que ao menos deveria se tratar de uma mulher transgênero.

E então, no dia 25 de janeiro de 2006, Juana Barraza foi vista por uma vizinha ao deixar a casa de Ana María de los Reyes Alfaro após estrangulá-la com um estetoscópio. A patrulha local foi rapidamente acionada e a ex-lutadora foi presa a apenas algumas quadras da cena do crime, depois de quatro anos de pura barbárie.

Com todas as provas que a polícia possuía, em 2008, Juana foi julgada por 30 homicídios e declarada culpada por 16 deles, além de também ser enquadrada por cometer 12 assaltos. A mulher foi condenada a 759 anos de encarceramento sem chance de recorrer à liberdade condicional.

Questionada sobre os motivos de tantos assassinatos, Juana Barraza, a estranguladora, confessou que sentia raiva, muita raiva, ódio profundo em ver aquelas idosas. Ela via nelas a própria mãe. Aquela que a vendeu. Aquela que permitiu que fosse violentada. Aquela que morreu e a deixou quebrada.

E por isso, ela não sentia arrependimento algum.

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