Artes/cultura
01/08/2018 às 09:36•3 min de leitura
Ainda hoje a discriminação racial é uma realidade, situação que acaba influenciando as oportunidades de grande parte da população. Por mais que sejam feitas diversas campanhas de conscientização, o pensamento arcaico segue presente.
Mesmo assim, em uma época em que seres humanos eram vendidos como mercadorias, o Barão de Guaraciaba conseguiu se destacar e acumular riqueza suficiente para, além de obter o título, levar uma vida tranquila. Ele auxiliou diversas instituições e escravos alforriados, mas não tinha poder sobre a força de trabalho que movimentava o país na época. Pelo menos foi contemporâneo da Princesa Isabel, vivendo o período em que a lei áurea foi sancionada.
Não se sabe exatamente a origem da família de Almeida. As únicas informações indicam que ele era filho de um comerciante local, chamado Antônio José de Almeida, e provavelmente de uma escrava — o nome que aparece na certidão de nascimento é “Palolina”. Esse é um ponto que causa discussão entre os descendentes do barão, pois o próprio dizia que ela se chamava Galdina Alberta do Espírito Santo.
Fato é que ele certamente tinha ascendência negra, o que não existe é um registro mostrando isso de forma específica, segundo explica Mônica de Souza Destro, trineta do barão e guardiã da história da família.
Nascido em Lagoa Dourada, localidade próxima a São João del-Rei, em Minas Gerais, Almeida deu início a sua riqueza trabalhando como ourives, fabricando botões e abotoaduras. Paralelamente, tocava violino em enterros, meio pelo qual complementava a renda e pegava tocos de vela para estudar à noite.
Após esse período, com aproximadamente 15 anos, virou tropeiro entre Minas Gerais e Rio de Janeiro, criando uma ampla rede de contatos pelo caminho. Já nessa época, começou a ganhar dinheiro negociando gado, aplicando seus lucros na compra de terras na região de Valença, interior do Rio de Janeiro, com a intenção de utilizá-las no plantio de café.
Sua guinada financeira aconteceu ao se casar com dona Brasília Eugênia de Almeida, com quem teve 16 filhos. O matrimônio veio junto de uma sociedade com seu sogro, também fazendeiro e negociante na região, que morreu pouco tempo depois, deixando para Almeida toda sua riqueza.
Com o falecimento, Almeida comprou sete fazendas de café no Vale do Paraíba, na região entre Minas Gerais e Rio de Janeiro. Em apenas uma das fazendas, ele possuía 400 mil pés de café e 200 escravos, número que pode ter chegado a mil, consideradas todas as propriedades.
Hoje, a situação pode parecer incoerente, mas a escravidão era algo natural na época. Segundo explica Carlos Alberto Dias Ferreira, autor do livro “Barão de Guaraciaba: Um Negro no Brasil Império”, “Não se trata de uma contradição ele ter sido negro e dono de escravos, pois tinha consciência do período em que vivia e precisava de mão de obra para tocar suas fazendas. E a mão de obra disponível era a escrava”.
Conforme seus rendimentos aumentavam, Almeida começou a diversificar suas áreas de atuação. Fundou dois bancos, foi sócio na construção de uma hidrelétrica e participou da construção de uma ferrovia, que facilitou o escoamento da produção de café e foi inaugurada pelo próprio D. Pedro II, em 1883.
As relações com a família real se estreitaram, culminando na possibilidade de obtenção de um título de barão, que possuía um preço tabelado de 750 mil réis. Ele foi dono de diversos imóveis que existem até hoje — um deles abrigando atualmente a Câmara Municipal de Petrópolis, conhecida também como Palácio Amarelo.
Segundo a historiadora e escritora Mary Del Priore, “Guaraciaba distinguiu-se por ter sido financeiramente o mais bem-sucedido negro do Brasil pré-republicano. Ele se tornou o primeiro barão negro do Império, notabilizando-se pela beneficência em favor das Santas Casas”.
Apesar de toda a ascensão social e financeira, o preconceito pela cor de sua pele ainda se mantinha. O Barão de Guaraciaba foi o primeiro negro, mas outros chegaram ao mesmo patamar posteriormente, sendo apelidados de “barões de chocolate”.
Após a proclamação da República, o barão começou a se desfazer de seus bens e viveu confortavelmente no Rio de Janeiro até sua morte, em 1901, aos 75 anos. Seus herdeiros e alguns escravos alforriados receberam dinheiro e propriedades, se espalhando pelos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Del Priore escreveu um livro onde conta a história do barão, chamado “Histórias da Gente Brasileira”. “Ele foi um grande empreendedor que acabou banqueiro, homem de negócios, fazendeiro e senhor de escravidão. É preciso empenho e coragem dos historiadores para estudar esses símbolos bem-sucedidos de mestiçagem.”
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