Estilo de vida
08/03/2018 às 03:01•3 min de leitura
Todo mundo já ouviu falar a respeito dos gladiadores, os brutos guerreiros que se enfrentavam diante de multidões nas arenas da Roma Antiga, certo? No entanto, você sabia que versões femininas desses lutadores também existiram? Pelo menos é isso que indicam os relatos de historiadores que teriam testemunhado embates entre essas bravas mulheres e — raras — evidências físicas, como é o caso do relevo a seguir, descoberto em Halicarnasso:
Uma das raríssimas provas materiais da existência das gladiadoras
A cena esculpida que você acabou de ver data do século 1 ou 2 e mostra duas gladiadoras, Amazona e Achillia, em combate. A peça foi encontrada em uma antiga cidade do Império Romano que hoje corresponde à localidade de Bodrum, situada no litoral da Anatólia, na Turquia. Segundo os historiadores, aparentemente a luta travada entre as guerreiras acabou em empate, e o registro em pedra é o único desse tipo já descoberto no mundo.
Embora as evidências relacionadas com as gladiadoras sejam bastante escassas, vários documentos e relatos revelam que, apesar de não terem sido tão numerosas como os gladiadores, elas não eram objetos de lendas e contos da ficção e chegaram a gozar de bastante popularidade nas arenas romanas.
Representação de uma luta entre gladiadoras
Existem, por exemplo, decretos oficiais que regulamentavam a participação de gladiadoras em eventos públicos e, ao que parece, elas eram submetidas a regras parecidas com as de seus pares masculinos. De acordo com diversos relatos, Nero, um dos imperadores mais infames da Roma Antiga, curtia a ideia de forçar as esposas de ilustres senadores a empunhar espadas e se enfrentar em anfiteatros, e teria organizado lutas entre mulheres etíopes para entreter o Rei Tirídates da Armênia.
Além disso, o poeta Juvenal — Décimo Júnio Juvenal — deixou registros de uma guerreira chamada Mevia que caçava javalis com uma lança em mãos e os seios expostos na arena. Ademais, o escritor romano Petrônio deixou relatos sobre gladiadoras lutando sobre bigas, e também existem registros de Suetônio a respeito de embates entre escravas orquestrados por Domiciano, que governou o Império entre o ano de 81 e 96 — e, em pelo menos uma das ocasiões, o imperador teria organizado embates de gladiadoras contra anões.
Ao longo dos anos, as lutas envolvendo gladiadoras se tornaram famosas e, ao que tudo indica, as guerreiras se submetiam a regimes de treinamento parecidos com os dos gladiadores. Na cena descoberta em Halicarnasso, por exemplo, Amazona e Achillia aparecem equipadas com itens e vestimentas semelhantes às dos guerreiros masculinos, como protetores de braços e canelas, escudos, espadas e o “subligaculum”, uma espécie de calção usado para tapar a genitália.
Aliás, observe a estatueta abaixo. Feita de bronze, ela conta com cerca de 2 mil anos e hoje se encontra em exposição no Museum für Kunst und Gewerbein de Hamburgo, na Alemanha. A peça também é um raro exemplo de evidência arqueológica relacionada com as gladiadoras, e mostra uma mulher em pose de triunfo vestindo apenas o subligaculum e segurando uma sica — uma espada de lâmina curva — na mão esquerda.
A estatueta acima (possivelmente) mostra uma gladiadora em pose de triunfo
Além desses dois exemplos acima, em 2001, um grupo de arqueólogos descobriu em Londres o esqueleto de uma mulher romana que foi sepultada com diversos itens associados com o mundo dos gladiadores e foi identificada como sendo (possivelmente) uma guerreira. Ademais, em 2010, outro esqueleto supostamente pertencendo a uma gladiadora foi encontrado na Inglaterra, em Credenhill, no condado de Herefordshire.
Assim como acontecia com os gladiadores, que nem sempre eram mortos ao final das lutas — devido ao alto custo de treinar e manter esses guerreiros —, os embates envolvendo as gladiadoras tinham como principal objetivo entreter o público. Na verdade, os confrontos com as mulheres eram espetáculos à parte que ocorriam entre as atrações organizadas nas arenas romanas, e era comum que elas participassem de festas privadas oferecidas pelos nobres.
Antigo mosaico romano mostrando anões
Documentos históricos apontam uma diferença significativa com relação aos guerreiros do sexo masculino: pelo menos quando surgiram, as gladiadoras não eram escravas, mas sim mulheres livres — e bem-nascidas — em busca de notoriedade e aventura. Só mais tarde a participação delas em arenas e eventos públicos foi restringida por meio de um decreto apenas a escravas.
De qualquer forma, os combates envolvendo as gladiadoras eram considerados como espetáculos exóticos, e elas se apresentavam com os seios à mostra. Essa norma também era seguida pelos gladiadores homens — que deviam lutar com o peito desprotegido —, porém, considerando que a maior parte do público que ia às arenas era masculino, é bastante provável que houvesse segundas intenções em forçar essa regra no caso das mulheres.
De acordo com as evidências históricas, os embates entre as gladiadoras foram banidos por volta do ano 200 pelo imperador romano Lúcio Sétimo Severo, embora muitos pesquisadores acreditem que as lutas ocorreram até algum tempo depois, clandestinamente. É uma pena que os vestígios dessas guerreiras sejam tão escassos, entretanto, com mais e mais descobertas sendo realizadas por aí, quem sabe as lacunas sobre sua impressionante história não sejam preenchidas!
*Publicado em 6/3/2017