Saúde/bem-estar
05/08/2015 às 07:50•4 min de leitura
Você já deve ter percebido que aquele seu melhor amigo da sétima série não ocupa o mesmo cargo hoje, na sua vida adulta – inclusive, a Ciência explica quais são os motivos. É normal que, ao longo de nossa existência, tenhamos colegas, amigos realmente próximos e até mesmo algumas inimizades. As histórias que você vai conhecer a seguir são recheadas desses dois ingredientes: amizades e inimizades, com algumas boas pitadas de bizarrice. Sem mais delongas, respire fundo e se surpreenda:
Nós não precisaríamos escrever mais nada sobre essa história. Só o título já basta para que fiquemos com o queixo caído, mas, como a intenção aqui é fazer você pensar que tudo, tudo mesmo, nessa vida é possível, resolvemos contar alguns detalhes a respeito do caso dos dois simpáticos senhores da foto acima. Eles se conheceram na guerra. Da pior forma possível.
Eric Lomax era um policial britânico quando se tornou prisioneiro de um lugar que depois ficou conhecido como “Ferrovia da Morte”. A tal estrada de ferro dos infernos ligava Myanmar à Tailândia. Detalhe: o projeto era japonês, mas quem construiu tudo foram os milhares de presos de guerra, que eram obrigados a trabalhar caso não quisessem ser torturados. Só para você ter ideia, estima-se que 83 mil pessoas tenham morrido enquanto eram exploradas durante a construção da ferrovia.
Foi lá que Lomax acabou conhecendo Nagase Takashi, um de seus torturadores. Além de ser explorado na construção da ferrovia, Lomax era frequentemente torturado por Takashi, pelos motivos mais arbitrários possíveis. Durante um ano inteiro, por exemplo, oficiais japoneses tentaram fazer com que ele confessasse ser parte de um grupo espião, o que nunca foi verdade.
Para arrancar a confissão de Lomax, os torturadores quebraram seus braços e também seus ossos do quadril, além, é claro, de praticarem as velhas táticas de afogamentos sequenciais. Takashi, à época, era um intérprete que facilitava a comunicação dos torturadores com Lomax.
Depois do fim da guerra, o soldado britânico dedicou sua vida a encontrar seus torturadores, e o único que conseguiu achar foi Takashi, em 1993, após passar algumas décadas com a ideia obsessiva de vingança. De acordo com a esposa do britânico, a intenção dele ao marcar um encontro com o japonês era justamente matar seu inimigo.
Os dois se reencontraram depois de todo esse tempo justamente na ferrovia que Lomax foi forçado a ajudar a construir. Assim que enxergou o britânico, Takashi começou a chorar e a pedir desculpas, compulsivamente. Foi então que Lomax descobriu que, depois da guerra, seu inimigo mortal foi condenado e passou a trabalhar na rodovia, à procura de corpos.
A partir de então, Takashi dedicou sua vida a trabalhar como voluntário. Os dois conversaram e perceberam que, de uma forma ou de outra, carregavam grandes traumas da vida durante a guerra. Depois, descobriram que tinham os mesmos hobbies e, inclusive, que ambos sofriam de síndrome do estresse pós-traumático. Não é de se espantar, convenhamos.
O reencontro inusitado acabou sendo o estopim para o início de uma amizade longa e verdadeira. A história dos dois acabou inspirando a produção do filme “Uma Longa Viagem”, com o aclamado ator Colin Firth no papel de Lomax.
Se a história do prisioneiro de guerra que virou amigo de seu torturador já deixou você impressionado, espere até conhecer o caso de Chris Carrier. Quando tinha apenas 10 anos, em 1974, ele desapareceu misteriosamente. O responsável pelo sumiço do garoto foi David McAllister, que, à época, trabalhava como cuidador do tio de Carrier. O sequestro foi motivado pela demissão de McAllister, que não aceitou ficar desempregado.
Durante o tempo em que esteve em cativeiro, o garoto foi torturado: seu corpo foi queimado com bitucas de cigarro, golpeado várias vezes com um cortador de gelo e, inclusive, Carrier levou um tiro na cabeça antes de ser abandonado, enquanto agonizava. Ele ficou cego de um olho, mas não teve danos cerebrais. Foi encontrado seis dias depois.
O sequestrador não podia imaginar, mas o menino não morreu. Quando um grupo de policiais foi à casa de McAllister, ele chegou a perguntar por que demoraram tanto para encontrá-lo, certo de que seria preso. O bizarro é que, na verdade, não havia qualquer denúncia que o incriminasse, e o sequestro foi confessado somente em 1996 – nessa altura, o crime já tinha prescrevido.
Foi só então que Carrier ficou novamente cara a cara com o seu sequestrador e, a partir daí, se tornou seu único amigo no mundo. Nessa altura do campeonato, McAllister já estava com 77 anos de idade, cego e agonizando em um asilo, sem contar com o apoio de qualquer amigo ou membro familiar.
Em vez de se contentar com a miséria da pessoa que mais o fez mal em toda a sua vida, Carrier se solidarizou com a situação de seu sequestrador e, ao ouvir o pedido de desculpas de McAllister, disse que, a partir daquele momento, não haveria nada entre eles. Nada além de uma nova amizade.
O discurso de amizade parece ter sido realmente sincero, e Carrier passou a visitar McAllister frequentemente no asilo – sua filha o acompanhava, inclusive. Ao lado do amigo, Carrier lia passagens bíblicas, além, é claro, de levar ao interno algumas de suas comidas favoritas. E você aí, cheio de rancor no coração só porque seu amigo não respondeu aquela sua mensagem no WhatsApp...
Pois é: as histórias de hoje ficam mais bizarras, mesmo quando achamos que isso não pode acontecer. O Genocídio de Ruanda foi, sem dúvida, um dos episódios mais tristes da história da humanidade, responsável por 800 mil mortes em um intervalo de apenas 100 dias.
Entre os sobreviventes está Alice Mukarurinda, que, apesar de ter saído desse terror com vida, traz consigo até hoje as dificuldades que o genocídio impôs à sua história. Uma das pessoas que a atacou foi um homem chamado Emmanuel Ndayisaba, que não se lembrava, mas tinha sido colega de classe e de coral de igreja de Alice.
Quando o genocídio começou, em 1994, Ndayisaba foi recrutado como um soldado extremista Hutu e, portanto, deveria matar todo e qualquer membro da minoritária comunidade Tutsi que encontrasse pela frente. Alice, como você deve imaginar, era Tutsi, e o que viria a seguir parece um roteiro de um filme de terror envolvendo torturas físicas e psicológicas.
Como estamos falando de um genocídio, você deve imaginar que o encontro entre os dois foi extremamente violento. Na ocasião, Ndayisaba correu em direção a Alice com um facão em mãos. Na tentativa de se defender, Aline levantou a mão direita, e acabou tendo o membro arrancado, sendo que sua outra mão foi cortada logo em seguida. Depois, ela foi jogada junto aos mortos, o que incluía sua filha, que era apenas uma criança.
Os anos se passaram e, em 1997, Ndayisaba finalmente se entregou à polícia e confessou ser o responsável pela morte de muitas pessoas. Ele foi preso, mas acabou ganhando liberdade seis anos depois, como parte de um programa de governo que diminuía a pena dos Hutus que confessavam seus crimes.
Já em liberdade, Ndayisaba resolveu procurar as famílias das pessoas que tinha matado, em uma tentativa de pedir desculpa. Foi então que ele ficou sabendo que uma de suas vítimas, Alice, havia sobrevivido. Ele foi até ela e implorou por perdão.
Alice pediu um tempo para pensar, afinal o homem que arrancou suas mãos e matou sua filha estava diante dela, pedindo por misericórdia. O marido de Alice a ajudou a pensar sobre o assunto e, no final das contas, ela resolveu perdoar Ndayisaba.
Com o passar do tempo, os dois ficaram próximos e se tornaram amigos. Aliás, se tornaram mais do que isso. Quando o genocídio completou 20 anos, em 2004, Ndayisaba e Alice trabalhavam juntos para uma organização que construía casas para os sobreviventes. É... O mundo dá voltas.