Saúde/bem-estar
14/09/2016 às 09:59•4 min de leitura
Você é do tipo que acha que tem uma memória excelente e confia inteiramente nela? Pois bem... Talvez suas lembranças não sejam tão dignas de confiança assim. A verdade é que o cérebro humano não registra os fatos exatamente da maneira como eles acontecem e, quando se lembra deles, as memórias que surgem não são, portanto, exatamente fiéis.
Com base nessas informações, muitas pesquisas são realizadas com a intenção de melhorar nossa qualidade de armazenamento de memórias e, claro, de entender como esses mecanismos funcionam. O que os novos estudos nos mostram? Que memórias são mais ajustáveis do que imaginamos.
O cérebro funciona como um contador de histórias quando precisamos nos lembrar de alguma informação e, assim, vai reunindo eventos, informações e sensações que têm a ver não apenas com o que aconteceu, mas com o que fez sentido para você no momento da ocorrência.
Para entender melhor esses processos, precisamos ter noção de que nossa mente realmente cria as memórias e, no meio dessa criação toda, acaba incluindo sensações e crenças, que serão ativadas quando a memória é resgatada. Se a lembrança é triste, seu cérebro vai se lembrar dela de uma forma ainda mais triste na próxima vez que você precisar recuperar esse dado. O mesmo vale para aquele dia incrível na praia com os amigos: quando você se lembrar dele, ele vai ser ainda mais feliz.
Para ter noção do tamanho da coisa toda, pense apenas que seu cérebro faz esse processo de criação e recuperação de memórias a todo o momento, em tempo real, e isso tem um impacto direto na sua vida. Histórias negativas tendem a piorar com o tempo, e somos capazes de acabar confundindo a participação de algumas pessoas nesses eventos, acreditando que, em vez de buscarem nos ajudar, elas queriam nos prejudicar, por exemplo.
Enxergando memórias dessa maneira, fica relativamente simples entender que nossas lembranças podem ser manipuladas, ainda que isso nos soe como algo assustador – de qualquer forma, faça uma autoanálise: será que suas memórias são realmente confiáveis ou você admite que, com o passar do tempo, pode ter floreado as coisas?
Inconscientemente, podemos acabar suprimindo lembranças negativas, que escolhemos esquecer, e enfeitamos lembranças felizes. Agora, graças à febre das redes sociais, temos também o chamado “efeito Instagram”, que sugere que não somos capazes de lembrar momentos reais, já que documentamos todos os momentos de nossas vidas de maneira frenética – por causa da preocupação em tirar fotos, acabamos não criando lembranças completas das experiências.
Nessa altura do campeonato, é normal pensarmos em um filme que trata dessa questão de manipulação de memórias: “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. No longa, é explorada a possibilidade de deletar todas as memórias de um amor que não deu certo. Já em “A Origem”, memórias falsas são implantadas com a intenção de influenciar sonhos. E aí: ficção científica ou possibilidade real?
Acredite você ou não, a verdade é que, psicologicamente falando, é possível implantar memórias através de alguém que represente autoridade, em conversas sobre eventos reais, por meio de pressão social – com um pouco de treino, se torna incrivelmente fácil implantar memórias falsas em uma pessoa.
Neste experimento, psicólogos entrevistaram algumas pessoas e comprovaram que é possível implantar falsas memórias. Primeiro, eles escolheram um ambiente sério e organizado; depois fizeram perguntas aos participantes sobre uma memória verdadeira; na sequência, uma falsa memória foi introduzida, mas cercada de detalhes reais.
Depois disso, a memória falsa começa a ser implantada por meio da chamada “inflação da imaginação” – nessa etapa, a pessoa é convidada a fechar os olhos e voltar para o momento passado, compartilhado por ela no início do experimento. Então, ela ouve várias vezes comandos como “tente se lembrar desse dia”, “tente se lembrar de como você estava se sentindo”, “tente lembrar que pensamentos passavam pela sua cabeça”.
Depois desse processo, vem a pressão social, e a pessoa ouve que, se não consegue se lembrar de determinado assunto, é porque não se esforçou o suficiente para isso. Quem é que gosta de ouvir que não se dedicou o suficiente? Isso mesmo: ninguém.
A partir daí, basta fazer perguntas mais direcionadas para que a pessoa consiga respondê-las facilmente, por meio de confirmações ou negações. A partir de então, a falsa memória começa a ser enraizada, afinal a pessoa tem informações reais sobre lugares e indivíduos, mas com detalhes que nunca aconteceram de verdade.
Há alguns tipos de medicamentos que mexem com a nossa memória também, como os que são usados no tratamento da Doença de Alzheimer, que são capazes de aumentar as memórias, e os utilizados para tratar alguns tipos de fobias, os quais acabam deixando a memória mais fraca, digamos assim.
Experimentos mais recentes mostram que é possível implantar memórias por meio de laser – isso graças a Steve Ramirez e Xu Liu, dois cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT, os quais conseguiram descobrir quais células cerebrais codificam memórias individuais e, a partir daí, alterar esse processo com feixes de laser, de modo a implantar a memória de algo que nunca aconteceu. Assustador, você não acha?
Outra coisa interessante sobre o assunto é o fato de que, se mudamos nossas memórias inconscientemente, podemos fazer isso de maneira consciente também, pensando de maneira mais positiva sobre eventos passados, a fim de que, com o passar do tempo, as memórias fiquem mais positivas também.
Quer um exemplo? Pessoas que seguiram uma profissão e se arrependem por não terem optado por outra tendem a olhar para trás e pensar coisas como “eu teria sido um ótimo dentista” e, a partir daí, se foquem no lado negativo das escolhas que fizeram – vale lembrar que talvez a profissão que não foi escolhida não fosse a ideal mesmo. O jeito, nesses casos, é se forçar a criar uma nova perspectiva por meio de pensamentos como “eu estou exatamente onde deveria estar”.
Uma vez que você comece a apreciar a pessoa que é em vez de se lamentar pela que gostaria de ter sido, seu cérebro tende a transformar memórias e a facilitar sua tomada de decisões. O que você pensa sobre esse assunto?