
Estilo de vida
22/04/2014 às 07:43•4 min de leitura
Eis aqui o tipo de assunto que mesmo as pessoas menos recatadas pelo menos baixam o tom da voz para abordar. Ou isso ou a coisa se apresenta como piada — já que o bom humor ainda parece ser um dos melhores preservadores da honra. Entretanto, vamos lá, sem papas na língua: sim, todo mundo tem hemorroidas. Não, isso não exclui a santidade particular das suas partes pudendas.
Por quê? Simplesmente porque há um equívoco na forma como o termo “hemorroida” é normalmente utilizado. De fato, o termo se refere a uma estrutura perfeitamente normal do corpo humano, cujo objetivo é proteger os músculos do esfíncter anal (responsáveis pela abertura e fechamento do ânus), fechando o orifício em momentos de aumento da pressão abdominal — quando você tosse, por exemplo.
Dessa forma, quando a maior parte das pessoas se refere às “hemorroidas”, elas pretendem, antes, se referir à doença hemorroidária, configurada pela dilatação das veias locais, acompanhada ou não por inflamação, hemorragia ou trombose.
Fonte: Reprodução/Wikimedia CommonsBem, mas como exatamente isso se dá? Da coceira que faz algumas pessoas sonharem com lixas ao incômodo de outras que andam com pequenas boias/almofadas para cima e para baixo... Para tudo há uma explicação, é claro.
Pesquisas mostram que, ali pelos 50 anos, aproximadamente metade das pessoas passa a experimentar alguma anormalidade no funcionamento das hemorroidas. Normalmente isso se reflete em protusões locais, inflamações acompanhadas de dor e/ou coceira. Bem, embora as ditas “hemorróidas” (na acepção popular) não sejam uma exclusividade de pessoas com mais anos nas costas, é daí que sai o índice de como a coisa funciona.
O ânus é controlado por um dos diversos esfíncteres distribuídos pelo corpo. Trata-se de músculos semelhantes a uma rosquinha, cuja função primordial é a de regular o trânsito de sólidos e líquidos pelo corpo humano. Por exemplo, o esfíncter inferior do esôfago e o esfíncter pilórico controlam, respectivamente, a entrada e a saída de alimentos do seu estômago.
Quando estão relaxados, esses músculos permitem o livre fluxo. Entretanto, o mais normal é que estejam contraídos, a fim de manter as coisas nos seus devidos lugares durante o tempo necessário, por assim dizer. Um mau funcionamento pode, por exemplo, trazer uma bela crise de azia, conforme o ácido estomacal ganha livre trânsito através da abertura superior do estômago — dando a impressão de “queimar”.
Bem entendido o funcionamento das “rosquinhas” distribuídas pelo corpo humano, basta, então, imaginar as hemorróidas como uma “almofada” que reveste o esfíncter anal. Altamente vascularizadas, essas estruturas se encontram dispostas em três áreas principais — partes direita, traseira e posterior do canal.
Fonte: Reprodução/dmailNa verdade, esses acolchoamentos são formados por tecido conjuntivo elástico e músculos lisos. Entretanto, a maior parte deles não possui paredes musculares, tais como artérias e veias. Dessa forma, as hemorroidas são tecnicamente chamadas de sinusoides — pequenos vasos sanguíneos, como um capilar —, os quais acabam inchando caso o sangue não seja capaz de deixar suas estruturas.
Nos momentos em que você está relaxado, entre 15% e 20% da pressão que mantém o canal anal fechado provêm das hemorroidas. Entretanto, quando há um aumento da pressão abdominal — quando você espirra, por exemplo —, esse quadro é alterado. Nesses momentos, o sangue que volta para o coração, proveniente da veia cava inferior, acaba reduzido.
Fonte: Reprodução/Wikimedia CommonsComo resultado, as “almofadas” se incham, pressionando o esfíncter. Parece pouca coisa? Bem, é justamente isso que impede que um espirro invariavelmente termine na situação incrivelmente constrangedora de um vazamento dos conteúdos intestinais. Além disso, as hemorroidas também permitem saber, digamos, a “natureza” daquilo que se encontra na iminência de atravessar o ânus — gases, líquidos e sólidos.
Tendo em vista que o inchamento ocasional das hemorroidas é algo perfeitamente normal e saudável, convém, por fim, esclarecer quando há, de fato, um problema relacionado à estrutura. Basicamente, os inconvenientes comumente associados à doença hemorroidária ocorrem quando há o inchamento crônico das hemorroidas, em que há a permanência de quantia anormal de sangue por período continuado.
Vale lembrar, ainda, que há dois tipos de hemorroidas — classificadas de acordo com a formação interna ou externa de protuberâncias. Convencionalmente, o ponto diferencial entre ambas encontra-se na chamada linha pectínea. Abaixo dessa linha, há, portanto, as protuberâncias externas, em uma região coberta por uma pele profusamente enervada, com fibras conectadas ao nervo pudendo.
Fonte: Reprodução/Wikimedia CommonsEis aí, portanto, a razão para os temíveis caroços, que tanto podem doer como coçar muito. Há também outros sintomas possíveis, como uma vontade constante de defecar — que não passa mesmo quando se evacua — até a presença sangue e muco nas fezes
No caso das protuberâncias internas, convencionou-se cinco estágios sintomáticos para a doença hemorroidária:
Possíveis causas para o inchamento crônico
Na verdade, qualquer coisa que provoque o aumento da pressão abdominal pode causar o inchamento crônico das hemorroidas. Entretanto, há os chamados fatores de risco, os quais normalmente aparecem associados à maior incidência da doença, entre os quais se incluem:
Embora ainda careça de mais reforços científicos, alguns estudos indicam também que o aparecimento da doença hemorroidária pode ter ligação com herança genética — de forma que, caso alguém na sua família tenha problemas relacionados, a possibilidade de você também os ter seria aumentada.
O tratamento para as doenças hemorroidárias depende, é claro, da severidade de cada caso. Em quadros mais brandos, é possível o tratamento apenas sintomático, com medicamentos administrados a fim de reduzir a inflamação, laxantes (em caso de constipação), analgésicos e também pomadas para diminuir a coceira no local.
Em casos mais graves, o médico normalmente opta por remover ou reduzir as protuberâncias, o que pode ser feito de várias formas possíveis. Por exemplo, é possível “matar” um mamilo hemorroidal prendendo um elástico na sua base — de maneira que, interrompido o fluxo sanguíneo, a estrutura acaba simplesmente caindo após alguns dias.
Também é possível injetar medicações na protuberância, a fim de fazê-la encolher, em um procedimento conhecido domo escleroterapia. Naturalmente, também a cirurgia é uma opção, tanto para remover a protuberância quanto para impedir o afluxo sanguíneo.
Dessa forma, resta que, sim, todos têm hemorroidas. A diferença encontra-se em no funcionamento normal ou alterado da estrutura, o que, como se viu, pode ser alterado por inúmeros fatores e segundo vários graus de severidade — além da forma sussurrada ou escancarada com que cada um admite ter problemas com a doença, naturalmente.
Entretanto, tiradas bem-humoradas à parte, a doença hemorroidária pode mesmo causar sérios problemas se não tratadas — de forma que é sempre recomendável buscar assistência com um bom médico de confiança.