A história sombria por trás do ataque terrorista químico no Japão

16/03/2016 às 06:045 min de leitura

Uma data que o Japão nunca vai esquecer: 20 de março de 1995 ficou marcada como o pior ataque de bioterrorismo na História moderna. Conheça todos os acontecimentos que levaram ao dia fatídico:

Como tudo começou

Em 1938, os pesquisadores do grupo IG Farben, na Alemanha nazista, desenvolveram o composto “química 146”, que era capaz de destruir o sistema nervoso central, causando espasmos musculares incontroláveis e a morte. Depois de algum tempo, o “química 146” ganhou um novo nome: sarin.

Instalação do IG Farben durante a Segunda Guerra Mundial

Ao longo das décadas seguintes, tal arma química se tornou notória, sendo usada na Guerra Irã-Iraque, quando Saddam enviou foguetes repletos do composto para os seus inimigos, matando cerca de 5 mil pessoas. Esse foi um grande crime de guerra, mas pior que isso: tornou-se uma inspiração.

No Japão, os integrantes do culto Aum Shinrikyo estavam pesquisando sobre armas de destruição em massa e assim que tiveram conhecimento sobre o sarin recrutaram cientistas para recriá-lo. No início da década de 1990, a sua nova arma do “fim do mundo” estava pronta.

O culto “Aum”

Apesar de o culto Aum Shinrikyo ter se tornado um grupo que visava o “fim do mundo”, esse não era o objetivo deles no início. Shoko Asahara, seu fundador, misturou preceitos do cristianismo, do budismo e da yoga com os ensinamentos da Nova Era.

Entretanto, a maior parte da loucura estava centrada em torno do próprio Asahara, que chamava a si mesmo de reencarnação do deus hindu Shiva. Seus seguidores eram tão devotos que bebiam frascos do seu sangue e a água suja de seus banhos em busca da luz.

Apesar das excentricidades, o grupo era ótimo em recrutar as classes mais altas da sociedade. Em sua mente iludida, Asahara acreditava que os seus seguidores ricos seriam capazes de controlar a sociedade japonesa.

Shoko Asahara, no centro da imagem

Um de seus primeiros planos envolvia a política: em 1990, ele organizou um esquema para que 24 integrantes do seu culto concorressem nas eleições. Ele acreditava na vitória, mas o seu partido recebeu menos de 1,7 mil votos.

A derrota fez com que eles se voltassem para o apocalipse. No dia em que o sarin ficou pronto, eles fizeram uma canção para comemorar:

“Ele veio da Alemanha nazista,
Uma arma química perigosa,
Sarin, sarin.
Se você inalar o vapor misterioso,
Você vai cair com vômito sangrento de sua boca,
Sarin, sarin, sarin,
A arma química”

O primeiro atentado

No dia 27 de junho de 1994, integrantes do Aum estacionaram uma van em uma rua residencial, em Matsumoto, e pulverizaram o bairro com o gás venenoso. A operação era apenas um teste para o ataque que aconteceria em Tóquio: Asahara queria ver quantas pessoas eles poderiam matar. Após 30 minutos, o bairro inteiro estava sofrendo terríveis convulsões.

Ao ver a esposa caída no chão, Yoshiyuki Kono, um vendedor de máquinas que vivia no subúrbio de Matsumoto, ligou para a emergência. Quando os médicos chegaram, encontraram cerca de 50 pessoas em estado grave nas ruas. Dentro das casas, mais vítimas agonizavam ou já estavam mortas.

Yoshiyuki Kono e sua esposa - mais uma das vítimas do sarin

Ao todo, sete pessoas morreram naquela noite e mais de 200 ficaram feridas. O Aum considerou que o próximo alvo deveria ser um local sem ventilação, onde ninguém pudesse correr da nuvem de veneno.

Yoshiyuki Kono tornou-se o principal suspeito, por ter sido o primeiro a alertar a polícia. Ele foi preso, e os meios de comunicação difamaram o seu nome. Graças às ações do culto, Kono não só perdeu a sua esposa, como sua reputação, seu sustento e quase toda a sua sanidade.

O dia dos ataques

Kenichi Hirose embarcou na linha Marunouchi do metrô de Tóquio. Em suas mãos, Hirose carregava um guarda-chuva e um saco plástico contendo dois pacotes pequenos. Era hora do rush e os trens estavam repletos de trabalhadores que se dirigiam para o centro da cidade. Não sendo notado pelas pessoas ao seu redor, Hirose calmamente esperou.

Toyoda e Hirose - responsáveis pelo atentado

No mesmo momento, outros quatro homens embarcavam em diferentes estações, todos com o mesmo guarda-chuva e os sacos plásticos. Antes das 8h, cinco homens deixaram seus pacotes caírem no chão, e os perfuraram com a ponta de seus guarda-chuvas.

Eles então se levantaram e saíram dos trens, desaparecendo na multidão. Ninguém notou o pó que começava a sair dos sacos perfurados.

Ironicamente, a primeira indicação de que algo estava errado veio de um dos participantes do atentado: Kenichi Hirose. Ele entrou no carro em fuga e começou a tremer incontrolavelmente. Sua respiração ficou presa na garganta e, apesar de todas as precauções do Aum, Hirose se tornou a primeira vítima fatal do sarin naquele dia.

Em poucos minutos, os passageiros dos trens começaram a tossir e a vomitar. Assim que um dos veículos parou na estação de Kodenmacho, um passageiro chutou o saco cheio de sarin para fora da plataforma, onde estavam muitas outras pessoas.

Três funcionários foram designados a tirar os sacos suspeitos dos veículos. Sem proteção, eles só usaram jornal para embrulhar os pacotes. Em pouco tempo, dois deles agonizaram no chão até a morte.

Seria o fim do mundo?

Eram 8h30 quando a rede de transporte foi paralisada. Os efeitos do ataque eram cada vez mais visíveis. Alguns vomitavam incontrolavelmente, outros caíam em um coma do qual nunca acordariam.

Muitos dos afetados ficaram permanentemente cegos. Em um caso horrível, as lentes de contato de uma mulher foram fundidas aos seus globos oculares, obrigando os médicos a removerem ambos os olhos cirurgicamente.

Fora das estações, os corpos dos feridos começaram a se acumular. O centro de Tóquio se assemelhava a uma zona de guerra. Os hospitais transbordavam. Parecia o fim do mundo.

Enquanto o caos acontecia, Hiroshi Morita se preparava para publicar o seu relatório sobre o ataque anterior. Ele era o médico que havia tratado as primeiras vítimas e foi considerado a principal autoridade do Japão em envenenamento por sarin. Por sorte, Morita estava com a televisão ligada e, assim que a tragédia foi noticiada, ele percebeu na hora o que estava acontecendo e o que tinha que ser feito.  

Apesar de ser uma das principais cidades do mundo, Tóquio estava totalmente despreparada para um ataque deste porte. Morita rapidamente ligou para todos os hospitais e explicou como eles deveriam agir. Foi um momento decisivo no dia de terror do Japão e que, possivelmente, diminuiu o número de mortos.

O resultado dos atentados

No início da tarde, Tóquio finalmente estava com a situação sob controle. Ficou claro que a Aum tinha falhado em seu objetivo declarado de provocar o “fim do mundo”. Embora o ataque tivesse causado caos, a cidade já estava se recuperando.

Enquanto isso, o próprio Aum estava em desordem: alguns dos integrantes envolvidos no ataque haviam se envenenado acidentalmente ao lançar a substância química e a polícia já havia recebido denúncias anônimas sobre o grupo.

No fim do dia, com 12 mortos e 6 mil feridos nos hospitais da cidade, o atentado deixou uma marca na população. Apenas o 11 de setembro resultou em tantas internações de um único atentado terrorista.

Ainda hoje, muitas pessoas sofrem com os efeitos do sarin. Sanae Yamada foi hospitalizada no dia dos ataques. Anos mais tarde, o cheiro de um solvente de tinta desencadeou uma sensibilidade mortal para produtos químicos dela.

Para outros, os efeitos duradouros variam da cegueira à fraqueza e até a morte. Um estudo, realizado em 2000, descobriu que até 30% dos que foram contaminados ainda estavam sofrendo de problemas mentais.

Um novo ataque

Apenas dois dias depois do ataque, a polícia conseguiu fechar uma fábrica de sarin e chegar ao responsável pelo Aum, Asahara. Ele negou o envolvimento nos ataques ao metrô.

No entanto, mesmo com os progressos da polícia, o Aum estava determinado a completar seu objetivo. Com 40 mil membros e acesso às armas mortais, era apenas questão de tempo até que eles planejassem um novo ataque.

Uma bomba cheia de gás cianeto foi deixada em um banheiro da estação Shinjuku, em Tóquio. Ela tinha veneno suficiente para consideramos os ataques anteriores apenas um “aviso”.

Felizmente, um erro com o mecanismo de detonação fez com que a bomba pegasse fogo, em vez de explodir. Especialistas estimam que, caso funcionasse, o material seria suficiente para matar ao menos 10 mil pessoas.

Bombas foram enviadas para as autoridades japonesas, resultando em mais ferimentos graves. Outros atentados foram planejados, mas era tarde demais: Ashara e outras 12 pessoas foram condenadas à morte. Com o líder preso, o grupo mudou o seu nome para “Aleph” e ficou com apenas 1,5 mil membros.

As consequências

Apesar do número de pessoas feridas, o ataque de Aum pode, felizmente, ser considerado um fracasso. Menos de um mês depois, um homem matou quase 13 vezes mais pessoas com um caminhão-bomba em Oklahoma. Cinco anos depois, o atentado de 11 de setembro mudou a forma como pensamos no terrorismo.

No entanto, o Japão moderno ainda carrega as cicatrizes dos ataques no metrô de Tóquio. De acordo com o escritor Haruki Murakami, 20 de março de 1995 marcou o momento em que a psique do Japão mudou para sempre.

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