Ciência
27/04/2020 às 14:00•3 min de leitura
Antes de ser vendido, Ångermanelfven era o nome original do SS Baychimo, em homenagem ao famoso rio sueco Angerman. Construída em 1911, em Gotemburgo, na Suécia, a embarcação tinha 70 metros de comprimento, com suas 1.322 toneladas impulsionadas por um motor a vapor de expansão tripla, que gerava velocidade máxima de 10 nós, o equivalente a 18 quilômetros por hora.
O navio costeiro de carga efetuou rotas comerciais entre a Suécia e Hamburgo até o início da Primeira Guerra Mundial, quando foi repassado para o governo britânico como parte das reparações pós-guerra da Alemanha. Uma vez propriedade da Hudson's Bay Company e renomeado como SS Baychimo, a embarcação foi usada para negociar açúcar, chá, tabaco e armas com o povo inuíte em troca de peles, além de servir para visitar os postos comerciais ao longo da costa da Ilha Victoria, nos territórios do noroeste do Canadá.
Ao longo de 10 anos desde a sua aquisição, em 1921, mais modernizado, Baychimo transportou suprimentos entre a Escócia e o Canadá, realizando nove viagens muito bem-sucedidas pelo mundo. Ele era visto quase como uma personalidade, mais pelas situações que enfrentava, desafiando a própria capacidade, do que por sua imponência.
O casco de aço do navio não tinha a mínima estrutura para quebrar gelo, e o seu sistema de propulsão não era páreo para o gelo polar, que podia facilmente engoli-lo. Ainda assim, a tripulação arriscava todas as fichas para realizar as tarefas designadas, enfrentando os cenários mais extremos que existiam.
(Fonte: Mitologia/Reprodução)
Isso mudou em 1º de outubro de 1931, quando um gigantesco bloco de gelo do Ártico chegou mais cedo ao sul do que em outras décadas, sendo carregado por uma tempestade que atingiu o Baychimo em sua viagem de volta a Vancouver. O gelo maciço se instalou ao redor do navio e o prendeu. O porto seguro mais próximo era Barrow, no Alasca, porém apenas acessível por aeronaves equipadas com esqui.
Durante 2 semanas, o capitão John Cornwell e seus 29 tripulantes permaneceram a bordo do Baychimo na esperança de que o tempo ficasse menos cruel e o gelo se desprendesse da embarcação. No entanto, quando o casco começou a emitir rangidos ensurdecedores com a pressão da calota de gelo, eles decidiram abandonar o navio, temendo que fosse esmagado.
Assim que o auxílio chegou, 15 homens foram transportados de uma pista criada no gelo até a base segura de Barrow. Nutrindo esperanças de que o navio desencalhasse, Corwell e os outros membros da tripulação ficaram para manter os olhos no navio. O plano era ficar até o verão, por isso eles construíram um acampamento a 800 metros de onde o Baychimo estava.
(Fonte: Mysteri File/Reprodução)
Um mês se passou, e o clima insólito apenas se intensificou. Em 24 de novembro de 1931, uma tempestade fustigante forçou os homens a permanecerem 3 dias inteiros confinados em seus abrigos. Quando finalmente puderam sair, o Baychimo tinha desaparecido. Imediatamente, eles supuseram que o navio havia cedido à ferocidade do tempo e afundado de vez.
A tripulação foi evacuada do local no mesmo dia. Cornwell decidiu efetuar uma busca aérea pelo navio e o encontrou a 80 quilômetros de onde havia sumido. Certo de que o Baychimo não era mais navegável e poderia quebrar e afundar a qualquer momento, o capitão deu ordens para que os homens desembarcassem toda a carga de peles e deixassem que o navio seguisse em sua excursão não tripulada até o seu fim próximo.
(Fonte: BC Archives/Reprodução)
O apelido Navio Fantasma do Ártico foi atribuído ao SS Baychimo devido ao seu peculiar histórico de aparições ao longo de 38 anos desde o seu abandono. Em 1932, um explorador o avistou próximo da costa enquanto fazia caminhadas no território de Yukon, no Alasca. No ano seguinte, um grupo de inuítes se abrigou no gigante vazio Baychimo por 1 semana até que o tempo melhorasse e eles pudessem voltar para casa.
Em setembro de 1935, o navio foi visto novamente perto de Wainwright, no Alasca, aprisionado como se fosse um fóssil em uma montanha de gelo que fazia o seu caminho pelas águas. Além da fricção de anos das calotas de gelo contra um casco incompatível, como o degelo delas não causou o seu naufrágio?
Várias expedições promovidas pelo governo do Alasca para resgatar o SS Baychimo foram efetuadas, mas todas terminaram sob estranhas circunstâncias, como se as águas não quisessem devolver o navio. A embarcação chegava a desaparecer em um ponto e surgir em outro a centenas de quilômetros em 2 dias. Além disso, durante tentativas frustradas de remoção, alguma parte da embarcação se abria e era invadida pela água, finalmente decretando o início do seu fim. Mas então ela era vista viajando de novo.
Em março de 1962, um grupo em caiaques inuits no mar de Beaufort avistou o Baychimo nas gélidas águas do topo do mundo. Sete anos depois, a embarcação fantasma foi vista pela última vez, ainda intacta, sendo carregada por um iceberg em Point Barrow. Desde então, nenhuma aparição. A BBC chegou a fazer um documentário de busca por algum vestígio de naufrágio, mas não encontrou nada.
Talvez o gelo tenha finalmente se cansado de transportar o SS Baychimo e o deixou descansar no profundo oceano. Talvez ele ainda esteja por aí, forte, carregando o título de único navio abandonado a circular por tanto tempo pela Terra.