Estilo de vida
30/03/2021 às 15:00•4 min de leitura
Em novembro de 2009, Lacey Spears tuitou em seu perfil que o filho dela, Garnett Paul-Thompson Spears, estava muito doente, mas que ela tinha esperanças de que ele não fosse internado nos próximos dias. Dois dias depois, ela escreveu: “Meu doce anjo está no hospital pela 23ª vez”.
Em seguida, em uma série de tweets, a mulher deixou claro que havia entrado na rede social para poder externar as angústias que a maternidade lhe causava, principalmente sendo mãe de um filho doente, como Garnett. Com apenas 5 anos de idade, o menino tratou de infecções de ouvido, convulsões, problemas digestivos e febres incontroláveis.
(Fonte: The Journal News/Reprodução)
Em meados de 2012, Lacey Spears se mudou com o filho do Alabama, nos Estados Unidos, para o vilarejo de Chestnut Ridge, em Nova York (EUA), onde havia uma comunidade alternativa e holística intitulada The Fellowship Community. Nessa época, ela já alimentava uma verdadeira biografia do passo a passo da vida de Garnett nas redes sociais, fazendo questão de sempre enaltecer as idas contínuas dele ao hospital.
Contudo, especificamente naquele ano, Spears só publicou felicidades que estavam acontecendo em sua vida, e como seu filho estava cada vez melhor. “Ele era uma pequena borboleta social e adorava isso”, comentou a mulher em entrevista ao 48 Hours.
(Fonte: CBS News/Reprodução)
Um ano e meio depois, Garnett Spears foi hospitalizado mais uma vez, e a mulher voltou ao mesmo tipo de comportamento. Dessa vez, no entanto, o quadro de seu “Garnett, o Grande”, como ela o chamava, era ainda mais delicado. Pela primeira vez, ele teve que ficar conectado a uma máquina de Eletroencefalografia (EEG), responsável por monitorar a atividade cerebral.
Os exames da criança indicaram um perigoso nível de sódio de 182 mEq/L em seu sangue, sendo que ele havia sido internado com 138, considerado um índice estável. Ele foi diagnosticado com hipernatremia aguda, correndo o risco de consequências neurológicas irreversíveis em menos de 48 horas.
(Fonte: USA Today/Reprodução)
Garnett Spears foi imediatamente transportado de helicóptero para o Hospital Infantil Maria Fareri de Westchester, em Valhalla, uma região censitária da cidade de Mount Pleasant, no Condado de Westchester, região metropolitana de Nova York. Apesar da agilidade dos médicos e da significativa melhora no quadro clínico da criança, a recuperação de Garnett durou menos de 24 horas. Em 23 de janeiro de 2014, ele foi declarado morto devido a um edema cerebral causado pela quantidade mortal de sódio em seu sangue.
Os médicos apontaram Lacey Spears como a culpada pela morte do filho, pois os exames do garoto acusavam um índice de sódio metabolicamente impossível no organismo dele, ainda mais para uma criança que parecia saudável. Eles afirmaram que a mulher havia envenenado o próprio filho com sal.
(Fonte: Reddit/Reprodução)
Os mandados de busca chegaram rapidamente, e os oficiais entraram na casa da mulher e se depararam com vários sacos de sal marinho e bolsas usadas para encaixar no tubo de alimentação.
Em 17 de junho de 2014, após uma investigação aprofundada, Lacey Spears foi presa.
(Fonte: Huffopost/Reprodução)
Nascida na cidade de Decatur, no Alabama, Spears sempre foi vista como uma pessoa desesperada por atenção. Quando seu filho nasceu, esse seu comportamento foi fortificado por meio de sua atividade nas redes sociais.
Apesar de não ter sido diagnosticada formalmente, foi atribuída à mulher a rara Síndrome de Munchausen por procuração, um distúrbio no qual o guardião de uma criança a faz mal de propósito apenas para ganhar simpatia e atenção para si mesmo. “Sem querer, essas mães tendem a se tornarem psicopatas”, afirmou Marc Feldman, da Universidade do Alabama, em entrevista à CBS Nova York.
De acordo com o psiquiatra Philip Resnick, em cerca de 85% dos casos, a mãe é a causadora da violência contra a criança. Lacey Spears se comportava exatamente como uma portadora da doença, apresentando excesso de devoção aos cuidados do filho que nunca ficava saudável, levando-o diversas vezes ao médico e sempre pedindo para que ele fosse tratado de doenças estranhas.
(Fonte: New York Post/Reprodução)
Os portadores dessa síndrome fazem de tudo para machucar os seus filhos por meio de atitudes totalmente compulsivas, embora sejam conscientes, intencionais e premeditadas. O tutor da criança sempre quer obter benefícios provocando as doenças, como conseguir atenção do parceiro ou como uma maneira de se afastar de um ambiente conturbado. Em caso de solidão, como a de Lacey Spears, a doença se apoiava na necessidade de se sentir flanqueada por médicos ou qualquer outro indivíduo, buscando simpatia de estranhos até mesmo na internet.
“O objetivo também nunca é matar a criança, mas mantê-la doente, para que a mãe possa adquirir cada vez mais devoção e reconhecimento pelo seu sacrifício”, explicou o psiquiatra Herbet Schreider, do Hospital Infantil de Oakland.
(Fonte: Daily Mail/Reprodução)
O advogado de Lacey Spears não usou a síndrome como parte do processo de defesa da mulher no julgamento, tampouco o assunto surgiu em algum depoimento, exceto em comentários de especialistas em matérias feitas pela mídia sobre o caso, presumindo que ela sofria da síndrome e de depressão pós-parto.
“Eu ouço as pessoas falando sobre mim enquanto eu ando pela rua”, declarou Spears ao 48 Hours. “Eles me chamam de ‘matadora de bebês’ e ‘mãe do ano’, mas eu simplesmente os ignoro porque sei que, lá no fundo, eu não sou esse tipo de pessoa”.
Em 2 de março de 2015, o júri considerou Lacey Spears culpada por assassinar seu filho envenenando-o com sal de cozinha, que ela administrou aos poucos por meio de seu tubo de alimentação. Em 8 de abril daquele ano, o juiz Robert Neary a condenou a 20 anos de prisão, e ela foi encaminhada para o Centro Correcional para Mulheres de Bedford Hills, em Nova York.
Apesar de casos populares na mídia, como o de Spears e Gypsy Rose Blanchard, em que a Síndrome de Munchausen por procuração foi detectada, a doença rara sempre foi subvalorizada na comunidade médica.