Ciência
27/07/2016 às 06:26•4 min de leitura
Hoje em dia os sequestros se tornaram tão banais que, infelizmente, mais ninguém se espanta com as notícias desses crimes. Entretanto, no início dos anos 70, não era nada usual que pessoas fossem raptadas aqui no Brasil, muito menos crianças indefesas. Pois a história que vamos contar a seguir não só envolveu uma criança, como jamais foi solucionado — e é por isso que ele ainda é considerado um dos casos de sequestro mais misteriosos do país.
Crianças da família Ramirez da Costa
O crime envolveu a família carioca Ramirez da Costa — composta pelo casal Maria da Conceição e João, e seus sete filhos, Vera Lúcia, Carmen, Eduardo, João, Carlos, Roberto e Luciana que, na época, tinham 15, 14, 13, 11, 10, 8 e 3 anos de idade, respectivamente. Tudo aconteceu na noite do dia 2 de agosto de 1973, enquanto a mãe das crianças estava com os cinco filhos mais velhos em casa assistindo televisão.
Maria da Conceição se encontrava em casa com Vera Lúcia, Carmen, Eduardo, João e Carlos — ou Carlinhos, como era chamado pela família — assistindo à novela das 8 quando, de repente, ocorreu um corte de energia e a casa da família ficou completamente às escuras. Foi nesse momento que um homem armado invadiu a residência, trancou todos em um dos cômodos e fugiu levando Carlinhos.
Mãe de Carlinhos fotografada diante da casa da família após o sequestro do menino
O sequestrador deixou um bilhete ao sair, no qual avisava que a criança estava em seu poder e que só seria devolvida após o pagamento do resgate. O criminoso exigiu que a família levantasse o montante de Cr$ 100 mil, e instruiu que o dinheiro, juntamente com o bilhete, deveria ser deixado dentro de uma bolsa em um ponto específico do cruzamento de duas ruas da capital fluminense, no dia 4 de agosto às duas horas.
A nota também dizia que se a família tentasse qualquer reação, a vítima seria liquidada. No momento do sequestro, o pai de Carlinhos se encontrava com os dois filhos menores, Roberto e Luciana, trabalhando em um laboratório farmacêutico que pertencia aos Ramirez da Costa. Apesar de serem proprietários do negócio, os pais do menino não possuíam o dinheiro exigido para pagar pelo resgate, e a comunidade, comovida, se uniu para fazer doações.
Manchete da época noticiando sobre o sequestro
Além disso, as autoridades cariocas não tinham qualquer experiência na época para lidar com casos de sequestro. Entretanto, no dia e local combinados para a o pagamento do resgate, inúmeros policiais disfarçados de civis, pipoqueiros e vendedores de sorvete, tomaram a região, a bolsa com o dinheiro foi deixada exatamente no ponto informado, mas Carlinhos jamais apareceu.
As investigações levaram a diversos suspeitos, entre eles os diretores de uma clínica que ficava ao lado da residência da família de Carlinhos, já que um dos proprietários tinha interesse em comprar a casa dos Ramirez da Costa. O médico, um homem chamado Mário Filizzola, teria oferecido Cr$ 60 mil pelo imóvel, e os policiais seguiram a ideia de que o sequestro poderia ser uma artimanha para pressionar os pais do menino.
Carlinhos
As autoridades chegaram a prender o marceneiro da clínica, Kleber Ramos, acreditando que ele teria sido contratado para raptar o garoto, mas, na falta de provas, ele foi solto. Outros funcionários também foram investigados e levados para depor — contudo, os policiais não conseguiram encontrar nada que comprovasse o envolvimento do médico. Mas os investigadores se deram conta de algumas inconsistências no caso.
Suspeitos são levados pela polícia para depoimento
A família de Carlinhos tinha três cães, e nenhum deles parece ter reagido quando o sequestrador invadiu a casa. Além disso, a porta da residência não mostrava sinais de ter sido forçada, e a caixa de luz onde os fios foram cortados não se encontrava em local evidente — e esses detalhes davam indícios de que o invasor podia ser alguém conhecido.
Para piorar, as investigações apontaram que o João, o pai de Carlinhos, estava enfrentando uma série crise econômica e precisava desesperadamente de dinheiro. Aliás, quando a comunidade se reuniu para fazer as doações para o pagamento do resgate, o montante passou dos Cr$ 300 mil — três vezes o valor exigido —, e não se sabe que fim levou essa grana toda.
Evidentemente, os pais de Carlinhos se tornaram suspeitos do crime, especialmente o pai — que chegou a ser acusado de forjar o sequestro de Carlinhos. Não demorou até que inúmeras histórias começassem a circular sobre o casal, e uma delas seria que João estava tendo um caso com a secretária os dois teriam planejado o rapto. Ademais, a mãe do menino sempre aparecia sorrindo e acenando diante da imprensa, levantando suspeitas entre os jornalistas.
As investigações continuam
Um dos rumores envolvendo a mãe de Carlinhos foi de que ela teria um caso com um pai de santo local — e esse homem teria sequestrado o menino e o levado ao Maranhão. Então, em janeiro de 1974, cerca de seis meses após o sumiço de Carlinhos, um homem chamado Adilson de Oliveira se apresentou à polícia, assumiu a autoria do crime e revelou que João Costa havia sido o mandante.
O pai de Carlinhos chegou a ser preso, e liberado pela polícia no dia seguinte graças a um habeas corpus. Mais tarde, os investigadores descobriram que a confissão de Adilson não era verdadeira e, com a falta de provas, o caso foi encerrado. Ademais, os boatos, a pressão e a desconfiança levaram os pais do menino a se divorciar.
Então, em 1977, um detetive particular chamado Bechara Jalkh, contratado para investigar o caso paralelamente à polícia, voltou a levantar acusações de que João Costa teria forjado o sequestro de Carlinhos. Segundo ele, como o pai do menino estava completamente falido, ele teria criado um plano mirabolante para conseguir dinheiro.
O caso foi reaberto pela polícia, e análises no bilhete deixado pelo sequestrador apontaram que ele havia sido redigido por um homem chamado Silvio Pereira, funcionário de João. Curiosamente, também veio à tona que Vera Lúcia, a irmã mais velha de Carlinhos, teria reconhecido Silvio no dia do sequestro, mas, depois de dizer isso ao pai, João teria dito à filha que se ela falasse a respeito do assunto, ele seria preso. O funcionário chegou a ser condenado a 13 anos de prisão, mas, após um recurso apresentado pela defesa, ele foi absolvido.
Suspeita terrível
O envolvimento de João Ramirez da Costa no sequestro do filho jamais foi comprovado pela polícia. Ele se casou novamente e vive com a segunda mulher no Rio de janeiro. Já a mãe do menino, Maria da Conceição, mora em uma quitinete com a filha mais velha e já recebeu a visita de mais de 10 homens que diziam ser Carlinhos.
Contudo, exames de DNA revelaram que nenhum deles é seu filho. Um desses homens continua fazendo visitas esporádicas à Maria da Conceição até hoje. Os pais do menino vivem com dificuldades financeiras, e ninguém sabe como o dinheiro do resgate foi utilizado.
estimativa da aparência atual de Carlinhos
No início de 1974, chegou a ser publicada a terrível notícia de que o garoto teria sido afogado no mar a pedido do pai três meses depois de ser raptado, mas o corpo jamais foi encontrado. Após mais de 40 anos, o caso do sequestro de Carlinhos continua sem solução e o que realmente aconteceu no dia em que o menino desapareceu ainda é um mistério.
Nós da equipe de redação do Mega Curioso gostaríamos de agradecer ao nosso leitor Diego pela sugestão de pauta. Aliás, se você também conhecer histórias interessantes sobre as quais a gente poderia escrever por aqui, não deixe de avisar o nosso time!