Ciência
20/10/2016 às 13:18•3 min de leitura
Em um dia desses dias, durante uma conversa com um grande amigo, que é homossexual, acabei descobrindo que o “carma” da vida dele é encontrar homens heteros em aplicativos de encontros gays, como o famoso Grindr. A plataforma tem como objetivo promover o encontro casual ou não entre homens gays – por isso o meu espanto: há muitos homens que não são gays por lá também. Homens que têm namoradas, inclusive, e muitos, muitos homens que são casados com mulheres.
Em casa, cheguei a conversar com o meu noivo sobre o assunto. Na discussão, falei sobre a famosa Escala Kinsey e ele, que entende muito mais de gráficos e estatísticas do que eu, me explicou que essa escala é válida no sentido de que tira a sexualidade humana dos espectros “gay”, “hetero”, “lésbica” e “bissexual”, mas que é complicado encaixar pessoas dentro desses padrões, uma vez que inúmeros são os fatores que ajudam a moldar a sexualidade de alguém.
De fato, é difícil pensar em escalas gráficas de um assunto assim tão cheio de variantes, e aí a conversa que tive com o meu amigo e a que tive com o meu noivo acabaram por embolar ainda mais a minha cabeça. O fato, no entanto, é que homens heterossexuais, casados ou que namoram, buscam sexo casual com homens homossexuais, e aí esse meu amigo, que chamarei de João (embora esse não seja seu nome verdadeiro), topou responder a algumas perguntas sobre o tema.
O João me disse que conhece vários homens que vivem uma vida heteronormativa, mas que buscam sexo casual com outros homens, de uma maneira sigilosa. “Já conheci amigos que namoravam mulheres, mas curtiam ‘experimentar’ com homens de vez em quando. Há aqueles que estão confusos, que têm medo do que sentem e do que a sociedade poderia pensar”, ele me falou.
Por outro lado, o João me disse que existem muitos homens certos e seguros sobre sua heterossexualidade, mas que têm experiências homossexuais de vez em quando e não encaram isso como um problema. “Os aplicativos de encontro – como o Grindr – parecem ter apenas facilitado essas ‘puladas de cerca’ e o sexo casual entre homens”, explicou o João.
Perguntei sobre o perfil desses homens heterossexuais em aplicativos de encontro, e o João me disse que eles costumam ser mais discretos, que não exibem fotos do rosto, “mas mostram outras coisas com muita facilidade”, revelou ele, que acrescentou que “muitos desses homens dizem querer preservar seus relacionamentos e casamentos, portanto tentam não revelar suas identidades”. Ele contou que alguns dizem um nome, mas não é possível ter certeza de que seja o verdadeiro.
Outra característica que parece ser comum entre esses homens é o fato de que, logo de cara, eles dizem que têm relacionamentos com mulheres. Muitos, segundo João, têm a vontade de experimentar algo diferente, assim como há aqueles que já tiveram essas experiências e buscam um “repeteco”.
Nesse ponto da conversa, assim como muitas pessoas devem estar se perguntando, eu pensei que, pela lógica, são homens homossexuais ou bissexuais, mas então o João me disse algo interessante: “Entre os homens casados que encontro na vida e nos aplicativos, eles são, em geral, realmente heterossexuais – no sentido de que gostam mesmo de mulheres e devem continuar casados”.
Por essas e outras é que o meu amigo diz não acreditar em rótulos: “Acho que a sexualidade é mesmo fluida e não me surpreende que cada vez mais apareçam homens procurando ‘tirar essa curiosidade’”. João conta que esses homens falam bem e de forma respeitosa sobre suas esposas e namoradas.
Sobre a casualidade dos encontros, João explica que esses homens geralmente procuram sexo sem compromisso, mas conta que conhece casos de homens que acabam encontrando um parceiro fixo, o que pode ser interpretado como um relacionamento. “Particularmente, não entendo quem gostaria de ter um relacionamento com alguém casado, acho que é uma furada, mas encontros casuais com homens casados são bem interessantes”, revelou.
Em relação ao comportamento na hora de marcar encontros, João me disse que os homens heteros e casados são mais preocupados com relação ao local, à data e à duração de encontro, o que acaba gerando bastante nervosismo.
“Tive um caso com um rapaz que estava extremamente nervoso, com o coração superacelerado, que parecia que ia ter um treco. Desconfio até que tenha sido a primeira vez dele com outro homem. Mas há também os que sabem o que querem, que são mais práticos e vão direto ao ponto.”
Curiosa, perguntei ao João por que ele acha que a presença de homens em relacionamentos heterossexuais está cada vez maior em aplicativos gays. “Eu desconfio que a cada geração há uma maior aceitação da homossexualidade na sociedade, o que leva a uma maior visibilidade sobre o ser homossexual. Acho que muitos homens podem ter reprimido seus desejos (consciente ou inconscientemente), mas acabaram descobrindo essa curiosidade – mesmo que apenas para um sexo casual”.
Essa mente aberta, digamos assim, parece ter encontrado suporte em novas tecnologias, e João concorda muito com isso: “Acho ainda que o aplicativo de encontro pode ser uma ótima ferramenta para a experimentação e tem ajudado muitos homens a explorar sua sexualidade”.
Se você que nos lê tem experiência nesse assunto, seja como o meu amigo João ou como um homem hetero que busca relações casuais com outros homens, mande uma mensagem para a gente em nossa fanpage do Facebook – sua identidade, assim como a do meu amigo, será mantida em absoluto sigilo.