
Ciência
18/03/2014 às 08:14•4 min de leitura
Uma equipe de astrofísicos do Harvard-Smithsonian Center observou recentemente o que pode ser o primeiro indício direto da teoria do Big Bang — segundo a qual o Universo passou de uma singularidade, há 13,7 bilhões de anos, à imensa massa dispersa atual, em constante expansão.
Durante uma sondagem conduzida entre 2010 e 2012, o radiotelescópio BICEP2 detectou o primeiro vislumbre de uma onda gravitacional. Trata-se de um fenômeno previsto originalmente por Albert Einstein em sua Teoria da Relatividade — de acordo com a qual a gravidade seria a distorção do espaço causado por corpos de grandes proporções —, e que ocorreria apenas em eventos cataclísmicos, tais como a fusão de dois buracos negros.
Detecção de ondas gravitacionais reforça teoria sobre expansão inicial do Universo Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia Commons
A referida onda teria se originado no trilhonésimo de trilhonésimo de segundo em que o Universo experimentou o início da expansão prevista pelos defensores do Big Bang — servindo, dizem os cientistas, como prova desse movimento inicial.
De fato, o próprio Einstein havia qualificado o modelo como inobservável. Sua comprovação em prática, além de reforçar a teoria do Big Bang, deve ainda alterar e/ou consolidar profundamente diversos paradigmas científicos atuais. Vale olhar isso mais de perto.
A Amundsen–Scott South Pole Station, onde se localiza o radiotelescópio BICEP2 Fonte da imagem: Reprodução/Harvard
Em termos de impacto, o evento vem sendo comparado à comprovação do bóson de Higgs (ocorrido em 2012 no CERN).
De acordo com a Teoria da Relatividade de Einstein, todo corpo de grandes proporções provoca distorções perceptíveis na própria malha do espaço — que é estendida ou espremida, de acordo com suas dimensões (confira a imagem abaixo). Para o físico, essa seria a definição da força controversa conhecida como “gravidade”.
O "espaço curvo" proposto por Einstein. A gravidade seria uma distorção espacial. Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia Commons
Entretanto, diferentemente das demais forças fundamentais da física quântica — eletromagnetismo, força nuclear forte e força nuclear fraca —, a gravidade, até a descoberta da equipe do Harvard-Smithsonian Center, as ondas gravitacionais jamais haviam escapado dos limites dos modelos teóricos.
Embora tenha continuado a se propagar pelo cosmos, as ondas gravitacionais acabaram por se tornar incrivelmente fracas, o que impede sua detecção por meios, digamos, convencionais. É aí que entra o radiotelescópio BICEP2.
"Traços" deixados por ondas gravitacionais primordiais em particulas elementares Fonte da imagem: Reprodução/Harvard
Por funcionar com base na detecção de ondas de rádio, o aparelho é capaz de varrer a chamada Radiação Cósmica de Fundo. Particularmente, a equipe Harvard-Smithsonian Center buscou pistas da Polarização Modo-B — padrão de RCF que apenas poderia ser produzido por resíduos de ondas gravitacionais, representando uma espécie de “traço” deixado pelas referidas ondas em partículas fundamentais (confira a imagem acima).
Ondas gravitacionais foram detectadas após exame microscópico dos dados do BICEP2 Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia Commons
Embora a descoberta ainda deva ser submetida ao escrutínio da comunidade científica, o consenso geral tem sido bastante favorável. Trata-se, de fato, da prova de que se passou do “nada” à organização cosmológica atual por meio do evento cataclísmico conhecido como Big Bang, há aproximadamente 14 bilhões de anos.
Conceito artístico trazendo a expansão desencadeada pelo Big Bang ao longo dos anos. Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia Commons
Em outros termos, seria a prova definitiva de que estrutura do Universo — incluindo o que se vê, o que se sabe e tudo o mais que ainda pode acontecer — foi decidido em um minúsculo fluxo gravitacional ocorrido no primeiro trilhonésimo de trilhonésimo de segundo em que o cosmos passou a existir. Caso a descoberta se comprove, o que resta é esperar pelos desdobramentos.
Diante da descoberta do Harvard-Smithsonian Center, o escritor Luis Fernando Veríssimo provavelmente perguntaria: “Afinal, o que isso tem a ver com o meu café com leite?”. De fato, a uma cabeça não iniciada, pode ser meio difícil entender as dimensões da detecção feita pelo radiotelescópio BICEP2, certo?
As ondas gravitacionais foram previstas por Einstein, que as qualificou como impossíveis de detecção. Fonte da imagem: Reprodução/Wikimedia Commons
Entretanto, é possível que o breve resumo em tópicos da revista Nature ajude a, digamos, “apurar” um pouco mais o seu café com leite — tanto no que se refere às definições quanto às possíveis implicações. Confira abaixo: