O alfinete do pânico usado pelas mulheres em 1900

23/06/2020 às 14:003 min de leitura

Uma pesquisa feita pela SSH no ano de 2015 nos Estados Unidos registrou que cerca de 65% das mulheres já foram assediadas verbalmente por um homem, enquanto 20% delas foram seguidas e outras 9% foram coagidas a fazer algo sexual.

No início do ano de 1900, a virada do século significou um avanço na mobilidade das mulheres em meio à sociedade. Elas não eram mais resumidas à sala de estar ou à cozinha, e passaram a integrar de fato o meio social — como sempre deveria ter sido. No entanto, o resultado dessa liberdade se manifestou por meio de todo o tipo de assédio cometido pelos homens. Com uma sociedade construída na base de machismo estrutural, muitos achavam que só o fato de uma mulher caminhar sozinha pelas ruas da cidade significava que ela estava “disponível” ou que era uma “qualquer”, portanto "os homens tinham o direito" de fazerem insinuações.

Quando esse tipo de agressão sórdida começou a alavancar uma onda de medo no meio feminino, as mulheres se viram obrigadas a tomar uma atitude.

Espetando-os para longe

(Fonte: Bored Panda/Reprodução)(Fonte: Bored Panda/Reprodução)

Em uma chuvosa terça-feira de 1912, uma jovem de apenas 18 anos chamada Elizabeth Foley se viu vítima de um assalto à mão armada enquanto voltava para casa com um colega que era o seu vizinho. O ladrão apenas tocou o ombro do homem com a arma e coagiu-o a entregar todo o dinheiro que tinha acabado de sacar no banco.

Contrariando o terror que a cena oferecia, Foley apenas pulou sobre o criminoso, arrancou o alfinete de seu chapéu e pressionou-o contra o rosto do homem. Para infelicidade do ladrão, a jovem era uma participante ativa de um movimento de mulheres que se armaram com o acessório de chapéu para se defender de todos os tipos de agressores.

Tudo começou quando as mulheres se cansaram de gastar as suas palavras nos gabinetes da prefeitura das cidades e resolveram assumir o controle da situação por meio dos próprios meios. Em 1904, o jornal Los Angeles Herald intitulou os assediadores de mashers e os definiu como “desajeitados e covardes”, afirmando que qualquer mulher com coragem o suficiente e um alfinete de chapéu poderia comprovar isso.

Após o caso de Foley ganhar repercussão na mídia da época, várias mulheres pelo país passaram a se defender com o alfinete de seus chapéus ainda mais, usando-o em qualquer situação de perigo. Em Chicago, uma mulher se safou de ser apagada com clorofórmio após apunhalar um homem no ombro com o objeto. Em uma outra situação, uma jovem impediu que o trem onde estava fosse assaltado apenas ameaçando o delinquente com o objeto. 

A prática despertou até o interesse do Presidente Roosevelt que declarou: “Nenhum homem, por mais corajoso que seja, gostaria de enfrentar uma mulher determinada com um chapéu na cabeça ou em mãos".

Um grande avanço

(Fonte: History/Reprodução)(Fonte: History/Reprodução)

Sustentando flores, frutos e pássaros falsos, conforme os chapéus foram se tornando cada vez mais decorativos, os alfinetes que prendiam os enfeites no lugar passaram a ficar mais compridos e ter até 15 centímetros de comprimento, com pontas mais afiadas do que agulhas.

Para acompanhar os avanços, o mercado de defesa pessoal feminino também começou a se aprimorar. Manuais foram criados com instruções de como manusear o alfinete de chapéu adequadamente, ensinando até maneiras de como incorporar técnicas de jiu-jitsu para o momento de se proteger.

No entanto, em meados de 1915, rapidamente a segurança das mulheres se tornou uma questão pública, pois mais casos de assédio e estupros surgiram pelo país. Logo os criminosos se aprimoraram e passaram a andar com facas e revólveres para surpreender as vítimas femininas antes que elas pudessem reagir. O assassinato de 34 mulheres em Chicago não só deixou claro o caminho para onde as coisas estavam indo como também estimulou uma extensa campanha anticrime, que se concentrou em prender e denunciar esses homens.

Não demorou para que o governo e a voz masculina da sociedade se posicionassem por meio de falas parecidas com as de um homem para o jornal Chicago Tribune: “A atitude das mulheres americanas convida a agressão”.

Por outro lado, ninguém havia tomado medidas para prevenir que as mulheres fossem assediadas de todas as formas possíveis, tampouco deixado claro que a culpa não era delas de só quererem se defender.

Primeiros passos para o futuro

(Fonte: History/Reprodução)(Fonte: History/Reprodução)

Felizmente, o excesso de publicidade lançou luz para o problema da violência contra a mulher. Em um tempo em que a definição de assédio não era muito clara e nem a prática dele ilegal, a maioria dos homens acreditavam que era de responsabilidade das mulheres evitá-lo. Leis contra abusadores surgiram em Omaha e no Nebrasca de repente, com taxas de US$5 por dia para cada homem que chamasse uma mulher por apelidos ofensivos.

A lei se tornou uma inovação e motivo de revolta para muitos homens que achavam a comoção algo exagerado. As sufragistas e mulheres trabalhadoras foram as principais responsáveis por batalharem pelo movimento e, quando ele de fato começou a ser cada vez mais ouvido, jornais, como o Los Angeles Herald, começaram a argumentar sobre os perigos que os chapéus em si ofereciam, mais uma vez desviando da necessidade que as mulheres tinham de ser ouvidas.

Com isso, as mulheres tomaram outra atitude: produziram capas e ponteiras de veludo para proteger as pessoas de serem espetadas acidentalmente. A década de 1920, porém, marcou o abandono dos chapéus e alfinetes pelo poderio feminino com a aderência ao estilo flapper que entrou na moda.

No entanto, ainda com um longo caminho pela frente para desconstruir a opressora estrutura social, o esforço que elas fizeram para redefinir o conceito de assédio nas ruas, sendo um crime, foi a primeira linguagem pública dos direitos das mulheres e um pedido já cansado para que principalmente os homens e o resto do mundo examinassem a própria consciência.

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