Artes/cultura
20/02/2023 às 09:30•2 min de leitura
Uma das características da era das monarquias é a subserviência aos reis e rainhas, assessorados para todos os tipos de afazeres, desde trocar de roupas até tomar banho. Foi nesse contexto que nasceu uma das profissões mais controversas de todos os tempos: groom of the stool, que em tradução livre significa "empregado do banheiro".
Essa pessoa era encarregada de acompanhar um monarca o tempo todo com seu banheiro móvel e cuidar de suas necessidades fisiológicas de perto. E, para piorar, precisa revirar as fezes e conferir urina para informar como estava a qualidade intestinal da realeza.
(Fonte: LobsterThermidor/Wikimedia Commons/How Stuff Works/Reprodução)
O trabalho foi popularizado a partir do século XV, durante o reinado da Dinastia Tudor, e engana-se quem acredita que era infeliz aquele que ficava incumbido de ocupar a posição. Na verdade, as pessoas morreriam para trabalhar como encarregados do banheiro de um rei. Na corte, esse era considerado o cargo que todo o aristocrata da Inglaterra sonhava em preencher, sobretudo devido aos benefícios.
Além de criarem um vínculo e ter livre acesso ao rei, esses assistentes eram presentados com roupas de segunda mão e tinham controle sobre as finanças domésticas do palácio. Ninguém achava um emprego ruim, muito pelo contrário. O cargo acompanhava a oportunidade de se tornar um dos grandes confidentes dos monarcas, visto que estavam envolvidos nos momentos mais íntimos possíveis.
(Fonte: Wikimedia Commons)
Exatamente por isso que não era qualquer um que estava apto à tarefa. O notório rei Henrique VIII, por exemplo, escolhia seus assistentes com base mais na proximidade do que qualquer outro motivo, optando por amigos íntimos dele ou membros importantes de seu grupo de colegas. Hugh Denys foi um deles. Casado com uma moça de família aristocrata influente, se tornou um dos mais antigos membros da comitiva do rei.
Por muito tempo, ele carregou o banheiro móvel mais famoso e caro da Inglaterra. O banheiro móvel de Henrique VIII era feito de madeira, revestido de veludo preto, franjado de seda, com dois lavatórios de estanho e quatro jardas de tecido marrom-avermelhado.
(Fonte: Getty Images)
A profissão era tão poderosa que foi alvo de inveja pela corte. A escritora Tracy Borman menciona em seu livro The Private Lives of the Tudors (2016) que um duque chegou a se irritar com o rei e dizer que ele daria seus honorários, cargos e recompensas a "esses assistentes" em vez de nobres.
Quando a Dinastia Stuart ascendeu ao trono da Inglaterra, o responsável por carregar o banheiro real havia conquistado tanta influência que alguns falavam que a Guerra Civil Inglesa foi travada tanto no campo de batalha quanto nos banheiros reais.
Foi nessa época, inclusive, que a profissão começou a ser mais associada aos cuidados com o guarda-roupa real do que a higiene íntima. Acredita-se que essa tenha sido a origem do cargo de assessor real.
Henry Rich, camareiro encarregado de cuidados com o Rei Charles I. (Fonte: Wikimedia Commons)
Além de um prestígio político, o cargo também adquiriu um caráter espiritual, visto que o monarca era escolhido por Deus, portanto, ajudar em suas tarefas era quase como cuidar de uma divindade.
Por muitos séculos, existiram poucas pessoas em quem um monarca confiou mais do que naquela que limpava a sua bunda, e essa proximidade toda teve seu lado ruim.
Alguns encarregados pelo banheiro real foram executados com seus monarcas devido ao excesso de proximidade. Este foi o caso de Henry Norris, por exemplo, aliado político de Ana Bolena, que acabou morto como a rainha.
A sociedade da época, e até mesmo a História, chamou isso de "ossos do ofício".