Artes/cultura
13/03/2017 às 07:43•3 min de leitura
Hoje em dia, embora ainda existam vários mistérios a ser desvendados sobre o Antigo Egito, nós conhecemos muitas coisas sobre essa fascinante civilização, como quais foram as dinastias e faraós que reinaram ao logo dos milênios, como era o dia a dia da sociedade egípcia e quais eram os diversos costumes dessa cultura.
No entanto, até o século 19, o Antigo Egito e todos os seus segredos eram completamente desconhecidos. Isso porque, até 1822, os hieróglifos eram um enigma incompreensível para linguistas, historiadores, arqueólogos e exploradores, e guardavam a chave para decodificar todas as incógnitas relacionadas com essa civilização. Tudo mudou graças à descoberta de um fragmento de granodiorito — uma pedra negra semelhante ao granito — em 1799.
De acordo com Dory Gascueña, em um interessante artigo para o portal OpenMind, entre os anos de 1798 e 1801, Napoleão Bonaparte liderou uma (fracassada) campanha para conquistar o Egito e, durante esse período, as forças francesas e inglesas se enfrentaram em terras egípcias e sírias pelo controle do território.
Campanha de Napoleão no Egito
Só que Napoleão, que sentia um verdadeiro fascínio por aquelas terras, além de levar seus soldados para lutar, teve o bom senso de criar um grupo especial para acompanhar as tropas: a Commission des Sciences et des Arts — ou Comissão das Ciências e das Artes —, formada por engenheiros, astrônomos, químicos, pintores, economistas e outros cientistas.
Então, em julho de 1799, enquanto o capitão do Exército Francês Pierre-François Bouchard liderava escavações para reforçar uma zona defensiva no vilarejo de Rashid — ou Roseta —, a cerca de 80 quilômetros de Alexandria, os soldados se depararam com um curioso artefato. Eles encontraram uma pedra negra com 112,3 centímetros de comprimento, 75,7 cm de largura e 28,4 cm de espessura, e pesando uns 760 quilos enterrada na areia.
A Pedra de Roseta
Mas não era só isso: a peça continha uma porção de coisas gravadas em sua superfície. Mais precisamente, a pedra trazia 14 linhas repletas de hieróglifos, assim como 32 linhas redigidas em demótico — um dialeto derivado do hieróglifo — e 54 linhas escritas em grego. Sendo assim, o pessoal da Comissão das Ciências e das Artes imediatamente reconheceu a importância do artefato.
O objeto foi levado para o Instituto do Egito, localizado no Cairo. Entretanto, os franceses não tiveram muito tempo para se dedicar à descoberta, pois os ingleses venceram a guerra e a pedra passou para as mãos do Império Britânico. Aliás, o artefato continua em posse dos ingleses até hoje, e se encontra em exposição no Museu Britânico, em Londres.
Segundo Dory, o idioma hieróglifo se perdeu no tempo depois que o Império Romano assumiu o controle do Egito, por volta do ano 30 a.C., e a sua decodificação não aconteceu imediatamente após a descoberta da Pedra de Roseta não. Se passaram quase duas décadas até que alguém conseguisse quebrar o código gravado no artefato!
Ninguém compreendia o que os símbolos utilizados pelos antigos egípcios queriam dizer
Depois de a pedra ser descoberta, vários estudiosos e cientistas receberam transcrições dos textos presentes em sua superfície, e foram poucos os que conseguiram qualquer avanço relevante em sua tradução. Bem, isso até as reproduções caírem nas mãos de Jean François Champollion.
O francês era completamente obcecado por tudo relacionado ao Antigo Egito e, quando tinha apenas 12 anos, conheceu o físico e matemático Jean-Baptiste Joseph Fourier, um dos membros das expedições francesas às terras egípcias. Na época, o cientista estava trabalhando em uma obra encomendada por Napoleão chamada “Descrição do Egito”, e viu em Champollion um aprendiz brilhante.
Códigos indecifráveis
O garoto desejava saber tudo sobre o Egito, e aproveitou a oportunidade para conhecer essa terra fascinante através dos olhos de Fourier. O estudioso, por sua vez, transmitiu ao jovem todo o conhecimento que pode — e foi graças ao mestre que Champollion conseguiu decifrar os textos gravados na Pedra de Roseta.
Conforme mencionamos, a Pedra de Roseta contém textos gravados em hieróglifo, demótico e em grego — e o trecho nesse terceiro idioma foi facilmente traduzido. Entretanto, como cada excerto conta com uma quantidade de linhas diferentes (14, 32 e 54), assim como uma grande discrepância no número de palavras, nenhum dos estudiosos que tentaram decifrar as mensagens havia percebido que se tratava do mesmo texto redigido em três línguas distintas.
A história do Antigo Egito se encontrava contida em um código indecifrável
Champollion quebrou o código devido ao seu conhecimento do copta — um idioma composto pelo alfabeto grego e alguns caracteres do demótico. Já o demótico, consistia de uma língua derivada do hierático, que, por sua vez, era uma versão simplificada do hieróglifo usada com frequência para redigir mensagens em pedra.
Jean François Champollion
O que Champollion fez foi identificar os nomes próprios gravados nas mensagens e se dar conta de que os nomes dos reis se encontravam rodeados. Ele também percebeu que, ao contrário do que muitos outros linguistas antes dele acreditavam, o hieróglifo não era um idioma puramente ideográfico, isto é, composto por símbolos dotados de significado.
Então, Champollion montou uma tabela com 300 hieróglifos e ícones do hierático e demótico e, a partir daí, traduziu os textos em apenas 13 dias. As mensagens presentes na Pedra de Roseta consistiam em um decreto real promulgado no ano de 196 a.C. na cidade de Mênfis em nome do faraó Ptolomeu V, e dizem que quando Champollion finalmente quebrou o código, ele entrou correndo no escritório de seu irmão, gritou “descobri!” e desmaiou de emoção.
A Pedra de Roseta em exposição no Museu Britânico
Também pudera! O francês conseguiu não só descobrir o que as três mensagens diziam, mas decodificar o — até então — indecifrável idioma utilizado pelos antigos egípcios, fazendo como que ele se transformasse na ferramenta que permitiu que os segredos de sua civilização pudessem ser revelados e sua história fosse finalmente reescrita.