Ciência
01/10/2019 às 16:00•4 min de leitura
Uma paixão daquelas de tirar o fôlego, de fazer o casal se trancar em um quarto sem querer mais sair. Era assim a relação entre Sada Abe e Kichizo Ishida em 1936, em Tóquio. Mas o que era para ser uma tarde rápida de amor em um hotel se transformou em um conto erótico mortal para Ishida em maio daquele ano. A tarde se transformou em noite, a noite se multiplicou em quatro dias nos quais eles estiveram envolvidos sem se preocupar com a esposa de Ishida — para quem ele deveria voltar, o que nunca aconteceu.
Os dois não conseguiam se desgrudar e não deixaram o sexo de lado nem com a presença das empregadas do hotel, que entraram no quarto para levar chá. O que Ishida não sabia era que toda aquela paixão se transformaria no seu próprio assassinato.
O fogo da paixão do casal acendeu como um vulcão que entra em erupção, com pressa e urgência, afinal, Ishida e Abe se conheceram apenas dois meses antes, quando ela foi contratada para trabalhar como garçonete no restaurante dele. A garota fora obrigada pelos pais a trabalhar como gueixa — trabalho sexual — como uma forma de puni-la por ter tido diversos amantes quando era adolescente.
Sada Abe - Foto: Wikimedia Commons
Ela não se enquadrou na organização, “regras” e horários de uma gueixa e começou a trabalhar como prostituta licenciada do governo. Depois de roubar clientes, ela foi trabalhar em um bordel ilegal de Tóquio, mas depois que ele foi invadido pela polícia, ela passou a ser a amante paga de um dos amigos do dono do bordel.
Ela deixou a prostituição porque era maltratada e começou a trabalhar em um restaurante, o restaurante de Ishida, que logo demonstrou interesse em Abe. O sentimento foi recíproco e rápido, e não demorou para ela ficar completamente apaixonada pelo “chefe”.
Depois de uma estadia prolongada em um hotel com ela, Ishida voltou para a esposa e deixou Abe louca de ciúmes. Embriagada, ela chegou a ameaçá-lo com uma faca. Mais intrigado do que com medo de a ameaça se concretizar, eles voltaram a se encontrar, mas desta vez com a presença da arma branca, que funcionava como uma pimenta erótica na relação.
Hotel no qual Ishida foi assassinado - Foto: Wikimedia Commons
A faca se tornou um elemento a mais na relação de Ishida e Abe. Em um encontro sexual, ela colocou a ponta da faca nos órgãos genitais dele e ameaçou cortá-los se ele voltasse para a esposa mais uma vez. Ele, sem saber que seu assassinato se aproximava, parecia gostar do perigo e pediu ainda para que ela o sufocasse durante o sexo.
Em um dos encontros, Ishida foi asfixiado eroticamente por duas horas e, sentindo as dores, ele brincou dizendo que da próxima vez Abe deveria estrangulá-lo até a morte porque parar o fazia sentir muita dor.
Apesar de entender o tom de piada, a ideia de estrangular seu amante até a morte ficou em sua mente. Mas não por muito tempo. Dois dias depois, Abe estrangulou Ishida enquanto dormia e não parou até matá-lo, como ele havia pedido. Ela contou à polícia depois que se sentiu à vontade, como se tivesse tirado um fardo de seus ombros depois de cometer o assassinato de seu amante.
Bordel onde Sada Abe trabalhou ainda existe em Tóquio - Foto: Wikimedia Commons
Abe ainda usou a mesma faca com a qual eles “brincavam” durante o sexo para cortar os órgãos genitais de Ishida. Ela os embrulhou em papel e, com o sangue dele, escreveu: “Nós, Sada e Ishida, estamos sozinhos” na coxa dele. Além disso, gravou seu nome no braço dele, também com a faca, e saiu do hotel levando consigo o pênis do amante.
Não demorou para que o corpo de Ishida fosse encontrado com a mensagem gravada. Uma história como essa também não demoraria para chegar à imprensa e depois que o caso explodiu, relatos de que Abe teria sido vista chegavam de todo o país.
Enquanto o tumulto estava armado, Abe agia calmamente: fazia compras, via filmes no cinema, sem preocupação. Ela se hospedou em um hotel com nome falso e começou a escrever cartas de despedida porque planejava se matar.
Mas a imaginação erótica dela não a deixava em paz e Abe queria fazer sexo com seu amante mais uma vez. Ela desembrulhou o pênis de Ishida, colocou-o na boca e tentou colocá-lo dentro de si diversas vezes. Sem conseguir, desistiu. “Eu queria a parte dele que me trazia as lembranças mais vivas”, disse.
Sada Abe foi presa após se hospedar com nome falso em um hotel - Foto: Wikimedia Commons
A investigação chegou até Abe, que abriu a porta do quarto, admitiu sua identidade, entregou os órgãos genitais como prova e respondeu quando questionada sobre os motivos pelos quais havia matado seu amante. “Eu o amava tanto que queria ele só para mim. Mas como não éramos marido e mulher, enquanto ele vivesse, ele poderia ser abraçado por outras mulheres. Eu sabia que se eu o matasse, nenhuma outra mulher poderia tocá-lo novamente, então eu o matei”, contou.
Condenada, ela pediu para ser executada, mas a sentença foi de seis anos de prisão que se transformaram em apenas cinco. Livre, Abe deu entrevistas, escreveu uma autobiografia, um filme foi feito contando sua história e a do assassinato de seu amante e, enfim, ela voltou a trabalhar como garçonete por mais 20 anos. Em 1970 ela desapareceu e, desde então, ninguém sabe o que aconteceu com Sada Abe, a mulher que tornou real um conto erótico mortal.