Ciência
28/02/2020 às 14:00•5 min de leitura
A década era 1950, bem no momento em que o mundo inteiro vibrava ao som das músicas do Rei do Rock, Elvis Presley, que mexia com os corações de milhares de pessoas devido ao seu charme e som atemporal, sendo o responsável por atrair multidões para os seus shows.
Barbara Jeanne Grimes, 15 anos, e a sua irmã, Patricia Kathleen Grimes, 12 anos, eram 2 dos 7 filhos de Joseph e Lorretta Grimes. Todos que conheciam as jovens consideravam-nas muito conscientes para a idade que tinham. Inseparáveis, as irmãs Grimes eram estudantes da escola Thomas Kelly e St. Maurice, onde eram notadas pelo fascínio que nutriam pelo Rei do Rock e por serem fãs altamente empenhadas nessa obsessão em comum.
Era 28 de dezembro de 1958, as irmãs conseguiram juntar alguns trocados para irem assistir, pela 15° vez, ao filme Love me Tender, protagonizado pelo ídolo delas. O longa-metragem estava em cartaz no Teatro Brighton (Chicago), local que ficava a quase 2 km da casa das garotas, no McKinley Park. Por isso, presume-se que elas chegaram até lá caminhando, para a sessão das 19h30.
Loretta Grimes acreditava que as filhas ficariam para a 2ª sessão do filme, visto que não haviam chegado em casa no tempo estipulado. Porém, quando deu 00h e não havia sinal das garotas, ela entendeu que algo estava errado. Então, a senhora Grimes pediu aos dois filhos mais velhos que fossem esperar pelas irmãs no ponto de ônibus. Às 2h, ficou claro que algo grave havia acontecido com as garotas.
Em uma época na qual sequestros, assassinos em série e tantos outros crimes bárbaros não eram comuns, o sumiço das irmãs Grimes se tornou uma espécie de cubo mágico, só que de lados que não combinavam.
A testemunha ocular, Dorothy Weinert, uma amiga de escola de Patricia Grimes, estava sentada atrás delas no teatro com a sua irmã e alegou ter visto as duas garotas por volta das 21h30 em uma fila para comprar pipoca. Dorothy foi embora, mas, aparentemente, as Grimes ficariam para a segunda sessão do filme. Ela não notou nada de diferente no comportamento de ambas.
Foi logo depois de a polícia colher o depoimento da garota, que uma das maiores investigações da história de Chicago teve início. As autoridades, os civis, cidades e condados iniciaram uma mobilização em massa para localizar o paradeiro daquelas irmãs, oferecendo o máximo de seus recursos de busca. Centenas de policiais e voluntários vasculharam os 4 cantos do Condado de Cook. Foram distribuídos 15 mil folhetos, oferecendo recompensa de mais de US$ 1.000 por pista e testemunha.
Não demorou muito para que pessoas reportassem ter visto as desaparecidas em lugares distantes demais, como o Tennessee Nashville, causando ainda mais comoção pelos meios de comunicação. Alguns adolescentes declararam ter visto as irmãs entrando em um carro modelo Mercury, dirigido por um jovem cuja aparência lembrava a de Elvis. Essas e outras alegações foram o máximo de pistas que existiram na época. Enquanto isso, Loretta recebia milhares de cartas e telefonemas de pessoas que afirmavam estar na companhia de suas filhas. Ela chegou a responder a algumas dessas pessoas por aconselhamento do FBI, mas se tratava sempre de uma mórbida brincadeira.
Foi de repente que o sumiço das meninas acabou se transformando em um triste enredo de novela mexicana, com declarações exacerbadas e teatrais, com várias especulações. Teriam Barbara e Patricia articulado uma escapada para se encontrem com o seu ídolo em um desses estados? Seria aquilo tudo uma inconsequência juvenil? Teriam elas confundido o astro com um dos milhares de suas sósias?
A hipótese tomou proporções tão grandes que Elvis Presley foi a público mandar uma mensagem para as irmãs, aconselhando às meninas voltar para a casa, em troca lhes oferecendo um encontro com ele, o verdadeiro.
Ainda assim, os esforços da polícia prevaleceram massivamente, mas eles acreditavam que as duas já haviam fugido mesmo. A mãe delas se recusava a acreditar nessa hipótese, afinal ela conhecia as filhas, e também tinha certeza de que elas não iriam a lugar algum sem o rádio AM que ganharam de presente de Natal, por mais bobo que isso soasse.
Após 1 mês, as buscas pararam, e os ânimos dos espectadores amorteceram. Então, em 22 de janeiro de 1959, com a neve esfarelando pelas ruas enquanto dirigia pela estrada rural German Church Road — a leste de Willow Springs —, um homem chamado Leonard Prescott avistou o que considerou se tratar de partes de um manequim despontando em meio ao gelo. Curioso, ele voltou para vê-las melhor e, com isso, acabou descobrindo 2 cadáveres, nus e de cara para o gelo. Eram as irmãs Grimes.
Barbara estava caída de bruços com as pernas erguidas em direção ao tronco, e Patricia estava deitada de costas, com o corpo cobrindo a cabeça da irmã, como se uma tivesse sido jogada sobre a outra. Haviam arranhões em seus rostos, provavelmente causados por animais silvestres. A autópsia atestou que as garotas estavam mortas há duas semanas, seus corpos foram ocultados dos olhos de todos e preservados devido ao montante de neve.
À princípio, os legistas não identificaram sinais de que as Grimes tivessem sido assassinadas, pois não haviam traumas por força contundente. Haviam sinais de relações sexuais em Barbara, mas nada que indicasse se teve consentimento ou não. Não foram identificados ferimentos por objetos cortantes, bala ou marcas de estrangulamento nem hematomas de ordem fatal. Nenhum traço de droga ou álcool. No entanto, era impossível as garotas terem morrido por qualquer circunstância que não fosse assassinato. Por isso, os médicos concluíram que, por algum motivo diabólico, o perpetrador do ato era especializado o suficiente em não deixar traços óbvios.
Sob a lente de uma controladora mídia da década de 1950, o caso explodiu, de maneira desassossegada, pior do que antes. Em uma sociedade que não estava habituada com esse tipo de acontecimento, a morte das irmãs virou manchete de terror, e rapidamente o assassino se tornou uma ameaça nacional.
Tudo foi interrompido. Nada era noticiado que não se tratasse do assassinato das irmãs. Elas foram transformadas em jovens inconsequentes que foram se aventurar com um ou mais desconhecidos, em uma jornada envolvendo fanatismo e sexo, culminando em um fim trágico. Relatos obscenos e mentirosos sobre o que as garotas fizeram e como acabaram na neve foram impressos. Testemunhas foram inventadas e vários aspectos da investigação deslegitimados. No funeral, o luto não foi respeitado e a cerimônia foi transformada em um circo de horrores, colhendo depoimentos e alegações inverídicas ou tendenciosas.
A polícia se mobilizou para executar uma das maiores investigações coordenadas. Eles interrogaram 300 mil pessoas, sendo 2 mil delas sob sério potencial de culpabilidade. Vários foram acusados e presos, contudo confessaram que foram submetidos a declarar envolvimento por meio de coerção. Comprovando, assim, que o frenesi doentio da mídia havia contaminado outras esferas.
O caso saiu tanto fora de controle que se tornou um jogo, e as pessoas surgiam para confessar o assassinato apenas para tentar ganhar algum tipo de atenção perturbadora. Dentre esses indivíduos apenas um chamou a atenção dos investigadores: um homem de voz sarcástica que ligou para Loretta Grimes antes de os corpos das garotas serem encontrados na rodovia. Ele deu detalhes que batiam com os divulgados posteriormente pelos médicos, mas nunca foram capazes de rastrear o sujeito.
Os investigadores conseguiram traçar uma conexão que começava a partir de um ano antes do ocorrido. A poucos quilômetros de onde as garotas foram encontradas, dois irmãos e um amigo foram espancados, mutilados, despidos e jogados na rodovia. Um ano depois do assassinato das Grimes, Bonnie Leigh Scott, de 15 anos, foi descoberta nua e morta no acostamento de uma estrada, também não muito longe da onde os corpos das irmãs foram avistados. Com marcas não fatais pelo corpo, a causa da morte de Bonnie também foi definida como indeterminada pelos legistas.
Depois, um homem chamado Charles Melquist acabou sendo preso por outro crime e teria confessado voluntariamente o assassinato de Bonnie. Com ele, foi encontrado um caderninho com vários nomes de garotas, mesmo sem os nomes das Grimes, a maioria deles era de crianças vizinhas delas ou moradoras do mesmo bairro. Ele nunca confessou algum envolvimento com a morte das irmãs e nada que o conectasse substancialmente ao caso delas jamais foi encontrado.
O assassinato de Barbara e Patricia Grimes esfriou como a neve que preservou os seus corpos e congelou o coração de Loreta Grimes, que morreu sem saber o que aconteceu naquela noite, ensurdecida pelo vazio semelhante ao que Elvis Presley deixava depois de pedir a todos que o amassem ternamente.