Ciência
21/08/2020 às 15:00•4 min de leitura
A década de 1920 foi marcada pelo interesse de pessoas e entidades governamentais em explorar alguns locais ainda não alcançados pelo homem, sendo a expedição à Amazônia liderada por Percy Fawcett uma das mais notórias. Em meados de 1921, o Comitê do Monte Everest foi formado sob a liderança do Coronel Charles Howard-Bury para fazer o primeiro reconhecimento e mapeamento de uma rota ao cume a 8.848 metros, um dos pontos mais altos da Terra.
Infelizmente, apesar de terem sido os primeiros a colocarem os pés na montanha, os expedicionários enviados a essa missão nunca chegaram ao seu destino. Esse feito só foi alcançado em fevereiro de 1953 por Edmund Hillary e Tenzing Norgay.
A partir daí, o interesse público pela meta de alcançar o topo do Everest só cresceu ao longo dos anos. Estima-se que cerca de 5 mil pessoas já escalaram a montanha, mas só algumas delas conseguiram ir e voltar vivas depois de passarem pela Zona da Morte: a região a 8 mil metros de altura, que atinge uma temperatura de até -60 °C, onde o corpo humano já não consegue absorver oxigênio o suficiente.
Existem mais de 300 cadáveres na Zona da Morte que jamais foram resgatados ou identificados, mas um deles é o mais famoso.
Em 21 de maio de 2001, o alpinista francês Pierre Paperon filmou um corpo que aparentemente era de um homem caído do lado esquerdo da rota que leva até o cume do Monte Everest, um caminho pelo qual qualquer pessoa precisa passar para alcançar o destino. Os sherpas, um grupo indígena local, disse a Paperon que aquele era o cadáver de um montanhista chinês que havia tentado escalar a montanha há 6 meses.
É provável que Botas Verdes seja Tsewang Paljor, um indiano de 28 anos de idade que era chefe de polícia quando morreu em uma expedição
O tempo tratou de fazer do cadáver desconhecido uma espécie de ponto de referência para os alpinistas que usavam a rota norte do Everest. O cadáver foi apelidado de Botas Verdes devido à cor de suas botas de montanhismo da marca Koflach, que se destacavam na paisagem puramente branca. Ele ganhou ainda mais notoriedade em 2006 após a controversa morte do famoso alpinista David Sharp, cujo corpo foi encontrado sentado e segurando as próprias pernas do lado direito de Botas Verdes.
É provável que Botas Verdes seja Tsewang Paljor, um indiano de 28 anos de idade que era chefe de polícia quando morreu em uma expedição com a Polícia de Fronteira Indo-Tibetana em 1996. O que se sabe é que o homem usava botas verdes no dia em que ele, seus dois companheiros e oito pessoas das expedições Adventure Consultants e Mountain Madness subiram a rota sudeste.
Era 10 de maio de 1996 quando Sudebar Tsewang Samanla, Lance Naike Dorje Morup e Paljor foram arrebatados por uma nevasca a poucos metros do cume, depois que os outros seis membros da equipe se recusaram a seguir viagem devido às condições atípicas daquele dia e voltaram para o acampamento alto a 8,3 mil metros.
O grupo de alpinistas de Fukuoka que também se aventurava na montanha naquele dia viu dois homens descendo pela rota da montanha antes de os perderem de vista
Através do rádio, às 15h45 no horário do Nepal, os três alpinistas comunicaram a Mohinder Singh, líder da expedição, que chegaram ao topo. Eles deixaram algumas ofertas sagradas e desceram sem Samanla, que decidiu fazer uma cerimônia religiosa um pouco mais demorada.
Depois disso, não houve mais contato e nenhum dos três conseguiu voltar ao acampamento. Entretanto, eles não foram os únicos que morreram naquele dia. A forte nevasca sepultou mais oito pessoas que faziam o caminho de volta do topo. Aquela temporada foi considerada tão letal que ficou conhecida como O Desastre de 1996 do Monte Everest, que acabou levantando debates sobre o movimento de quase assassinatos que a comercialização da montanha estava causando.
Apesar de a maioria das pessoas, inclusive a mídia, definirem que o corpo de Botas Verdes pertence a Paljor, o artigo "The Indian Ascent of Qomolungma by the North Ridge", escrito por PM Das e publicado no The Himalayan Journal, aponta que há uma possibilidade de que ele fosse de Dorje Morup. Das escreveu que o grupo de alpinistas de Fukuoka que também se aventurava na montanha naquele dia viu dois homens descendo pela rota da montanha antes de os perderem de vista às 19h30.
Morup teria sido encontrado no dia seguinte movendo-se lentamente pelo caminho entre o Primeiro e o Segundo Passo. A equipe japonesa subia enquanto ele voltava do cume e o ajudou a alcançar o próximo trecho de corda. Na viagem de retorno, o grupo teria encontrado Morup com roupas intactas, caído perto de uma rocha posicionada na linha de descida da montanha, provavelmente morto no fim da tarde de 11 de maio. Segundo Das, o cadáver de Paljor nunca foi encontrado.
Além da confusão sobre a correta identificação de Botas Verdes, outro mistério surgiu ao redor do cadáver, que já havia se tornado parte da montanha tanto quanto as rochas. Em 2014, ele simplesmente desapareceu de sua posição depois de 13 anos desde o primeiro registro oficial captado pelo alpinista francês.
A possibilidade de alguém tê-lo enterrado foi descartada, visto que são necessárias no mínimo oito pessoas para carregar um cadáver congelado. Além disso, o gelo ao redor de Botas Verdes precisaria ter sido escavado, mas não havia nenhum sinal disso. As autoridades chinesas e nepalesas alegaram que não autorizaram nenhuma equipe de busca e remoção de cadáveres. Sendo assim, é também muito improvável que alpinistas independentes tenham feito o trabalho, uma vez que têm uma quantidade de oxigênio racionada em seus cilindros devido ao ar rarefeito.
Ainda que muitos tenham especulado que o corpo encontrado pendurado em um penhasco em meados de 2017 seja o de Botas Verdes, não existe nenhuma confirmação convincente disso e até hoje o seu desaparecimento só aumentou a aura de mistério acerca de sua origem e de seu fim.