Ciência
24/08/2020 às 15:00•3 min de leitura
Foi atribuído o nome "operação de bandeira falsa" aos atos cometidos por nações que organizam ataques a si mesmas com o intuito de atribuir a culpa a países inimigos ou forças terroristas, para que assim pudessem efetuar um ataque surpresa. O termo foi cunhado a partir das práticas de navios piratas que hasteavam bandeiras com as cores de outras nações para enganarem os navios mercantes e poder atacá-los de repente.
Esse tipo de operação tem sido usada com sucesso desde 1788, quando o alfaiate-chefe da Ópera Real Sueca recebeu uma ordem para costurar uniformes militares russos para que fossem usados pelos suecos para encenar um ataque a Puumala, um posto avançado sueco na fronteira russa-sueca, causando o início da Guerra Russo-Sueca. A sabotagem ferroviária dos japoneses em 1931 que originou o Incidente de Mukden (também chamado de Incidente da Manchúria) foi outro que ganhou destaque na linha histórica desse tipo de evento.
Entretanto, nenhum desses ficou tão famoso quanto o incidente orquestrado pela Alemanha nazista.
Reinhard Heydrich. (Fonte: The Sun/Reprodução)
Por um fio, há muitos anos, foi em meados de 1939 que as relações diplomáticas entre a Alemanha e a Polônia se esfacelaram de vez. Hitler deplorava a cláusula do Tratado de Versalhes estabelecida em 1919 que concedia à Polônia o Corredor Polonês, uma faixa de terra que dava aos poloneses acesso ao mar e à cidade livre de Danzig, pois isolava a Alemanha de seu território da Prússia Oriental. Portanto, ele insistia que o país devolvesse o que era de propriedade alemã.
Diante da inflexibilidade do governo polonês, no verão daquele mesmo ano, Hitler já estava fabricando o seu pretexto para pôr em prática um plano de bandeira falsa. Ele iniciou uma campanha midiática internacional alegando que a Alemanha estava sendo vítima de agressão polonesa, usando reportagens falsas sobre os cidadãos alemães que viviam no país estarem sofrendo tortura.
(Fonte: Politize!/Reprodução)
O intuito de invasão ao país já existia de maneira mais consistente há 2 anos quando os nazistas criaram a Operação Tannenberg, que visava fuzilar os poloneses para que o ataque e a colonização alemã do Oriente acontecesse. Com a ajuda de cerca de 20 mil alemães que viviam na Polônia para trabalhar em função de organizações nazistas de subversão, eles montaram listas ultrassecretas com mais de 61 mil membros da elite polonesa que deveriam ser assassinados para a desestruturação político-social sistemática do país.
Em 8 de agosto de 1939, Reinhard Heydrich, um oficial superior do Partido Nazista conhecido como "o homem com o coração de ferro", sugeriu a ideia de causarem uma série de incidentes na fronteira da Alemanha com a Polônia, nos quais os alemães seriam as “vítimas” desses ataques. Heydrich, que supervisionaria a operação junto ao Esquadrão de Proteção da SS, nomeou o plano como Operação Himmler, em homenagem a Heinrich Himmler, um dos principais líderes do Partido Nazista e chefe do Exército da Reserva.
(Fonte: Atlas Obscura/Reprodução)
A operação promoveria vários ataques coordenados a postos avançados que ficavam relativamente isolados do alcance do governo alemão, o que justificaria esse suposto ataque polonês. O mais importante de todos, porém, estava planejado para acontecer na cidade de Gleiwitz, localizada na Alta Silésia (antiga fronteira da Alemanha com a Polônia), onde os nazistas interviriam em uma transmissão de rádio para enviar uma declaração de nacionalismo extremo polonês com a intenção de despertar um sentimento de opressão nos alemães com a ameaça de uma possível guerra.
Os nazistas precisaram pensar em tudo para que a ação parecesse o mais genuína possível. Para isso, eles drogaram e fuzilaram prisioneiros do campo de concentração de Dachau, esmagaram os seus rostos para impossibilitar a identificação, vestiram-lhes com uniformes do exército polonês para que se passassem pelos “rebeldes poloneses” e implantaram folhas de pagamentos em seus bolsos. Essa parte do plano ficou conhecida como "Operação Enlatados", pois os militares nazistas apelidavam de "enlatados" as vítimas dos campos de concentração.
Eles ainda assassinaram com uma injeção letal o agricultor alemão-silesiano Franciszek Honiok, de 43 anos, que já havia sido preso pela Gestapo e era conhecido por ser simpatizante dos poloneses. Eles atiraram no homem para parecer que ele havia participado do ataque. Tudo isso serviu como provas que foram apresentadas às entidades internacionais e à imprensa como justificativa para o ataque alemão.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
Para missões daquele tipo, Heydrich usava o agente Alfred Naujocks, um dos assassinos mais gabaritados do Esquadrão de Ações Especiais do Partido Nazista. Em 31 de agosto de 1939, às 20h, Naujocks e mais 7 militares da SS disfarçados de poloneses invadiram a estação de transmissão de rádio de Gleiwitz.
Enquanto eles espancavam quase até a morte a equipe alemã para que tudo parecesse autêntico, Naujocks anunciou no microfone que a estação estava em mãos polonesas. Até hoje é incerto o conteúdo exato da mensagem, porém ela deixava claro o suposto repúdio dos poloneses aos alemães.
Na manhã de 1º de setembro de 1939, do Palácio de Reichstag, Hitler fez um discurso sobre os “três incidentes graves ocorridos na fronteira com a Polônia”, anunciando a tão esperada guerra contra o país. O Fall Weiss, plano estratégico de invasão contra a Polônia, aconteceu no mesmo dia. Enquanto Hitler falava, as tropas do Partido Nazista em tanques de guerra colocavam em ação a Operação Tannenberg e invadiam o território polonês, assassinando quem estivesse pela frente. No fim de outubro daquele ano, cerca de 20 mil poloneses tinham sido mortos. Em janeiro de 1940, estima-se que 42 mil pessoas, entre crianças e adultos, foram dizimadas pelos nazistas.
(Fonte: DW/Reprodução)
No final das contas, o plano foi todo articulado pela alta inteligência nazista, mas foi o assassino Alfred Naujocks que ficou conhecido como o homem que começou a Segunda Guerra Mundial na Europa.