Ciência
15/01/2018 às 17:47•7 min de leitura
O dia 16 de janeiro de 2018 marca o aniversário de 15 anos do voo STS-107, a última decolagem do ônibus espacial Columbia, um dos seis veículos espaciais construídos para o Programa Space Shuttle da NASA, que levou astronautas e cargas importantes para a órbita da Terra entre 1981 e 2011. Durante esses 30 anos, muito se avançou na história da ciência graças a essas missões, mas muito também foi perdido em acidentes trágicos.
O dia 1 de fevereiro de 2018 marca os 15 anos do acidente que matou sete astronautas a bordo do Columbia em seu processo de reentrada na atmosfera terrestre. Após 15 dias no espaço e a realização de uma série de experimentos científicos, a nave teve problemas no retorno para a Terra e foi pulverizada nos ares do Texas.
Tripulação morta no acidente do Columbia - da esquerda para a direita: David Brown, Rick Husband, Laurel Clark, Kalpana Chawla, Michael Anderson, William McCool e Ilan Ramon
Esse foi o segundo acidente fatal envolvendo o Programa Space Shuttle: o ônibus espacial Challenger explodiu sobre o Cabo Canaveral, na Flórida, apenas 73 segundos após sua decolagem. Nele também morreram sete astronautas, vítimas de uma falha em um anel de vedação no foguete de propulsão, que teve um vazamento de gás pressurizado. Isso fez com que o foguete direito se separasse da nave, causando uma falha estrutural no tanque externo do propulsor e o ônibus espacial em si acabou destruído pela força aerodinâmica.
Como nada de ruim havia acontecido, a NASA tratava o evento como um 'desprendimento de espuma' comum
O caso do Columbia foi bastante diferente, mas também causado por uma falha ocorrida já no lançamento da nave: durante o processo de decolagem, um pedaço de espuma isolante térmica do tamanho de uma maleta executiva desprendeu-se do foguete propulsor e acertou a asa do ônibus espacial.
Não era a primeira vez que isso acontecia – esse desprendimento de partes de espuma que servem para o isolamento do foguete. Outras quatro decolagens de ônibus espaciais registraram o mesmo fato, inclusive no lançamento da nave Atlantis, feito apenas duas decolagens antes da última do Columbia. Como nada de ruim havia acontecido, a NASA tratava o evento como um “desprendimento de espuma” comum.
Bloco de espuma isolante similar a que teria se soltado do propulsor do Columbia e atingido a asa do ônibus espacial
Era normal para a NASA lidar com esses problemas, afinal, decolagens são cheias deles. A diferença é que esses eventos são controlados e analisados para que suas consequências não sejam perigosas ou até mesmo fatais e, até então, esse desprendimento de espuma do isolamento térmico dos foguetes era considerado algo a se esperar.
Após 82 segundos da decolagem, um pedaço da espuma de isolamento desprendeu-se do propulsor e fez um buraco de 15 a 25 cm de diâmetro no painel de fibra carbono
Esse material isolante colocado na parte externa dos propulsores não serve para manter o calor do combustível dentro do foguete, mas sim para impedir que sua estrutura congele devido às baixíssimas temperaturas do hidrogênio e do oxigênio líquidos que servem como combustível para os motores.
Após 82 segundos da decolagem, um pedaço da espuma de isolamento desprendeu-se do propulsor e fez um buraco de 15 a 25 cm de diâmetro no painel de fibra carbono reforçado da asa esquerda do ônibus espacial. A NASA estava ciente disso pois possuía um sistema de filmagem feito especialmente para analisar os desprendimentos de detritos da nave e tratou de tentar analisar o tamanho do estrago.
Simulação do dano causado pelo desprendimento da espuma de isolamento no painel de fibra de carbono da asa de um ônibus espacial
Todos os cenários analisados levavam à conclusão de que não havia possibilidade de nenhum acidente grave ou fatal
Engenheiros da agência espacial entraram em contato com o Departamento de Defesa norte-americano no mínimo três vezes para que ativassem seus meios espaciais ou terrestres de maneira a conseguir visualizar melhor e avaliar a gravidade do dano feito na asa do Columbia. Entretanto, o gerenciamento da NASA impediu o contato do Departamento e chegou até a proibir que colaborassem com a análise.
A agência espacial acreditava de fato que não haveria nenhum problema a ser resolvido e que, mesmo que houve, seria impossível solucioná-lo. Todos os cenários analisados levavam à conclusão de que não havia possibilidade de nenhum acidente grave ou fatal, apenas avarias ao ônibus espacial, especialmente na parte de seu isolamento térmico. Para eles, a fibra de carbono reforçada era impenetrável.
As apertadas camas onde a tripulação do Columbia dormia
Outros métodos de análise dos possíveis riscos que o incidente poderia causar foram usados, inclusive um software desenvolvido para prever os danos possíveis na fibra de carbono. A ferramenta indicou que o choque poderia ter danificado severamente a área, mas a própria NASA minimizou o resultado. No fim das contas, a agência chegou à conclusão que não havia risco em relação ao incidente e enviou um email para a tripulação do ônibus espacial:
“Durante a subida, em aproximadamente 80 segundos, uma análise fotográfica mostra que alguns detritos do ponto de ligação -Y ET do Bipod foram soltos e, subsequentemente, impactaram a ala esquerda do orbitador [o ônibus espacial] na área de transição da junta para a asa principal, criando um a chuva de partículas menores. O impacto parece estar totalmente na superfície inferior e não são vistas partículas que atravessam a superfície superior da asa. Os especialistas analisaram a fotografia de alta velocidade e não há preocupação com os danos causados na fibra de carbono reforçada. Vimos esse mesmo fenômeno em vários outros voos e não há absolutamente nenhuma preocupação com a entrada”.
Dentro do Columbia estavam sete astronautas de diversas origens e com diversas funções. O comandante da missão era o coronel Rick Husband, da Força Aérea dos Estados Unidos. O piloto era o comandante da Marinha norte-americana William McCool.
Algumas imagens foram registradas dos momentos anteriores ao acidente que causou a morte dos sete
Os outros cinco especialistas de missão eram o tenente-coronel da Força Aérea Michael P. Anderson, o coronel Ilan Ramon (da Força Aérea de Israel), o capitão da Marinha David M. Brown e duas mulheres, a capitã da Marinha Laurel Blair Salton Clark e a engenheira aeroespacial Kalpana Chawla.
Algumas imagens foram registradas dos momentos anteriores ao acidente que causou a morte dos sete e a destruição completa do Columbia no dia 1 de fevereiro de 2003 ao tentar adentrar a atmosfera da Terra. A seguir, o vídeo mostra os últimos momentos da tripulação do Columbia (com legendas em inglês):
Ao iniciar o procedimento de reentrada do Columbia na atmosfera terrestre, o comandante Husband e o piloto McCool receberam sinal positivo para a manobra e todas as condições eram positivas para o retorno. O ônibus espacial passou sobre o oceano Índico de cabeça-para baixo em uma altitude de 282 km e velocidade de mais de 28 mil km/h e penetrou a atmosfera sobre o Pacífico, já em posição correta, a 120 km de altura.
Nesse momento, o Columbia parecia uma bola de fogo no ar por causa do ar superaquecido ao redor dele
Foi aí que a temperatura da espaçonave começou a subir, o que é comum nesses casos. A asa do Columbia atingiu 2,5 mil °C, muito mais pela compressão do gás atmosférico causado pelo voo supersônico da nave do que apenas pelo atrito entre o veículo e o ar. O ônibus espacial começou a sobrevoar o solo norte-americano pela Califórnia, próximo a Sacramento. No minuto seguinte, relatos de testemunhas mostram que já era possível ver pedaços da espaçonave sendo desprendidas pelo céu.
Nesse momento, o Columbia parecia uma bola de fogo no ar por causa do ar superaquecido ao redor dele. Ainda não havia amanhecido na costa oeste dos Estados Unidos, o que colaborou com a visibilidade do evento. Até esse ponto, tudo estava ocorrendo como deveria em um pouso normal de ônibus espacial, mas o controle de voo na Terra começou a perceber problemas nos sensores da asa esquerda da nave.
O Columbia é fotografado como uma bola de fogo nos ares e diversos destroços se desprendendo da nave
O Columbia seguiu seu caminho planejado na direção da Flórida, onde faria seu pouso do mesmo lugar de onde partiu, o Kennedy Space Center no Cabo Canaveral. A nave fez algumas manobras para acertar o seu caminho enquanto sobrevoava os estados de Nevada, Utah, Arizona, Novo México, tudo isso com uma temperatura de 3 mil ° C na asa, o que continuava sendo normal em um pouso.
Ao sobrevoar o Texas, o Columbia perdeu uma placa de proteção térmica que acabou sendo a peça encontrada mais a Oeste dentre todas as partes recuperadas da nave. O controle da missão decidiu avisar os tripulantes sobre as falhas gerais nos sensores de ambas as asas, mas a resposta da nave acabou se perdendo. O comandante Husband confirmou ter recebido a informação, mas sua fala foi cortada.
Foi aproximadamente sobre a cidade de Dallas e arredores que o maior número de testemunhas em terra viram o Columbia sendo completamente pulverizada nos ares
Cinco segundos depois disso, a pressão hidráulica, usada para manobrar o ônibus espacial, foi perdida. Tanto o controle da missão em terra sabia disso quanto os tripulantes da nave, que provavelmente ouviram um alarme indicando a falha. Só aí que os astronautas souberam que estavam tendo um problema gravíssimo no voo, com a nave perdendo completamente o controle.
Foi aproximadamente sobre a cidade de Dallas e arredores que o maior número de testemunhas em terra viu o Columbia sendo completamente pulverizado nos ares, com os pedaços da espaçonave se quebrando em partes cada vez menores que deixaram uma grande quantidade de rastros no céu. Menos de um minuto depois, o módulo da tripulação, que ainda estava como uma parte intacta, também foi destruído e os sete astronautas foram mortos.
Destroços recuperados do Columbia e remontados para investigação sobre o acidente
Em 2011 o Programa Space Shuttle foi desativado. No lugar dele, diversas operações do governo, por meio da NASA, de empresas aeroespaciais particulares, como a SpaceX, e de outras agências espaciais de outros países, vêm tomando o lugar dos ônibus espaciais para levar cargas comerciais e científicas para o espaço, além de suprir a Estação Espacial Internacional (ISS) com todo o tipo de mantimentos necessários e, claro, astronautas.
Os sete tripulantes do Columbia também não foram esquecidos e recebem homenagens regulares por parte de instituições de estudo da ciência e de memoriais
Alguns dos ônibus espaciais aposentados estão em exibição em diversos museus e instituições dos Estados Unidos (esse redator que vos escreve já teve a oportunidade de ver com os próprios olhos a Atlantis, exibida no Centro de Visitantes do Kennedy Space Center, no Cabo Canaveral). Já as duas espaçonaves que sofreram os acidentes fatais, como a Challenger e o Columbia, cuja história foi brevemente contada aqui, vão viver sempre na memória de quem sabe a importância que elas tiveram no desenvolvimento da ciência pelo ser humano.
Ônibus Espacial Atlantis em exposição no Centro de Visitantes do Kennedy Space Center
Os sete tripulantes do Columbia também não foram esquecidos e recebem homenagens regulares por parte de instituições de estudo da ciência e de memoriais espalhados não apenas pela Terra, mas até fora dela, como a placa que diz “In Memorian” e menciona o nome da tripulação no Mars Rover chamado Spirit, como se do espaço nunca tivessem saído e lá continuassem para sempre.
Memorial do Columbia no Mars Rover Spirit, em Marte
O último voo do Columbia: da decolagem ao trágico fim da missão STS-107 via TecMundo