Mistério na neve: o estranho incidente no lago Anjikuni

17/02/2020 às 14:005 min de leitura

Em uma noite de 1930, enquanto o impiedoso inverno dardejava neve pela paisagem abandonada ao longo do extremo norte canadense, um caçador de peles chamado Joe Labelle enfrentava o frio em sua caminhada pela extensão do Rio Kazan, na região de Kivaliq, em Nunavut. Ele procurava pela vila de povos inuítes — membros de uma nação indígena que habita a Groenlândia, o Canadá e o Ártico —, localizada às margens do lago Anjikuni. Esse local havia se tornado o seu porto-seguro durante as suas expedições.

Lá, desde que os descobriu, sempre foi muito bem recebido pela calorosa companhia dos moradores da comunidade, que era movimentada, barulhenta e musical. Só que naquela noite não aconteceu isso. Labelle foi recepcionado pelo silêncio, pela escuridão e, principalmente, pelo o que se tornaria um dos maiores mistérios da História.

A última fogueira

(Fonte: Project Yourself/Reprodução)

Com um tom assombroso de lenda, a vila havia desaparecido! Não as suas casas, tendas, roupas, pertences e rastros, mas as pessoas. O cenário era de abandono e não de mudança, tampouco de evasão. Ainda havia fogueiras que queimavam um fogo quase morto, os estoques de alimentos estavam intactos e cheios, os instrumentos musicais alinhados às rodas, provavelmente prontos para serem tocados.

O mais atípico em toda a situação era de que não havia motivos para abandonar as belas margens do Anjikuni, ainda mais assim, do nada, em uma noite extremamente gélida. A região rochosa do lago era notória e disputada entre os povos por conta do excesso de trutas sadias e pelas águas claras; também era pelos caçadores, por se tratar de uma terra repleta de caribus, que costumam migrar aquela região há mais de 200 anos.

Os cães também não estavam na vila, mas os trenós dos aldeões, que eles puxavam, continuavam no mesmo lugar, enfileirados em um estacionamento. Não havia sequer um sinal de neve mexida ao redor deles, indicando um possível desejo de partida. O local onde era mantido todo o armamento de caça e de defesa pessoal permanecia intacto.

Em uma inspeção curiosa, e um tanto quanto desesperada, à procura dos homens e das mulheres que ali moravam, Joe Labelle percebeu algo intrigante: não existiam passos na neve além dos seus. Era impossível que ela tivesse caído o suficiente para tornar o chão liso de novo, visto que um caldeirão com comida ainda estava quente e soltava fumaça sobre os restos aquecidos do fogo. Qualquer que tenha sido a situação, havia acontecido há pouco tempo.

Tudo apontava que aquelas 2 mil pessoas haviam simplesmente desaparecido no ar frio e congelante do norte. Mas como? E Por quê?

Profanação

(Fonte: Period Paper/Reprodução)

Desnorteado e assombrado pela descoberta, Joe não conseguiu permanecer na vila, apesar da atração que a comida e o abrigo ofereciam ao seu estômago vazio e ao seu corpo exaurido. Por isso, ele atravessou o terreno que ficava próximo às montanhas, pelo deserto que estava a vila, e dirigiu-se até o escritório de uma estação de telégrafo para poder enviar uma mensagem.

O homem forçou o seu corpo a resistir ao estado de hipotermia, que começava a se apossar dele, para conseguir entrar em contato com a Real Polícia Montada do Canadá. Ao chegar à vila abandonada, a tropa da RPMC realizou uma busca pelo local e descobriu algo ainda mais estranho e terrível do que a suposta desaparição de todos os habitantes: na periferia da pequena vila, onde era situado os cemitérios, eles encontraram os túmulos violados e vazios. Não havia um cadáver que não tivesse sido exumado e sumido. Para os povos inuits, a profanação de um local sagrado era um ato ilegal e também uma espécie de enorme tabu religioso.

A polícia descartou a hipótese de que aquilo pudesse ter sido de natureza animal, uma vez que o chão estava congelado e que desenterrar os corpos exigiria ferramentas pesadas, além de que as pedras dos túmulos tinham sido meticulosamente empilhadas ao lado das covas. Mais à frente, depois do terreno de morte, eles descobriram uma matilha de cães amarrados a uma árvore, tombados e enrijecidos pelo frio, provavelmente mortos de fome. No chão, abaixo de 3 metros de neve, cachorros foram enterrados de cabeça para baixo.

Inconformados com as evidências insólitas, a polícia executou uma investigação mais profunda, a qual chegou a durar 2 semanas. Durante esse processo, cruzando as informações encontradas com o que estava sendo cozinhado em um dos caldeirões, as autoridades chegaram a uma "torta" conclusão: os aldeões tinham sumido de lá há cerca de dois meses. No entanto, as indagações ainda eram diversas: Quem estava cozinhando? Como não haviam passos dessa suposta pessoa pela neve? Quem fazia a manutenção de tudo para manter tudo intocável daquele jeito? Como se os moradores tivessem desaparecido instantes antes da chegada de Joe Labelle? Por qual motivo o cemitério foi revirado, e os cachorros abandonados à própria sorte?

Um homem na neve

(Fonte: Monnaie Magazine/Reprodução)

O primeiro relato oficial dado pela imprensa apareceu no prestigiado jornal canadense Le Pas, da região de Manitoba, no qual o repórter Emmet Kelleher publicou uma matéria acerca do bizarro desaparecimento ocorrido em novembro de 1930, intitulada “A Vila dos Mortos”.

No entanto, como não haviam imagens de Anjikuni que pudessem encabeçar a matéria, foi usada uma fotografia meramente ilustrativa de um acampamento indígena que também havia sido abandonado, só que em 1909. Isso fez com que muita gente não desse créditos à matéria, embora a imprensa e as autoridades não medissem esforços para impulsionar os acontecimentos às margens do lago Anjikuni.

Joe Labelle também foi uma peça-chave para manter as bases da história. Como a primeira testemunha, ele confessou, em um de seus muitos relatos aos jornais, perceber que algo estava errado desde que vira os caldeirões de comida abandonados, dando a impressão de que os aldeões haviam fugido durante a preparação do jantar. Porém, ele teve ainda mais certeza de algo estranho estar acontecendo depois de notar que, em todas as tendas, tinha um rifle descansando próximo à entrada, afinal, nenhum inuíte ia a lugar algum sem sua arma a tiracolo.

O homem deduziu que a aldeia havia entrado em furor com a presença de uma entidade maligna que os inuítes chamavam de Tornarsuk — considerado pelos povos inuits um demônio chanceler de uma horda de espíritos das trevas que se manifestava na forma de um urso. Era da tradição desses povos recitar orações e fazer sacrifícios de animais a fim de manter esse grande mal sob controle.

Quatro meses após o incidente de Anjikuni, um homem de origem inuit chamado Saumek foi encontrado na neve perto da rodovia da Baía de Hudson. As suas pernas estavam sob um processo avançado de congelamento, e ele estava muito debilitado e assustado. Levado para o hospital da cidade, o homem confirmou ser um dos habitantes da vila desaparecida, mas se negou a responder a qualquer uma das outras questões, repetindo incessantemente um nome: Tornarsuk.

Mesmo sob ameaça de prisão, Saumek só chorava, balançando-se para a frente e para trás, enquanto repetia o nome da entidade em que acreditava. No dia seguinte, quando a polícia estava decidida a levar o homem detido, com o intuito de aterrorizá-lo ainda mais e, talvez, só assim extrair algo dele, foram informados de que o inuit havia fugido do hospital. Desde esse dia, ele nunca mais foi localizado.

Fumaça e pegadas

(Fonte: Enigma Plus/Reprodução)

O autor Frank Edwards adicionou alguns fatos do incidente ocorrido no lago Anjikuni em seu livro Stranger than Science, em 1959. Com a repercussão do livro pelo mundo todo, rapidamente a RPMC passou a alegar que esse episódio nunca aconteceu e que não passava de invenção do autor — sendo que, na época, eles foram os primeiros a se empenharem em uma verdadeira cruzada para que a informação sobre o ocorrido chegasse a todos.

Quando foram indagados sobre o estranho desaparecimento daquelas pessoas, as autoridades canadenses negaram veementemente saber de alguma informação, mesmo diante da apresentação de documentos registrados pela imprensa — que datavam os anos 1930 — que exploravam cada vírgula do sumiço do povo daquela vila. Eles não se intimidaram com as provas: não desmentiram o fato nem voltaram atrás em sua posição. Por que, de repente, a Real Polícia passou a fingir que nada havia acontecido?

Com um novo suspiro de interesse, o caso foi reaberto e, com isso, tanto pesquisas como investigações foram conduzidas a fim de tentar emendar as muitas pontas soltas dessa história. Descobriram que Joe Labelle não era o caçador experiente que ele afirmava ser, tampouco tinha muito conhecimento dos territórios do Norte. Por isso, pouco se podia levar em consideração a respeito do que ele tinha visto ou não. Emmet Kelleher, que publicou a primeira matéria sobre o assunto, era tido como um jornalista altamente sensacionalista, que tinha o objetivo de escrever histórias muito fantasiosas sobre a vida no norte selvagem.

Dessa forma, tudo poderia ser só mais uma lenda ou invenção para divulgar na mídia. Entretanto, de fato 2 mil pessoas desapareceram da extensa vila que beijava as margens do lago Anjikuni em novembro de 1930, ou talvez antes disso. Absolutamente tudo foi deixado para trás, até mesmo o básico: comida e armas. Embora o povo inuit fosse nômade e, então, a situação bem poderia se remeter a um abandono sazonal, nada justificaria a maneira como aconteceu: parece que eles foram tragados para outra dimensão, abduzidos por uma força extraterrestre ou até mesmo afugentados por algo de natureza maligna.

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