Ciência
16/11/2020 às 15:00•4 min de leitura
O final do século XIX foi marcado pela ampla necessidade de atualizar os métodos de execução da época, que eram o enforcamento, fuzilamento e decapitação. Sendo assim, em 1881, o dentista e inventor Alfred P. Southwick, morador de Nova York, começou a desenvolver a cadeira elétrica, que poderia ser uma nova alternativa para execução humana.
Acredita-se que Southwick foi atrás do engenheiro eletricista Harold P. Brown, conhecido por trabalhar com Thomas Edison, para que o ajudasse a estabelecer uma corrente elétrica alternada fornecida através de geradores Westinghouse para que o equipamento pudesse funcionar adequadamente. Em 1890, a cadeira elétrica ficou pronta e passou a ser adotada ao longo dos anos pelos estados norte-americanos.
Normalmente, o processo de execução era dividido em 3 descargas elétricas: a primeira tinha como objetivo deixar o condenado inconsciente, causar fibrilação ventricular e parada cardíaca. O segundo choque, mais fraco, visava causar danos irreparáveis nos órgãos vitais.
Nos Estados Unidos, a pessoa era submetida a 2.450 volts iniciais por 15 segundos, sendo que acima de 200 volts já é o suficiente para causar necrose nos tecidos sob a pele. Vinte segundos depois, o método era repetido por mais 3 vezes.
Entre as 4.375 execuções na cadeira elétrica ao longo de 130 anos, apenas 84 deram errado.
Era novembro de 1944 quando o farmacêutico de 53 anos, Andrew Thomas, muito conhecido na cidade de St. Martinville, em Luisiana, nos Estados Unidos, foi encontrado baleado, com cinco tiros à queima-roupa, do lado de fora de sua casa. O apreço das pessoas pelo homem causou uma revolta popular que criou uma intensa pressão para que as autoridades encontrassem logo o culpado e o punisse.
Dois meses após a execução cruel de Thomas, o xerife da cidade, El Resweber, enlouquecendo com os motins organizados pelos cidadãos, ordenou que alguns policiais saíssem à procura de um homem que pudessem responsabilizar pelo crime. A fala não foi propriamente essa, mas Resweber deixou isso claro nas entrelinhas de sua ordem, afinal ele precisava acalmar o povo.
Na década de 1940, nos Estados Unidos, um homem negro andando sozinho por qualquer lugar era motivo suficiente para ser parado e investigado. Foi assim que aconteceu com o jovem de 16 anos, Willie Francis, que estava a quase 300 km do local onde Andrew Thomas foi assassinado, quando foi parado pela polícia. Ele ia visitar suas irmãs, mas a polícia decidiu prender Francis simplesmente porque ele gaguejou quando foi interrogado.
Levado até o departamento de polícia de Port Arthur, o medo de Francis manteve o seu depoimento frágil e “suspeito”, portanto fez todos acreditarem que ele tinha algum envolvimento no assassinato de Andrew Thomas.
Em apenas algumas horas na sala de interrogação, a polícia de Port Arthur saiu com uma suposta confissão do jovem: “Eu, Willie Francis, agora com 16 anos, roubei a arma do Sr. Ogise (o deputado August Fuselier) em St. Martinville e matei Andrew Thomas, em 9 de novembro de 1944, por causa de um segredo. Peguei uma bolsa preta, coloquei a arma dentro e a vendi em Nova Ibéria”. Ele também supostamente confessou que teria agredido e roubado um homem em Port Arthur, sendo que ele nem havia chegado lá quando foi interceptado.
A história, no entanto, fica ainda mais irônica e curiosa. A arma “roubada” pertencia ao deputado Ogise, o qual alegou que ela tinha sumido dois meses antes do crime, mas não existia denúncia do furto. Além disso, o revólver e as balas recuperadas durante a perícia foram perdidas “misteriosamente” antes do julgamento quando estavam em trânsito para análise no laboratório criminal da cidade.
E, como se isso não bastasse, o deputado já havia ameaçado de morte Andrew Thomas porque estava convencido de que sua esposa tinha um caso com ele. Inclusive, a cidade inteira achava que um marido furioso havia cometido o crime, visto que Thomas tinha fama de ser muito mulherengo.
Alvin e Ida Van Brocklin, vizinhos do farmacêutico, olharam pela janela quando ouviram os tiros e se depararam com um carro de luzes acesas estacionado do lado de fora da casa da vítima. Francis era pobre, nunca aprendeu a dirigir e tampouco tinha acesso a um carro, mas isso foi ignorado pelo juiz.
Apesar de todas as provas circunstanciais e uma opinião popular dividida, Willie Francis foi condenado à cadeira elétrica pelo assassinato de Andrew Thomas. Em 3 de maio de 1946, ele foi amarrado ao equipamento e eletrocutado com potência máxima pelo Capitão Ephie Foster e o oficial Vincent Venezia.
O jovem descreveu que foi como se milhares de agulhas e alfinetes o espetassem. A dor era excruciante, por isso ele pediu para que desligassem o aparelho e o tirassem dali, mas isso não aconteceu. Entretanto, por incrível que pareça, no final dos três ciclos de descargas elétricas que deveriam ser fatais, Willie Francis permaneceu vivo.
Ele foi retirado da cadeira elétrica e seu caso se espalhou pelos jornais da cidade. Em uma sociedade altamente religiosa, isso foi o suficiente para que as pessoas acreditassem que Francis foi salvo porque de fato não era o culpado, e que isso era uma confirmação enviada por Deus.
Por outro lado, foi informado que, na verdade, a cadeira havia falhado depois de ser preparada incorretamente. Naquela época, o dispositivo era portátil e transportado em um caminhão de uma penitenciária à outra. Além disso, oficiais alegaram que os executores responsáveis por Willie Francis ainda estavam zonzos de uma noite de bebedeira no dia anterior à execução. De qualquer forma, ninguém se convenceu.
O jovem advogado Bertrand DeBlanc assumiu o caso de Francis, que seria submetido à morte novamente. No entanto, DeBlanc alegou que o jovem já havia cumprido a pena e que sua sobrevivência era uma consequência à parte.
Em 1947, em uma repercussão nacional, o advogado levou o caso de Francis para a Suprema Corte dos Estados Unidos, apesar de ter tido seu pedido negado pelo Conselho de Perdão de Luisiana assim como a clemência pelo próprio governador da cidade, Jimmie Davis. Em audiência, apresentando provas e tudo o que tinha em mãos, DeBlanc declarou que a condenação violava no mínimo 7 direitos básicos, mas o conselho se mostrou irredutível.
“Estou pronto para morrer”, disse Francis, resignado, quando DeBlanc comunicou que recorreria ao veredicto novamente. Mas ele não quis, então em 9 de maio de 1947, às 12h, Willie Francis foi amarrado à cadeira elétrica de novo. “Não tenho nada a dizer”, foram suas palavras finais antes que fosse eletrocutado. Em questão de 5 minutos, o jovem foi declarado morto.