Artes/cultura
22/05/2014 às 10:54•4 min de leitura
Imagine se você caísse no sono de repente, durante uma atividade normal da sua rotina, e só fosse acordar dois, três ou até seis dias depois? Pois, esse fenômeno bem esquisito tem acontecido com frequência com algumas pessoas na pequena cidade russa de Krasnogorsk e no vilarejo de Kalachi, no Cazaquistão.
A condição misteriosa tomou conta dessas regiões e ninguém sabe a razão por trás disso. Os cientistas e especialistas estão realmente perplexos com o fenômeno, buscando respostas do motivo pelo qual ele acontece. Entre os fatos interessantes é que essa “doença do sono” acontece em épocas.
A primeira onda de casos aconteceu em março de 2013. A segunda atingiu mais algumas pessoas em maio de 2013. Desde então, houve mais três períodos de casos registrados: durante a época de Ano Novo de 2014, logo após as férias de inverno e agora em maio novamente. Na maioria dos casos, o sono é acompanhado por uma perda de memória temporária.
Uma das primeiras vítimas da estranha síndrome foi Marina Felk, uma trabalhadora rural de 50 anos de idade de Kalachi. Entre algumas de suas atividades em sua pequena propriedade, ela foi fulminada por um forte sono: "Eu estava ordenhando as vacas, como de costume, no início da manhã e adormeci", disse ela ao Siberian Times.
A mulher afirmou que não se lembrava de nada, apenas do momento em que acordou no hospital. “A enfermeira sorriu para mim e disse: 'Bem-vinda de volta Bela Adormecida, você finalmente acordou'. O que mais me lembro? Nada. Eu dormi por dois dias e duas noites. As mulheres da minha ala disseram que eu tentei acordar várias vezes, dizendo que precisava urgentemente ordenhar minhas vacas", completou Marina.
Curiosamente, a doença não se limita aos moradores locais. Os visitantes também são afetados. Foi o que aconteceu com Alexey Gom, de 30 anos, que estava visitando a sogra em Kalachi.
E, ao que tudo indica, o sono que ele teve não foi uma forma de escapar da sogrinha não. "Eu vim com a minha esposa para visitar a minha sogra. Pela manhã, eu precisava terminar um trabalho no meu notebook. Depois que eu liguei o aparelho e abri as páginas do documento que precisava ler, caí no sono. Parecia que alguém me desligou da tomada", disse ele ao Siberian Times.
O homem afirmou que acordou no hospital, com a esposa e sogra ao seu lado, e que os médicos não encontraram nada de errado com ele após uma bateria de exames. “Eu dormi por mais de 30 horas. Mas isso nunca aconteceu comigo antes, nunca na minha vida, nem com ninguém da minha família", disse Alexey.
Com algumas pessoas dessas regiões, os episódios do sono prolongado não acontecem apenas uma vez. Além disso, o tempo em que elas dormem podem se estender até seis dias. Lyubov Belkova foi uma pessoa que teve a doença por muitas vezes. Ele, que é vendedor de roupas no mercado local de Kalachi, foi vítima por nada menos do que sete vezes.
Sua filha caiu no sono profundo por duas vezes e sua neta, uma vez. E todos os seus colegas de trabalho também foram afetados em épocas diferentes. O que intriga os especialistas, e os moradores desses locais, é que algumas famílias são afetadas várias vezes, enquanto outras parecem imunes à doença.
O único fator comum é que parece acontecer principalmente com descendentes diretos de russos e alemães. As ocorrências da síndrome do sono se tornaram tão constantes, que mudaram até o comportamento dos habitantes da cidade. Como a maioria das pessoas nem imagina quando a doença vai atacar, cada um sempre carrega uma bolsa com roupas e itens pessoais, em caso de necessidade de ser levado às pressas para o hospital.
Mas afinal, o que poderia estar causando esse fenômeno? Quando a primeira epidemia ocorreu em 2013, os médicos acharam que era um caso de consumo de vodca má qualidade. No entanto, descobriram que nenhuma das seis pessoas que caíram no sono naquela época havia consumido álcool.
Alguns moradores acreditam que o problema surge depois de um súbito aumento na temperatura atmosférica. Outra teoria sugere que a água de uma mina de urânio abandonada nas proximidades escoa para os rios locais e acaba sendo consumida por moradores. Mas nada ainda tem uma confirmação.
A fim de descobrir o mistério, vários cientistas visitaram a remota região, buscando explicações para a epidemia do sono. Eles realizaram cerca de sete mil análises no solo e na água da área, em amostras de sangue das vítimas, cabelos e unhas.
Eles desconsideraram que tivesse algo a ver com o gás no subsolo e com sinais de telefone celular. Porém, eles testaram a presença de gás radônio nas casas, além de medirem níveis elevados de radiação, metais pesados, bactérias e vírus. Todos os testes não foram conclusivos.
Há algumas décadas, Krasnogorsk era uma cidade secreta liderada diretamente por Moscou, tendo cerca de 6,5 mil moradores que trabalhavam na mina de urânio. A vida por lá era muito próspera, mas as coisas mudaram drasticamente após a separação Soviética.
Apenas 130 pessoas permaneceram em Krasnogorsk, enquanto Kalachi tem uma população de 680 habitantes. Em ambas as regiões, as pessoas vivem humildemente com suprimentos e poucos recursos. Porém, esses fatos também não ajudaram nas investigações sobre a doença do sono.
"Infelizmente, a natureza da condição ainda não é conhecida. Excluímos infecções, verificamos sangue e o líquido da medula, mas nada está lá. Nós categorizamos como encefalopatia tóxica, mas 'tóxico' é apenas um palpite por aqui, pois a encefalopatia é apenas o título do conjunto de doenças do cérebro", disse o Dr. Kabdrashit Almagambetov, um médico pesquisador envolvido nas investigações.
Leonid Rikhvanov, um professor de geoquímica na Universidade Politécnica de Tomsk, tem algumas notícias para oferecer. Junto com sua equipe, ele estudou as amostras de urânio que um residente de Kalachi lhe enviou.
"Testamos as amostras e chegamos à conclusão de que o gás radônio é a razão para o sono, mas não por seu efeito radioativo, e sim pelo efeito químico do gás. Em outras palavras, a doença é causada pela evaporação da mina", disse Leonid. No entanto, mais testes são necessários para confirmar esta teoria.
Mas será que o radônio é realmente a verdadeira causa? Dr. Kabdrashit, que também é um anestesista, disse que ele usa gases semelhantes nos seus procedimentos anestésicos e os pacientes acordam uma ou duas horas após a cirurgia.
"Essas pessoas daqui dormem por dois a seis dias. Qual é a concentração deste gás, então? E por que uma pessoa pode adormecer e alguém que vive com ela não?", questionou o médico. De fato, mesmo com a conclusão de Leonid, nada está realmente confirmado. Mas as pesquisas para descobrir a causa da doença do sono por lá continuam.