Artes/cultura
07/01/2022 às 04:00•2 min de leitura
O sucesso mais recente da Netflix, Não olhe para cima, despertou a atenção, inicialmente, por conta de seu elenco de peso. Depois da estreia, porém, a trama principal envolvendo um cometa avassalador e a reação dos negacionistas frente à ciência, causou respostas e discussões muito ativas nas redes sociais. Sob a direção de Adam McKay, o filme leva ao público uma visão de como, mesmo em um mundo com tantas fontes de informações, a verdade ainda pode ser contada de diversas maneiras.
Na produção, os personagens mostram como a sociedade — e seus governantes — está alheia aos interesses e às necessidades da massa. Além disso, o filme demonstra como uma verdade pode ser alterada e manipulada, principalmente quando os líderes de uma nação colocam os seus interesses à frente da segurança da população, difundindo uma série de inverdades.
(Fonte: Netflix/Reprodução)
É preciso entender que a questão principal do filme, no entanto, não é a facilidade em manipular, como muita gente tem interpretado, mas sim a cultura do abstrato. Isto é, vivemos em uma era em que a realidade se confunde entre o real e o virtual. Também estamos passando por uma falta de fé, que tem relação com a era virtual, em que tudo se tornou questionável, mesmo por pessoas que não conhecem nada sobre o assunto.
Além disso, essa futilidade é resultado de um narcisismo impregnado na atual sociedade, muito por reflexo das redes sociais, em que por trás de uma tela o ser humano potencializou o narcisismo instintivo, transformando-o em algo abstrato, visto que ninguém é soberano o suficiente — a não ser que seja uma pessoa imortal ou escusa de defeitos, o que, sabemos, não existe. Na vida, assim como o equilíbrio é praxe, também é a semântica: o virtual é abstrato e, com ele, nossa vida está se tornando fantasiosa.
(Fonte: Netflix/Reprodução)
No enredo, os políticos gananciosos e extravagantes nos dão a percepção de como se pode votar de forma incoerente, mostrando uma sociedade vazia e sem cognição para perceber pessoas incompetentes e fraudulentas — nesse sentido, a crítica é mais que válida, dado os governantes mundiais atuais. E a sociedade em si, mergulhada em uma cultura pautada pela futilidade, desacredita daqueles que não são “famosos” o suficiente.
Para quem ainda não viu, Não olhe para cima aborda a guerra contra a ciência promovida por um grupo de empresários que elegem políticos “marionetes” com interesses egoístas e gananciosos em detrimento do bem-estar mundial. Diante disso, quando “cai a ficha” da realidade, já é tarde demais. E, caso a trama se torne realidade, somos todos culpados também. Esse é o reflexo dos riscos que vivemos atualmente.
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Fabiano de Abreu Rodrigues, colunista do Mega Curioso, é PhD, neurocientista com formações em Neuropsicologia, Biologia, História, Antropologia, Neurolinguística, Neuroplasticidade, Inteligência Artificial, Neurociência aplicada à aprendizagem, Filosofia, Jornalismo e formação profissional em Nutrição Clínica. Atualmente, é diretor do Centro de Pesquisas e Análises Heráclito, chefe do Departamento de Ciências e Tecnologia da Logos University International e membro da Federação Europeia de Neurociências e da Sociedade Brasileira e Portuguesa de Neurociências.