O primeiro ciberataque aconteceu em 1834

04/10/2023 às 14:004 min de leitura

Atualmente, a palavra "ciberataque" está totalmente vinculada à internet, mas nem sempre foi assim. Na verdade, os primeiros casos de ciberataques remontam às primeiras décadas da era da computação, não da internet, em meados das décadas de 1960 e 1970.

Para entender como o primeiro ciberataque aconteceu em 1834, em uma época em que a computação nem sonhava em existir, é preciso associar a palavra "ciberataque" à comunicação no geral, não só à internet. Sinais de fumaça, faróis, luzes refletidas e pombos-correio eram importantes formas de comunicação de baixa tecnologia a distância, usadas desde os tempos antigos. A urbanização da sociedade e sua expansão passou a exigir métodos mais modernos e eficazes para transmitir a informação de maneira rápida.

Torre do Telégrafo de Chappe. (Fonte: GettyImages/Reprodução)Torre do Telégrafo de Chappe. (Fonte: GettyImages/Reprodução)

Em 1790, a França estava em guerra, cercada por forças militares da Holanda, Grã-Bretanha, Prússia, Áustria e Espanha. Em meio à necessidade do governo sitiado em retransmitir mensagens rapidamente, o inventor Claude Chappe achou uma solução ao criar o telégrafo, uma rede nacional de comunicação em larga escala e alta velocidade, estabelecida por meio de uma série de torres com até 20 quilômetros de distância entre si, cada uma montada com um conjunto de postes de madeira que poderiam ser girados para criar quase 200 símbolos.

O telégrafo era um sistema com torres interligadas, sendo que cada uma delas tinha braços móveis de madeira no topo e cada combinação deles correspondia a letras e números. Os mensageiros observavam as sequências à distância, por meio de telescópios, e passavam a informação adiante. Apesar do trabalho árduo, os dados eram transmitidos por toda a França em questão de minutos, porém, como é possível perceber, não de maneira muito segura.

A inovação de Chappe

Claude Chappe. (Fonte: GettyImages/Reprodução)Claude Chappe. (Fonte: GettyImages/Reprodução)

Da mesma forma que um estudante de pós-graduação da Universidade de Cornell criou um vírus em 1988 para entupir grandes seções da internet logo no início de sua invenção, o mesmo aconteceu no século XIX — porque o sucesso atrai atenção.

A rede de telégrafo de Chappe podia enviar sinais a uma taxa de 3 minutos e viajar mais de 160 quilômetros em menos de 10 minutos, o que era bem mais eficaz do que usar cavalos ou outros meios. Claro, o sistema tinha inúmeras limitações, como interrupções devido às condições climáticas e perda de visibilidade em grandes extensões de água.

Telégrafo de Morse. (Fonte: DIY Homeschooler/Reprodução)Telégrafo de Morse. (Fonte: DIY Homeschooler/Reprodução)

Isso, no entanto, não impediu que a rede crescesse e se espalhasse por toda a França, chegando a ter cerca de 500 estações por mais de 3 mil quilômetros, conectando as principais cidades. A tecnologia foi tão bem-sucedida que outros países a adotaram, incluindo a Suécia, os Estados Unidos, o Canadá e o Reino Unido, cada um adaptando o conceito para melhorar a velocidade de comunicação.

Nem mesmo o advento do telégrafo elétrico de Samuel Morse, no início dos anos 1800, impediu que as redes de semáforos continuassem a operar pela Europa. Em 1834, os irmãos e banqueiros François e Joseph Blanc se aproveitaram disso para conseguir inventar um plano para invadir o sistema governamental. Vale ressaltar que o telégrafo era usado apenas para comunicação militar e administrativa, monitoramento das estradas e do transporte, e comunicação diplomática.

O plano

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Os dois banqueiros moravam em Bordeaux, a famosa cidade portuária às margens do rio Garonne, no sudoeste da França, onde havia um sistema autônomo de negociação de títulos da Bolsa de Valores de Paris. 

Naquele tempo, Paris era responsável por estabelecer o ritmo de negociação em mercados de ações em outras cidades, como Bordeaux, que estavam sempre atrasados por alguns dias porque as informações sobre as mudanças no mercado levavam dias para chegar, deixando-os sempre em desvantagem.

Para tentar contornar os problemas, alguns homens chegaram a usar pombos-correio, mas eles se perdiam com frequência. Foi diante desse impasse que os Blanc tiveram uma ideia: e se usassem a rede de telégrafo?

Eles subornaram um operador de telégrafo na cidade de Tours, a quem as notícias sobre o mercado de ações eram entregues por um cúmplice em Paris. Sempre que havia uma oscilação de valores, esse cúmplice enviava um pacote para a esposa do operador do telégrafo. Se os preços estivessem caindo, o pacote continha meias, se estivessem subindo, continha várias luvas.

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Nada disso levantava suspeitas porque a mulher era dona de um armarinho. Ela recebia o pacote, dava ao seu marido, que preparava o código correspondente a um funcionário envolvido no esquema e que era responsável por transmitir a mensagem criptografada pelo telégrafo até Bordeaux. Uma vez lá, ela seria lida e repassada aos Blanc por Pierre Renaud, ex-diretor do telégrafo de Lyon. Essa trama adiantou em até dois dias as informações, tempo o suficiente para que os irmãos criassem estratégias de negócio mais lucrativas e disparassem no mercado.

Para não serem descobertos pelas autoridades, os códigos foram feitos para parecerem erros ao acompanharem uma espécie de tecla "backspace". Ou seja, isso significa que o receptor, que não estava no esquema, deveria ignorar o caractere imediatamente anterior ao "backspace" e transmitir a informação privilegiada direta até o final da linha, onde Renaud estava pronto para ler e interpretar.

A mudança

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Por dois anos, os irmãos Blanc prosperaram no mercado de ações com seu esquema, até que o operador do telégrafo em Tours adoeceu e decidiu repassar o esquema para um amigo que assumiu seu lugar. Apesar de considerá-lo de sua confiança, o homem não pensou duas vezes antes de denunciar a quadrilha às autoridades.

Os banqueiros não foram condenados porque não havia punição prevista em lei para a manipulação de transmissão de dados naquela época, mas isso mudou após o episódio. O governo francês instituiu a lei que determinava que os meios de comunicação não deveriam ser usados para fins privados sem o consentimento do Estado.

“O caso dos irmãos Blanc é um lembrete de que, com qualquer nova invenção, as pessoas sempre encontrarão uma maneira de fazer uso malicioso dela”, escreveu Tom Standage à revista The Economist. “Este é um aspecto atemporal da natureza humana e não algo que a tecnologia possa ou deva consertar”.

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