Artes/cultura
04/09/2022 às 05:00•3 min de leitura
Anne Frank já dizia que o papel tem mais paciência do que as pessoas, por isso escreveu seu diário enquanto vítima do Holocausto orquestrado por Adolf Hitler. Por acreditar que o diário teria mais paciência para ouvir toda sua situação, além de que, em um momento como aquele, era o único em quem poderia confiar de verdade.
Escrever foi uma das maneiras que a manteve viva – até quando pôde –, bem como a pintura e o hábito de escrever romances e poemas também foi para Petr Ginz. Nascido em Praga, na República Tcheca, em 1º de fevereiro de 1928, a paixão pelas artes despertou muito cedo no garoto, estimulado pela irmã Chava, que o presentou com 6 cadernos para que usasse em suas atividades.
Tudo o que ele tocou e transformou, virou história, até mesmo quando as tropas da SS o alcançaram na década de 1940.
(Fonte: FDB/Reprodução)
Aos 14 anos, Ginz começou a retratar em seus diários os anseios banais de qualquer adolescente, como reflexões sobre o que a sociedade espera de uma pessoa em sua idade, como as coisas andavam na escola, sua relação com a família, amigos, vizinhos, etc.
Tudo foi absolutamente normal, como para Anne Frank, até que o nazismo se manifestou pelas ruas de Praga, e um alvo foi colocado em suas costas devido às vestes judias que usava. Então, de repente, as situações engraçadas durante a hora do recreio na escola e coisas aleatórias e felizes ditas pelos seus pais no jantar, foram substituídas por relatos obscuros sobre parentes, vizinhos e amigos que simplesmente começaram a desaparecer.
Portas escancaradas, casas reviradas e até incendiadas. Depois surgiram as proibições oficiais, anunciadas por toda a parte, impedindo que "pessoas como ele" frequentassem estabelecimentos públicos, usassem o transporte, possuíssem instrumentos musicais, câmeras fotográficas e até um simples termômetro.
(Fonte: Iowa Magaizine/Reprodução)
Até que a miséria e ostracismo alcançaram Ginz e sua família, espalhando fome e desespero pela região onde morava. Apesar de toda a confusão em seus pensamentos, não demorou muito para que entendesse o que estava acontecendo: eles estavam sendo caçados.
Quando menos esperava, Ginz amanheceu com um de seus vizinhos, ao ter a casa invadida e ouvir de oficiais que todos seriam deportados para o campo de concentração Theresienstadt, na cidade-fortaleza de Terezín.
Ilan Ramon. (Fonte: Pinterest/Reprodução)
Uma vez naquele campo, começou o início do fim da jornada do jovem Ginz. Em seu tempo de confinamento, ele conseguiu escrever uma revista chamada Verdem (algo como "nós lideramos" ou "nós venceremos"), exemplificando um pouco da dor e vontade de libertação.
Aos 16 anos, Petr Ginz foi deportado para Auschwitz-Birkenau, onde foi executado em uma câmara de gás em 28 de setembro de 1944. Por 53 anos, sua história ficou esquecida, até que em meados de 1997, Ilan Ramon, então coronel da Força Aérea Israelense, escolheu um desenho feito por Ginz para levar ao espaço.
Ramon integrou a equipe da NASA que participou da primeira missão espacial a bordo do ônibus espacial Columbia, construído pelos Estados Unidos. O astronauta foi convidado a levar um símbolo que representasse sua trajetória judaica, portanto, ele escolheu o desenho intitulado 'Terra, vista da Lua', feito por Ginz aos 14 anos, retirado do Yad Vashem – o memorial israelense dedicado às vítimas do Holocausto.
(Fonte: Israel Science and Technology Directory/Reprodução)
Infelizmente, em 1º de fevereiro de 2003, no aniversário de Ginz, o ônibus espacial explodiu ao reentrar na atmosfera da Terra, após 16 dias em missão. O rosto de Ramon foi parar em todas as páginas de jornais ao lado do expressivo desenho feito por Ginz – de procedência ainda anônima na época. A repercussão despertou a atenção de uma pessoa na cidade de Praga, que reconheceu os traços do garoto e contatou o Yad Vashem.
Essa pessoa revelou que estava em posse de 6 cadernos, repletos de memórias e desenhos com traços idênticos, encontrados em uma casa antiga. A pintora Chava Pressburger foi a responsável por analisar os cadernos quando foram apresentados ao museu, omprovando que autoria era de Petr Ginz, seu irmão.
Com a quantidade de informações que os cadernos carregavam, o menino artista cuja vida foi ceifada por Hitler entrou para a história tendo seus relatos cotidianos publicados no livro The Diary of Petr Ginz: 1941-1942.