Ciência
11/05/2024 às 15:00•3 min de leituraAtualizado em 11/05/2024 às 15:00
No século XX, uma famosa intervenção cirúrgica em áreas específicas do cérebro foi muito usada como tratamento de problemas relacionados à saúde mental. Na lobotomia, conexões cerebrais eram cortadas para oferecer uma vida melhor aos pacientes. Seu surgimento, na década de 1940, marca um período em que não havia tratamentos eficazes para pacientes com doenças mentais graves.
Por essa razão, o neurologista português Egas Moniz desenvolveu o método, aplicado desde pacientes com esquizofrenia, depressão grave ou até para controle de agressividade. Para uma minoria que apresentou melhorias, outra parcela perdeu a capacidade de comunicação, outros a coordenação motora, enquanto alguns entraram em estado vegetativo.
Guerras são episódios terríveis que deixam sequelas eternas em seus combatentes. Após o fim da Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos, na tentativa de contornar os problemas de saúde mental de seus soldados, lobotomizou aproximadamente 2 mil veteranos com diagnósticos de esquizofrenia, depressão e psicose.
O exército norte-americano estava com dificuldade para lidar com eles e tinha poucas opções de tratamento. A lobotomia, então, foi vista como última medida para controlar o comportamento violento desses soldados.
Muitos acabaram gravemente incapacitados, tendo seu intelecto e funções cognitivas reduzidas. Outros morreram logo após o procedimento, o que levou o exército a ser duramente questionado.
Em meados do século XX, a lobotomia foi utilizada como técnica para "curar" pessoas da homossexualidade. Ainda que a extensão de seu uso para tal finalidade seja desconhecida por falta de documentação, há evidências de que o doutor Walter Freeman, principal médico praticante da lobotomia nos Estados Unidos, tenha realizado o procedimento em vários homens gays — cerca de 40% de seus pacientes.
Na época, a homossexualidade era considerada uma doença mental, ao que psiquiatras e médicos acreditavam poder "curar" utilizando a lobotomia e outros procedimentos invasivos. Pacientes considerados "desviantes" em função de sua orientação sexual eram frequentemente lobotomizados.
Os números mudam a cada país e hospital, mas as estimativas sempre mostram que mulheres sofreram mais lobotomias do que homens. Nos anos iniciais de execução do procedimento, 5 em cada 6 pacientes do doutor Freeman eram mulheres.
Nos Estados Unidos, 75% das lobotomias durante a década de 1940 foram realizadas em mulheres, número que ficou em 60% na década seguinte, ainda que os homens fossem o maior número entre os pacientes psiquiátricos.
A disparidade de gênero foi motivada, principalmente, pelas normas e expectativas sociais acerca do comportamento feminino na época. O que era considerado como não "normal" tornava as mulheres como candidatas adequadas para a lobotomia.
A família Kennedy é frequentemente apontada como uma espécie de realeza norte-americana e, como toda família real, ela guarda seus próprios segredos. Um deles foi Rosemary Kennedy, a irmã mais velha do ex-presidente JFK. Quando tinha 23 anos, Rosemary foi submetida a um procedimento de lobotomia a mando de seu pai.
Ela havia tido uma infância com desenvolvimento mais lento do que seus irmãos, mas conseguia participar da convivência familiar. Porém, na década de 1940, após retornar de Londres, seu comportamento passou a mudar. Considerada irritadiça, passou por uma lobotomia de modo a evitar suas mudanças de humor, por vezes violenta.
Incapacitada, passou a não conseguir cuidar de si mesma, sendo enviada para um colégio para crianças excepcionais no Wisconsin, onde viveu o resto da vida sendo cuidada por freiras. Sua lobotomia foi um segredo até 1987, quando os detalhes de seu procedimento se tornaram públicos.
Entre as inúmeras atrocidades cometidas pelo doutor Walter Freeman, uma bem absurda levou à morte de um paciente. Em 1951, enquanto realizava uma lobotomia em um paciente do Cherokee State Hospital, Freeman interrompeu a cirurgia para tirar uma fotografia.
Para conseguir bater a foto, precisou soltar o instrumento cirúrgico que estava utilizando, que acidentalmente afundou no cérebro do paciente, resultando em sua morte. Nem mesmo isso impediu que ele seguisse realizando operações por mais 16 anos.