Saúde/bem-estar
14/02/2023 às 08:00•4 min de leitura
Em visita ao município de Afuá, localizado a 320km de Belém e a 85km de Macapá, o wakeboarder Pedro Caldas (22), primeiro brasileiro a conquistar o título mundial júnior de Cable Wakeboard, realizou um feito surpreendente na região. Desafiando todas as condições geográficas do distrito paraense, o atleta executou o Double Frontial — duas cambalhotas para frente — no estilo winch de forma inédita e marcou a história da "Amsterdã brasileira" em um projeto que reflete a essência do país.
O projeto "Pedro Caldas: De férias com Wake" teve a duração de alguns dias e levou o wakeboarder para conhecer uma região mística de cerca de 35 mil habitantes. Afuá consiste em um distrito construído sobre palafitas e não tem suporte ao trânsito de veículos motorizados, devido às condições de várzea alagada e aos riscos de enchentes em certas épocas do ano. Assim, toda a movimentação na cidade de aproximadamente 8.373 km² de extensão é feita a pé ou via bicicleta.
(Fonte: Red Bull/Reprodução)
Além disso, o local tem a árvore "Muralha", com quase 60m de altura, como grande atração turística. Ela possui raízes que se estendem pela terra e exibem mais de três metros de altura. Segundo os moradores da "Veneza Marajoara", como ficou popularmente conhecida, esses segmentos funcionam como uma forma de "conexão" com a floresta — um telefone sem fio, digamos assim —, pois quando os nativos emitem sons por meio de batidas nas árvores, é possível detectá-los a quilômetros de distância.
Em relação à manobra de Pedro Caldas, o Double Frontial já havia sido realizado na modalidade Cable Park, mas nunca na winch. Essa categoria consiste em uma experiência que utiliza um guincho, coordenado por um motor, para puxar o atleta. Porém, como não havia garantias sobre a situação hídrica de Afuá e a firmeza dos equipamentos em solo, o feito radical se tornou ainda mais desafiador e, para muitos, impossível.
(Fonte: Red Bull/Reprodução)
Para trazer mais detalhes sobre o projeto, a equipe do Mega Curioso teve a oportunidade de entrevistar Pedro Caldas e trazer informações sobre sua visão. Ele detalhou os desafios do projeto, os aspectos curiosos de Afuá e a importância em ter concluído uma etapa tão marcante para si e para o próprio distrito. Confira abaixo:
Mega Curioso: "Como a ideia de realizar uma manobra arriscada, em um local geograficamente desafiador, foi idealizada?"
Pedro Caldas: "Eu falei 'tenho que fazer algo inédito para realmente fazer valer essa aventura.' Então, assim, o sistema que a gente usa para fazê-la meio que abriu muitas portas para vários lugares que íamos antes e não podíamos praticar o esporte. Então, só a ideia de ir até lá já era uma coisa única, uma experiência única, e eu quis realizar uma manobra que tivesse o mesmo [impacto].
O mesmo para poder falar 'é a primeira vez que alguém faz isso no Amazonas'. Acho que veio daí [a ideia] e para mim é um grande desafio psicológico. Faço várias cambalhotas, giro para cá, vou para lá, mas ficar de ponta-cabeça duas vezes trava, sabe? Então foi um desafio que coloquei para mim e me fez pensar 'eu quero ser o primeiro'."
(Fonte: Red Bull/Reprodução)
MC: "Sua trajetória no wake é vencedora e, especialmente nesse momento com o feito inédito, ela está ainda mais em evidência. Você já enfrentou um desafio como esse em algum momento de sua carreira?"
PC: "É uma prova de bastante impacto, né? É necessário bastante força para aplicar e completar o giro. Também tem o impacto com a água, que é bem forte. É preciso treinar fora d'água, exercitar a mobilidade, realizar bastante alongamento... Eu treinei no que seria uma situação mais controlada, mais fácil de se completar... E mesmo assim ainda é uma manobra que raramente se vê. Mas eu tive a oportunidade de pegar uma confiança ali, aprender e chegar no dia para conseguir fazer perfeito."
MC: "Como você começou no winch?"
PC: "Ah, eu acho que é a evolução normal do atleta. Normalmente, essa modalidade é praticada por uma lancha ou um sistema de torres conectadas por cabos. Só que os lugares são feitos especificamente para a prática. Então chega uma hora que, não vou dizer que perde a graça, mas que o desafio já não é mais aquele. Por isso surgiu o do tipo guincho. Se você estica a corda e ela vai puxando, só há uma tentativa por vez.
Utilizar o que já está ali ou as construções que não foram feitas para isso é algo muito mais desafiador. Então conforme fui ficando mais confortável dentro dessa proposta, comecei a procurar outros lugares para estar dentro de um pico de adrenalina."
(Fonte: Red Bull/Reprodução)
MC: "Durante seu período de 35 dias na cidade, como ocorreu a interação com dinâmicas sociais tão únicas? Houve um processo de adaptação para além do esporte?"
PC: "A população de Afuá nos recebeu super bem. Todo mundo queria saber o que a gente estava fazendo, querendo ajudar, querendo estar de alguma forma envolvido. Era óbvio que a gente não era dalí, e a princípio você precisa entender o ritmo da cidade, porque eles têm os seus horários: tem hora que a cidade está vazia, todo mundo dentro de casa porque lá fora está um calor. Ou então todos saem de bicicleta e é necessário tomar cuidado com isso. Então, assim, você tem que entender como a cidade está funcionando.
É legal ver também a interação da cidade com a maré, com a água. Tem hora que a maré está alta, então você vê o pessoal tomando banho, se movimentando. Tem hora que a maré baixa faz barcos encalharem, então as pessoas vão mexer no casco, fazer coisas como essa. Isso influencia bastante na prática do esporte. Precisávamos conversar com todos, entender a hora de fazer funcionar e se conectar."
MC: "E qual foi sua parte preferida?"
PC: "Ah, eu diria o momento em que eu pulei a ponte. Muita gente parava e queria saber, tirar foto, queria tentar fazer o mesmo. Daí é como expliquei, toda vez que você puxa o cabo e precisa tentar de novo, é necessário se preparar novamente. E era legal porque eu errava e puxava de novo.
Então, para mim, isso foi o mais interessante. Claro, o board foi um desafio e eu estou orgulhoso de ter feito as manobras. A experiência vai ficar para sempre. Mas aquele momento, todo mundo, a animação, as crianças... Foi gostoso e acho que é algo que transcende o esporte, mais simbólico."
(Fonte: Red Bull/Reprodução)
MC: "O que você planeja para sua carreira agora? Qual é o próximo passo?"
PC: "Acho que deu só para testar as águas, vamos dizer assim. Esse projeto foi super maneiro, um baita de um sucesso e só deixou aquela sensação de 'quero mais'. Ainda quero encontrar outros lugares e tentar manobras mais difíceis. Não só fazer a manobra, mas fazer da minha forma, fazer da forma diferente, com a criatividade e minha expressão. Em situações de desconforto vou colocando meu toque, fazendo da minha forma e trazendo meu estilo.
Então, quero encontrar mais lugares como esse e ter essa liberdade. Quero continuar treinando, quero alguns títulos que ainda não consegui, mas estão na lista, e realizar algumas manobras, pois estou mais confiante para tentar."