Dona Vitória: a idosa que denunciou o tráfico e a milícia no RJ

25/03/2023 às 13:002 min de leitura

Em 23 de fevereiro de 2023, morreu Dona Vitória, aos 97 anos, alagoana e antiga moradora da Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro. Ela viveu 17 anos em anonimato sob o Programa de Proteção à Testemunha por contribuir civicamente para uma operação da Polícia Federal que resultou na prisão de 30 indivíduos, entre traficantes e policiais militares milicianos envolvidos com o tráfico de drogas.

Quando a notícia veio a público em uma matéria completa no Jornal Extra, Joana Zeferino da Paz ganhou o pseudônimo Dona Vitória para preservar sua integridade física.

(Fonte: Jornal Mural/ O Dia/Reprodução)(Fonte: Jornal Mural/ O Dia/Reprodução)

Sua história com a polícia, o tráfico e seu esconderijo permanente até seus últimos dias de vida, começou em 2005, quando ela entrou com uma ação contra o Estado devido à desvalorização do seu imóvel em decorrência da ação do tráfico de drogas na região onde morava.

A janela indiscreta

Naquela época, Dona Vitória morava em um pequeno apartamento na praça Vereador Rocha Leão, que dava para os fundos da Ladeira dos Tabajaras, onde a ação dos criminosos acontecia mais "longe" das vistas das autoridades do que das pessoas. Para justificar sua alegação – após ser confrontada por um policial militar, que garantiu que ela mentia sobre o ponto de drogas existir – a idosa, então com 80 anos, passou a filmar a ação dos criminosos e milicianos.

(Fonte: Jornal Extra/Reprodução)(Fonte: Jornal Extra/Reprodução)

As imagens nítidas registradas por Dona Vitória mostravam homens armados vendendo drogas à luz do dia, bem como policiais militares recebendo propina ou pegando e entregando pacotes de drogas para os traficantes. Também foram captadas cenas de violência envolvendo menores de idade.

A moradora encaminhou essas imagens à Polícia Civil, que construiu um caso repleto de conexões e desdobramentos maiores do que esperavam, digno de um escândalo em escala nacional. 

Quando a matéria do repórter Fábio Gusmão foi ao ar, após um ano e meio de investigação até a publicação, o material causou choque na sociedade brasileira ao trazer toda a sordidez do caso a público. Como consequência das imagens cedidas por Dona Vitória, além dos traficantes, foram condenados policiais militares que se omitiram por conta do recebimento de propina e os que acobertaram os milicianos. Ao todo, 30 pessoas foram presas.

Dona Vitória. (Fonte: Fábio Guimarães/O Globo/Reprodução)Dona Vitória. (Fonte: Fábio Guimarães/O Globo/Reprodução)

Gusmão revelou que Joana gostaria de ter tido reconhecimento público ao levar a denúncia às autoridades, porém foi impedida pela polícia, não só para preservar sua integridade física, como também a de todos seus familiares. 

Quando as imagens foram divulgadas, Dona Vitória já havia se mudado do apartamento de onde era facilmente possível determinar de quem era a janela que captou as imagens, gravadas por dois anos do mesmo jeito e do mesmo ângulo.

Tanto Gusmão como a jornalista Ana Carolina Raiumundi só fizeram a vontade de Joana depois que ela faleceu, revelando não apenas como foram seus últimos anos de vida, como os bastidores de toda a matéria publicada no Jornal Extra.

A história de Dona Vitória será eternizada em um filme protagonizado por Fernanda Montenegro, produzido pela Conspiração e disponibilizado na plataforma de streaming Globoplay.

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