Artes/cultura
10/04/2023 às 12:00•2 min de leitura
Um novo estudo compartilhado pela Georgia State University, dos Estados Unidos, pesquisa o impacto dos podcasts de crimes reais na condução de julgamentos. Segundo o projeto, eles podem estar alterando a forma como os jurados determinam suas decisões, levando os bastidores do jornalismo investigativo ao público e influenciando suas percepções sobre culpabilidade ou inocência.
Publicado no New Mexico Law Review, o estudo se aprofunda em um fenômeno conhecido como “Efeito Serial”, introduzido pela primeira vez no podcast Serial, durante o julgamento do assassinato de Adnan Syed. O caso, que relatou a história de um homem que cumpriu mais de 20 anos de prisão por um crime que foi posteriormente anulado pela Justiça americana, chegou a ser escutado por mais de 40 milhões de ouvintes e se tornou uma referência em análise jurídica.
Segundo Kat Albrecht, professora assistente de criminologia na Andrew Young School of Policy Studies e coautora do projeto, o “Efeito Serial” pegou carona em outro conceito importante: o "Efeito CSI". Inspirada em programas de entretenimento como CSI: Crime Scene Investigation e Law & Order, a ideia sugere que esses shows têm impacto quantificável nos júris, podendo levar os jurados a manter expectativas irrealistas de evidências forenses e a alterar suas decisões de acordo com os métodos investigativos.
“Ouvimos falar sobre o Efeito CSI”, explica Albrecht. “Mas o que significa quando você adiciona essa camada da mídia dizendo que é verdade? Você pode esperar que, se o Efeito CSI mudar a forma como as pessoas tomam decisões, o Efeito Serial pode ter um impacto maior do que algo que está dizendo a você que é ficção.”
(Fonte: Getty Images / Reprodução)
A pesquisa levou em conta tendências e dados sobre os podcasts Serial e In the Dark para analisar como elas estariam sendo vistas sob a ótica de resoluções legais. Basicamente, a natureza da transmissão afeta de forma diferente a percepção das pessoas sobre o andamento de crimes reais e suas motivações sociológicas. Isso quer dizer, por exemplo, que podcasts têm mais impacto que documentários, vídeos em redes de streaming ou arquivos de texto espalhados pela web.
Adnan Syed, por exemplo, viu o andamento de sua condenação no sistema jurídico norte-americano ser alterada após o lançamento de um dossiê no podcast Serial. Enquanto isso, os materiais apresentados em In the Dark, concentrados no caso Curtis Flowers, resultou na desistência do promotor distrital m dar continuidade às acusações de assassinato, após repetidos problemas relacionados à discriminação racial.
Segundo Albrecht, a transmissão de informações sobre "crimes reais" em larga escala atrai significativamente o povo norte-americano, com impactos em mais de 13% da população, que os consideram seu gênero favorito de podcasts. Esse alcance deixaria as "linhas da verdade" ainda mais confusas, fazendo com que as pessoas não se importem mais se os fatos relatados são conhecimento factual ou apenas entretenimento.
“Algumas dessas coisas que você pode ouvir em um podcast, você não ouvirá no tribunal, como especulação ou se o réu é uma boa pessoa. Essas coisas não são materialmente relevantes para as questões probatórias sobre um caso”, diz Albrecht. “Mas é realmente relevante no mundo do podcast, para tornar a história significativa. Então, é interessante até que ponto isso importa na percepção pública do que é a justiça criminal, versus como isso acaba realmente resolvido em um julgamento.”
(Fonte: Getty Images / Reprodução)
Um caso recente, ocorrido no condado de Maricopa, Arizona, trouxe relatos mais profundos sobre os impactos do Efeito CSI em tribunais. Os promotores acreditaram que ele estava alterando a percepção de realidade dos jurados, tornando as evidências forenses menos importantes e direcionando a acusação para um caminho que não seria o esperado.
“Há coisas boas sobre as pessoas entenderem os procedimentos judiciais ou a injustiça no sistema judiciário”, conclui Albrecht. “Mas também devemos ser cautelosos de que estamos vendo apenas as partes mais interessantes do sistema de justiça. A maioria das aparições no tribunal não é o julgamento do século”.