Artes/cultura
09/07/2020 às 14:00•4 min de leitura
Em 3 de janeiro de 1950, Vesna Vulovic nasceu em Belgrado, capital da Sérvia (antiga Iugoslávia). Filha de um empresário e uma instrutora fitness, ela começou cedo a sua vida nos ares. A fim de melhorar as suas habilidades em inglês e motivada pela paixão que nutria pelos Beatles, ela se mudou para o Reino Unido assim que concluiu o 1º ano de faculdade.
A princípio, a jovem passou um tempo com os amigos dos pais em Newbury, porém quis se mudar para Londres o mais rápido possível. Uma vez que conseguiu, fez amizade com um homem, o qual sugeriu que ambos fossem para Estocolmo. “Assim que eu contei aos meus pais que estava morando na capital sueca, eles me obrigaram a voltar para Belgrado”, revelou Vulovic em entrevista.
(Fonte: Japanese Class/Reprodução)
Depois de aterrissar na terra natal, Vulovic se viu sem rumo e desempregada. Naquela época, não era uma tarefa fácil passar tanto tempo fora do país, pois a sociedade socialista censurava com veemência essa atitude. Em adição a isso, o temperamento forte de Vulovic também não facilitava a interação dela com outros durante as entrevistas de emprego.
Apesar disso tudo, a jovem não ficou muito tempo sem trabalho. A sua atenção foi despertada quando se encontrou com uma de suas amigas que estava vestida em um belo uniforme de comissária de bordo da JAT Airways, a maior companhia aérea iugoslava. Durante uma conversa com ela, Vulovic percebeu que trabalhando naquele ramo poderia conhecer vários países e ainda ter um ótimo salário. Ela se convenceu de que esse era o caminho que deveria seguir.
No entanto, após todo o treinamento e estudo que a profissão exigia, Vulovic por pouco não perdeu o único sonho que tinha em mente. Com um extenso histórico de pressão baixa, ela sabia que era improvável que passasse pelo exame médico da companhia. Então, visando enganar a todos e ao próprio organismo, ela ingeriu uma quantidade excessiva de café na esperança de que isso mantivesse a sua pressão arterial alta o suficiente.
Em meados de 1971, aos 21 anos, Vesna Vulovic se tornou oficialmente uma comissária de bordo contratada pela JAT Airways. Em 1 ano de trabalho duro, tudo correu absolutamente bem.
(Fonte: Boing Boing/Reprodução)
Em 25 de janeiro de 1972, Vulovic desembarcou em solo dinamarquês com a tripulação do voo 367 da JAT. Semanas antes disso, ocorreu o que a jovem mais gostava: erro de escalação. Ela não estava programada para trabalhar no 367, porém a companhia a confundiu com outra comissária de bordo que também tinha o nome "Vesna'. Foi muito oportuno, pois era a primeira vez que ela viajava para aquele país.
Ela visitou os pontos turísticos e fez compras com seus amigos de trabalho. “Eles insistiram tanto para que eu fosse. Era como se sentissem que morreriam em breve. Nem por um momento eles deixaram de falar com saudosismo da própria família”, lembrou Vulovic mais tarde. A mulher também notou que o capitão ficou trancado em seu quarto de hotel por 1 dia inteiro, recusando-se a sair para comer ou visitar a cidade. Durante o café da manhã, o copiloto apenas chorava enquanto falava sobre seus filhos.
Em 26 de janeiro de 1972, Vesna Vulovic e a tripulação entrou na aeronave, um McDonnell Douglas DC-9, para preparar o voo 367 com destino a Belgrado. Após o embarque dos passageiros, o avião decolou às 15h15 do horário de Copenhague.
(Fonte: HowStuffWorks/Reprodução)
Cruzando uma cadeia montanhosa da antiga Tchecoslováquia, após cerca de 46 minutos no ar e a aproximadamente 10 mil metros de altura, houve uma explosão mortal no compartimento de bagagem. O DC-9 foi dilacerado em pleno voo com 28 pessoas a bordo, entre passageiros e tripulantes.
De acordo com relatórios de peritos, Vesna Vulovic foi lançada para o fundo da aeronave pelo carrinho de comida que transportava e ficou presa sob ele. A cauda do avião onde a jovem estava foi encontrada em uma floresta. Para os investigadores, a copa frondosa das árvores muito altas e a quantidade de neve no chão amorteceram o impacto. Vulovic foi a única sobrevivente.
(Fonte: Scribol/Reprodução)
O aldeão chamado Bruno Honke alegou que encontrou a jovem depois de escutar os seus gritos de socorro. Tendo prestado serviço médico na Primeira Guerra Mundial, ele foi o responsável por manter Vulovic viva até a chegada dos socorristas. No entanto, já no hospital, ela alegou aos jornalistas que só se lembrava de cumprimentar os passageiros durante o embarque.
Vulovic fraturou o crânio, as pernas, a pélvis, várias costelas e 2 vértebras. Após 10 dias em coma, ela ficou temporariamente paraplégica. Ironicamente, os médicos constataram que seu quadro de pressão baixa impediu que o seu coração explodisse quando o avião foi despressurizado durante a explosão.
Inicialmente, as autoridades iugoslavas concluíram que o acontecimento foi um ato terrorista cometido por nacionalistas croatas – que já tinham realizado mais de 120 ataques no país contra civis e militares. Entretanto, não encontraram a caixa-preta do avião ou qualquer outra prova.
(Fonte: The New York Times/Reprodução)
No dia da tragédia, o gerente da estação do aeroporto de Copenhague viu quando um homem muito irritado desembarcou do voo 367. Segundo ele, o homem deve ter despachado a mala em Estocolmo, descido em Copenhague e seguido caminho depois de ter plantado a bomba no compartimento de bagagens.
Em 2009, os investigadores Peter Hornung e Pavel Theiner, depois de vasculharem os documentos de aviação civil da antiga Iugoslávia, chegaram a uma conclusão diferente: a Força Aérea Tcheca teria abatido o DC-9 após confundi-lo com uma aeronave inimiga. Sendo assim, a versão apresentada da explosão não passava de uma conspiração da polícia para encobrir o erro dos militares.
Por um bom tempo, Vesna Vulovic trabalhou na JAT Airways, só que no balcão de check-in. Em 1985, a sua notória fama lhe rendeu o registro de “única sobrevivente a maior queda livre sem paraquedas” pelo Guinness World Records. Mais tarde, ela se tornou ativista política e lutou contra o nacionalismo durante 20 anos.
Em 23 de dezembro de 2016, aos 66 anos, Vesna Vulovic foi encontrada morta em sua casa, em Belgrado. Ninguém sabe a causa de sua morte.