Bransby Cooper: o primeiro caso documentado de negligência médica

03/06/2023 às 11:003 min de leitura

Nos Estados Unidos, a terceira principal causa de morte é negligência médica. Em 2016, o estudo liderado por Martin Makary, professor de cirurgia da Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins, perturbou a comunidade norte-americana – e viralizou nos meios de comunicação do mundo – ao mostrar que 251 mil vidas são ceifadas a cada ano devido a erro médico, sendo que 9,5% acontecem somente nos EUA. O número é maior do que as mortes causadas por AVC, acidentes ou Alzheimer.

Não é de hoje que o volume de mortes por erro médico, apelidado de "epidemia médica americana" pela mídia, choca a comunidade de saúde. Em 1999, um estudo semelhante ao de Johns Hopkins, realizado pelo Instituto de Medicina e chamado "Relatório Errar é Humano", concluiu que até 98 mil mortes por ano ocorriam devido à negligência.

(Fonte: Getty Images)(Fonte: Getty Images)

No Brasil, os dados são ainda mais alarmantes. Um levantamento do Instituo de Estudo de Saúde Suplementar da Universidade Federal de Minas Gerais, em 2021, mostrou que dos 19,4 milhões de pessoas tratadas em hospitais pelo Brasil, 1,3 milhão sofrem por negligência ou imprudência durante o tratamento. São quase 55 mil mortes anualmente por isso, o equivalente a seis por hora.

Se erros médicos se tornaram comum por aqui, imagine na Londres de 1828, onde surgiu o primeiro caso de negligência médica da história pelas mãos de Bransby Cooper.

O incompetente

Bransby Cooper. (Fonte: Wikimedia Commons)Bransby Cooper. (Fonte: Wikimedia Commons)

Na Londres de 1828, Bransby Cooper era o sobrinho do renomado Sir Astley Cooper, o que o fez ganhar um cargo no famoso Guy's Hospital. O resultado? Tragédia.

Em março daquele mesmo ano, a The Lancet publicou um relatório hospitalar escrito pelo repórter e cirurgião Thomas Wakley, intitulado "A operação de litotomia do Sr. Cooper durou quase uma hora". Litotomia se tratava de um antigo procedimento médico que consistia na extração, sem anestesia, de cálculos no trato urinário, e durava trinta minutos para ser feita. 

O paciente, ou melhor, vítima, foi Stephen Pollard, um homem saudável de 53 anos e pai de cinco filhos.

Wikimedia CommonsSir Astley Cooper. (Fonte: Wikimedia Commons)

Durante o procedimento, Cooper não só não sabia o que fazer, como também, apavorado, perdeu vários instrumentos enquanto dava ordens desesperadas aos seus assistentes. O médico chegou a tentar resgatar os cálculos de Pollard utilizando os próprios dedos porque achou que seria "mais fácil". No entanto, ele só teve êxito após muito cutucar seu paciente com um fórceps. A essa altura, Pollard já estava esgotado, e acabou morrendo de uma infecção dois dias depois.

Foi o artigo de Wakley que impulsionou o caso, ao lançar acusações formais sobre as falsas habilidades cirúrgicas de Cooper, ao hospital e também ao tio do homem, cujo prestígio o garantiu aquele posto. Em sua defesa, Cooper decidiu processar Wakley.

O privilégio de Cooper

(Fonte: Getty Images)(Fonte: Getty Images)

O caso foi parar no Court of the Queen’s Bench, nas mãos do juiz Lord Tenterden, em dezembro de 1828. Cooper foi representado por James Scarlett e Mr. F Pollock, enquanto Wakley se defendeu sozinho. Sua defesa foi exemplificar, trazendo um conjunto de objetos que incluíam o modelo de uma criança na posição de litotomia, para ilustrar como o procedimento deveria ter acontecido.

O réu conduziu sua defesa com grande habilidade, destacando que não apenas os hospitais deveriam garantir que padrões de segurança nas operações fossem estabelecidos, como cumpridos. A clareza de Wakley e conhecimento construíram uma defesa difícil de ser abalada, mesmo sob o interrogatório e argumentação agressiva de Scarlett.

Boa parte da defesa de Cooper foi baseada, de forma imprudente, na recomendação de seu tio, portanto, deveria ser considerada sua total aptidão para um alto cargo. Scartett tentou a todo o momento desacreditar Wakley, mesmo diante do Sr. Calloway, um dos assistentes de Cooper durante a operação, que confirmou precisamente seus erros fatais.

Após uma longa deliberação, o júri decidiu a favor de Wakley, dando início a um novo capítulo na história médica. Engana-se quem imagina que esse foi o fim da carreira de Cooper, que não só não foi nem multado ou punido, como manteve sua posição no hospital, onde chegou a dar palestras médicas.

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