Artes/cultura
15/09/2020 às 04:43•2 min de leitura
Em julho de 2019, 3 astrofísicos publicaram o artigo Embedding Climate Change Engagement in Astronomy Education and Research ("Incorporando o envolvimento com as mudanças climáticas na educação e pesquisa em astronomia"), ecoando as preocupações da comunidade científica sobre o impacto das mudanças climáticas em seu campo de pesquisa. E ele já se mostrou extenso.
Três estudos, elaborados a partir da sessão especial Astronomy for Future da conferência virtual de 2020 da Sociedade Astronômica Europeia, publicados quase simultaneamente na revista Nature, mostram como a astronomia e a astrofísica estão sendo afetadas pela crise do clima e, ao mesmo tempo, contribuindo para que ela se agrave.
Em 2 dos 3 artigos publicados na Nature, os pesquisadores detalharam sua própria contribuição para o incremento da crise do clima. No Instituto Max Planck para Astronomia (MPIA), descobriu-se que apenas em 2018 os pesquisadores do instituto lançaram na atmosfera 18 toneladas de dióxido de carbono, apenas em atividades de investigação (quase o dobro das emissões médias por pessoa na Alemanha).
"Somos responsáveis pela emissão de poluentes, mesmo que a redução não seja uma questão de escolha pessoal. Por isso, precisamos analisar de onde elas se originam e, em seguida, descobrir como agir para que elas sejam reduzidas", disse em comunicado o astrônomo Knud Jahnke, coautor do estudo.
Nos estudos em que a comunidade científica faz seu mea-culpa, há uma lista de recomendações. Uma das mais evidentes é trocar conferências presenciais por encontros online (o que já está acontecendo, por conta da pandemia provocada pelo novo coronavírus), visto que a maior pegada de carbono do instituto é aquela deixada pelos voos transatlânticos de seus pesquisadores para conferências ou visitas a observatórios nas Américas.
O Mistral, supercomputador alemão que necessita de resfriamento contínuo, roda experimentos complexos com modelos numéricos do sistema climático.
Outra ideia é instalar os supercomputadores em locais como a Islândia – país com temperaturas baixas (o que reduz a necessidade de resfriamento) e com abundância de energia renovável.
Além da autocrítica, a comunidade de astrônomos também aponta como as mudanças no clima estão afetando negativamente a qualidade das observações, em uma relação inversamente proporcional – não faltam exemplos. Um dos artigos fala especificamente do Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ou ESO), o observatório astronômico de luz visível mais avançado do mundo.
Mesmo o Atacama sendo uma das áreas mais secas do planeta, a baixa umidade já indica que não deve permanecer assim por muito tempo por causa das mudanças no El Niño (um fenômeno que modifica significativamente a distribuição de calor na superfície da água do oceano Pacífico, levando a alterações no clima).
O sistema de resfriamento do VLT não consegue mais manter, à noite, a temperatura da cúpula abaixo dos 16 °C.
Além disso, a temperatura média do lugar está aumentando – 1,5 °C nos últimos 40 anos. O VLT é resfriado durante o dia para protegê-lo da degradação, mas é à noite que o problema maior surge. Quando o termômetro registra mais que 16 °C ao pôr do sol, no momento em que a cúpula é aberta, o sistema não consegue mais alcançar o resfriamento ideal. O resultado: observações sem nitidez.
"Como astrônomos e com uma perspectiva única do universo, é nossa responsabilidade divulgar as consequências desastrosas das mudanças climáticas causadas pelo homem em nosso planeta e em nossa sociedade”, disse a pesquisadora do MPIA Faustine Cantalloube, principal autora de um dos novos estudos.
Estudos apontam o papel da astronomia na crise global do clima via TecMundo