Estilo de vida
22/04/2022 às 13:00•3 min de leitura
Os chamados bunkers do fim do mundo foram impulsionados em dois momentos mais marcantes do século XX, a começar pela Era Atômica dos Estados Unidos, em 16 de julho de 1945, atingindo seu auge com a explosão das bombas Little Boy e Fat Man, seguido pelos 921 testes e explosões realizados pelo governo na Base de Testes de Nevada.
Todos os aspectos da vida americana foram afetados por esse período, especialmente com os ataques à Hiroshima e Nagasaki, que mostraram aos cidadãos o quão nocivo e perigoso era mexer com radiação, desestimulando uma indústria capitalista inteira que prosperava desde o início do século XX produzindo tudo que contivesse o material, visando facilitar ou trazer inovações para a vida cotidiana.
(Fonte: National Nuclear Security Administration/Nevada Site Office)
As tensões da Guerra Fria potencializaram esse sentimento de incerteza e destruição, portanto as pessoas começaram, por conta própria, a fabricar nos terrenos de suas casas bunkers improvisados para tentar se safar de um possível apocalipse nuclear. Seguindo essa rota, empresas compraram a ideia, passando a construir e vender silos em áreas desérticas como uma maneira de lucrar com o "fim do mundo iminente".
A partir de 1960, ainda que em meio a tantas incertezas do período atômico, os fenômenos ufológicos tomaram conta do mercado que estimulava os bunkers do fim do mundo, isso porque o país entrou na Era dos Discos Voadores, potencializando a ideia, agora não mais de um fim do mundo nuclear, mas de colonização por parte de criaturas extraterrestres.
(Fonte: Survival Condo Project)
Afetados pelas perspectivas, pesquisadores da Universidade da Geórgia trancaram grupos de homens, mulheres e crianças, com idades entre 3 e 70 anos, em bunkers por seis vezes entre 1962 e 1964, durante períodos variados, para analisar os impactos de subsistência com biscoitos de trigo e água em um ambiente considerado opressor, sem água de banho, beliches ou cobertores.
O estudo chegou à conclusão, após sua última etapa de testes, de que "nenhum efeito psicológico ou social deletério ocorre a partir de períodos de duas semanas de confinamento em grupo sob condições severas".
(Fonte: Bradley Garrett/Reprodução)
Por outro lado, um relatório publicado pela US National Science Foundation, em 1960, apontou que o tempo prolongado no subsolo pode envolver muitas privações fisiológicas, incluindo dificuldades de concentração, irritabilidade, depressão e distúrbios de personalidade. Ou seja, as pessoas até poderiam sobreviver, mas não prosperar, o que seria uma questão de tempo para que o sentimento de inquietação e outros aspectos raivosos tomassem conta do grupo, trazendo caos para o ambiente.
Mas, no final das contas, nada disso importava para as pessoas que buscavam esses locais seguros, pois qualquer realidade era melhor que ser desintegrado por uma bomba, sofrer com os índices de radiação, ser dizimado ou viver à mercê de uma vida alienígena denominada implacável.
(Fonte: Terravivos/Reprodução)
Foi assim que lugares como a Vivos, uma comunidade global de bunkers apocalípticos, surgiu em 1980, através da mente do CEO Robert Vicino. A instalação militar na base de Black Hills, no condado de Fall River (Dakota do Sul, EUA), é uma espécie de rancho, com 160 quilômetros de estradas particulares.
Localizados também em Indiana, esses bunkers da Vivos são destinados às famílias de classe média, custando cerca de US$ 35 mil cada, mas podendo ultrapassar US$ 2 milhões em silos extremamente luxuosos para guardar os milionários do mundo. A empresa de Vicino também possui um grande negócio na Europa, onde é comercializado como "a solução definitiva de seguro de vida para famílias de alta renda".
A pandemia da covid-19, não só foi responsável por paralisar o mercado imobiliário, como aumentar a demanda por bunkers do fim do mundo, evocando uma terceira onda na história desses locais de refúgio. “As pessoas achavam que éramos loucos porque nunca acreditaram que algo assim pudesse acontecer. Agora eles estão vendo”, disse Vicino, em entrevista ao The Verge.
(Fonte: Terravivos/Reprodução)
Com isso, empresas de produção de bunkers, como a Rising S Company e a Survival Condo, fizeram updates em suas instalações durante a pandemia para poderem capitalizar ainda mais com os medos propagados pela contaminação do vírus. Muitas delas divulgaram que possuem sistemas de alta tecnologia na filtragem de partículas do coronavírus, bem como depuradores de ar para eliminar todos os patógenos antes de entrar no espaço subterrâneo.
A quarta onda nos mercados dos bunkers do fim do mundo veio mais rápido do que os empresários imaginaram, com a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, sob o fantasma da possibilidade de um ataque nuclear, despertando o mesmo sentimento de 77 anos atrás, quando tudo começou.
Em matéria ao The Guardian, Gary Lynch, CEO da Rising S Company no Texas, disse que normalmente atendia 100 consultas por mês sobre interessados em adquirir um bunker apocalíptico, mas em fevereiro, os números dispararam para 3 mil. Ele vendeu 5 bunkers em um dia de fevereiro, a preços que variam de US$ 70 mil a US$ 240 mil.
Não há sombra de dúvida que a guerra renovou o mercado, mais uma vez apoiado na ansiedade, desespero e medo — a outra metade intrínseca do DNA humano, além do sentimento de sobrevivência a qualquer custo.