Artes/cultura
28/07/2019 às 08:00•3 min de leitura
Geralmente, quando pensamos em múmias, a primeira coisa que vem à nossa mente são aqueles corpos completamente enfaixados e preservados há milhares de anos no Egito. No entanto, existem diversos tipos de múmias e processos de mumificação pelo mundo — e um bem interessante e pouco conhecido é o das Múmias de Kabayan, uma cidade localizada na província de Benguet, nas Filipinas.
As múmias estão associadas ao povo Ibaloi, um grupo indígena que há milênios habita em Kabayan, uma região montanhosa situada no norte do país. Eles se dedicam principalmente ao cultivo do arroz e costumam ser bem hospitaleiros com os “forasteiros”. No entanto, suas terras também guardam algo curioso: uma montanha cujo cume serve de necrópole para centenas de corpos mumificados guardados em cavernas.
As Múmias de Kabayan só foram descobertas no início do século 20, quando a atividade industrial chegou a Benguet — e um grupo de madeireiros tropeçou com elas. O problema é que os corpos começaram a ser pilhados, e não demorou até o local onde a necrópole se encontra se tornar um dos sítios arqueológicos mais ameaçados do mundo.
Múmias em seus caixõezinhos
O governo filipino foi obrigado a tomar uma série de medidas para preservar as múmias, e é por isso que hoje é bem difícil encontrar a necrópole. Para começar, a localização exata do sítio é mantida em segredo pelas autoridades, mas, até onde se sabe, para chegar às múmias, é necessário enfrentar uma longa viagem de carro pelas tortuosas estradinhas da montanha — e mais 5 horas de trilha.
Por fim, quem consegue chegar à necrópole se depara com uma porção de cavernas com as entradas protegidas por grades e cadeados. Pois as múmias se encontram no interior dessas cavernas, preservadas — algumas delas há mais de 1 mil anos — dentro de estranhos caixõezinhos de madeira.
Um dos fatores que tornam as Múmias de Kabayan tão intrigantes é o ritual utilizado para preservar os cadáveres. Isso porque o processo de mumificação era iniciado enquanto a pessoa ainda estava viva! Assim, quando algum integrante da tribo Ibaloi se encontrava à beira da morte, esse indivíduo consumia uma bebida salgada que começava a desidratar seu corpo gradualmente.
Os corpos eram mumificados sentados
Após a morte, o morto era completamente lavado e colocado na posição sentada sobre uma fonte de calor para ser defumado — durante semanas e até meses inteiros. Com isso, os cadáveres iam perdendo toda a água até, eventualmente, ficarem aparentemente secos e mumificados. No entanto, os corpos não eram defumados apenas exteriormente...
Depois de finalizar a primeira etapa do processo, a seguinte envolvia defumar o interior dos corpos — e seus órgãos — também, com fumaça de tabaco introduzida através da boca dos cadáveres. Por fim, após a mumificação ser terminada, os corpos eram novamente limpos com ervas, colocados em pequenos caixões de madeira e guardados no interior de cavernas.
Mais múmias
O costume de preservar os mortos através desse elaborado processo começou a entrar em declínio por volta do século 16, quando os colonizadores europeus chegaram às Filipinas — e os habitantes locais passaram a adotar as práticas dos estrangeiros para lidar com seus mortos.
Infelizmente, conforme mencionamos anteriormente, depois de as Múmias de Kabayan serem descobertas, diversas delas foram roubadas e vendidas a preço de ouro a colecionadores internacionais. As autoridades filipinas conseguiram recuperar oito das múmias há alguns anos — as quais foram devidamente devolvidas às cavernas depois de os integrantes da tribo Ibaloi conduzirem novo ritual funerário.
Várias desapareceram
Entre elas estava a de Apo Annu, um importante líder tribal que morreu há pelo menos 500 anos e que tinha o corpo coberto de tatuagens. Investigações sobre seu sumiço revelaram que a múmia havia sido surrupiada por um pastor filipino e acabou se tornando atração de um circo de Manila. Depois, ela passou pelas mãos de diversos colecionadores até ser doada a um museu em 1984 — que notificou as autoridades e devolveu a múmia ao povo Ibaloi.
Aliás, os integrantes da tribo ficaram bem aliviados com o regresso de Apo Anu, pois, como toda múmia que se preze, ela também estava associada com uma maldição! Segundo os Ibaloi, depois do roubo do finado líder tatuado, a região foi atingida por longos períodos de estiagem, fome e até terremotos. Portanto, ainda bem que seu cadáver foi devolvido à sua caverna na montanha. Entretanto, ainda existem múmias “perdidas” por aí, o que é uma verdadeira pena.
*Publicado em 28/9/2016