Artes/cultura
31/03/2020 às 14:00•5 min de leitura
Atenção! Se você se incomoda com temas que envolvem sexo e violência ou tem menos de 18 anos, é melhor parar por aqui. Caso contrário, prossiga em nosso artigo.
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O Holocausto nazista foi marcado pela subversão dos direitos humanos e da estrutura social por si só, implementando não só uma política governamental de terror como também genocida. Nela, quem não se posicionava acabava dentro da cova mais rasa e aquele que não se encaixava nos novos “moldes” lhe era reservado um destino ainda pior.
Revelando a natureza cruel do ser humano, infelizmente o período teve mais nomes dos que contribuíram para o genocídio de milhares de pessoas dos que ajudaram. Josef Mengele, Heinrich Himmler, Karl Brandt e Phillip Bouhler foram só alguns dos que entraram para os livros didáticos e de História ao lado da figura de Adolf Hitler.
Também existiram aqueles cujos nomes não entraram para os livros exatamente, mas que foram responsáveis tanto quanto os outros por se aproveitarem da maneira mais sádica o possível da morte das vítimas. Um deles foi Ilse Koch.
Ilse Koch.
Em 22 de setembro de 1906 em Dresden (Alemanha), Margaret Ilse Kohler nasceu. Ela teve uma infância humilde quando criança e, como sempre, ninguém sequer poderia prever que ela seguiria os passos que seguiu.
A menina era adorada pelos professores na escola, sendo muito notada por ser feliz e educada. Conhecida por viver com muitos amigos ao seu redor, os seus vizinhos também não tinham o que reclamar da pequena Ilse, a qual sempre estava disposta a ajudá-los e tinha um senso de comunidade grande (este dizia ter aprendido com os pais).
Filha de trabalhador braçal e de dona de casa, assim como a maioria das garotas alemãs, Ilse Koch aprendeu a cozinhar, limpar e cuidar de uma casa da forma como esperavam que ela fizesse. Entretanto, já no início de sua adolescência, tinha pensamentos que não a conectavam mais ao mundo das “jovens comuns” de sua época. Aos 15 anos de idade, ela decidiu deixar a escola e começou a trabalhar em tempo integral em uma fábrica de cigarros. Logo depois, passou a frequentar aulas de contabilidade em uma faculdade local, uma das poucas oportunidades educacionais para as mulheres da época, e acabou conseguindo uma posição como escriturária.
Provavelmente pelo fato de vir de uma família muito pobre, a mulher filiou-se cedo ao pensamento político de “restauração” da Alemanha que o Partido Nazista prometeu à classe baixa. Para os pobres e sem instrução, vivendo em um país economicamente em apuros após o resultado da Primeira Guerra Mundial, o fascismo parecia a solução de todos os seus problemas, uma vez que esse governo prometia ajudar a tirar o país da depressão em que se encontravam.
Karl e Ilse Koch
Então não demorou muito para que o extremismo pregado pela facção nazista começasse a penetrar mais profundamente na mente de Ilse, ocupando as lacunas de sua mente nas quais a vontade de ascender na economia como classe pobre estava. Ela passou a concordar muito ferrenhamente com os conceitos da eugenia e imposição de uma raça ariana dominante, compartilhando também os seus sentimentos antissemitas. No início de 1932, já tendo passado pelo Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores, a mulher ingressou de vez no Partido Nazista ao começar a trabalhar como secretária interna.
Foi por volta de 1934 que ela conheceu Karl-Otto Koch, um fraudador condenado que já havia passado por vários empregos antes de se filiar ao Partido Nazista. Com antecedentes criminais por roubo e tendo crescido como informante da polícia, Karl era quase 10 anos mais velho que Ilse e tinha acabado de se divorciar de sua primeira esposa, que não compreendia as suas filosofias nazistas.
Tudo isso foi um atrativo para a jovem mulher, que imaginou receber de Karl os privilégios que até então ela nunca havia experimentado. Então eles começaram um relacionamento.
Os portões do campo de concentração de Buchenwald.
Assim que o Hitler ascendeu ao poder, o casal foi recompensado por ter sido um dos primeiros a adotar integralmente o nazismo. Karl Koch deixou a vida de crime e passou a ocupar uma posição de oficial de alto escalão da Tropa de Proteção, a ala paramilitar de elite do Partido Nazista.
Em 1937, ele subiu de cargo e foi nomeado comandante do campo de concentração de Buchenwald, próximo a Weimar (Alemanha) e um dos maiores da época. A mensagem esculpida em gélido metal acima nos portões do campo significava "cada um por si", mas os nazistas preferiram entender “todo mundo recebe o que merece”. Isso era exatamente o que Ilse e Karl Koch achavam, pois eles haviam crescido na pobreza, mas agora eram ricos e poderosos. Esse era o destino deles e o que sempre mereceram.
Assim que começaram os trabalhos no campo de extermínio, Ilse se tornou uma espécie de diretora do local. Partiu dela a “brilhante” ideia de usar o dinheiro roubado das vítimas e os seus pertences para financiar uma arena equestre que hoje custaria cerca de US$ 1 milhão.
Durante "o reinado" total da mulher, ela chicoteava os prisioneiros enquanto cavalgava no cavalo comprado com o dinheiro deles. Estuprava homens e mulheres, jovens ou não, torturava-os e espancava-os (às vezes até a morte). Mesmo desfrutando de um luxo quase imperial, esse poder todo não bastou. Ela tinha um "hobby" e precisava começar exercê-lo.
Por terem uma “espécime interessante” de anatomia, os cadáveres de prisioneiros tatuados mortos por injeções eram encaminhados — depois que passavam pelo dispensário — para o departamento de patologia dentro do campo de Buchenwald. Uma vez lá, Ilse Koch começava a sua "diversão": esfolava cada centímetro de pele daquelas vítimas de um modo impecável para que pudesse fazer abajures, capas de livros, jaquetas, álbuns fotográficos, luvas e outros objetos (incluindo itens pessoais). Segundo testemunhas que sobreviveram a Buchenwald, o sadismo da mulher conseguia ir além quando ela extraía a pele das pessoas ainda vivas. Alguns indivíduos passavam por isso e depois eram tratados para que voltassem ao trabalho.
Foi por essas e outras atividades de Ilse Koch que rapidamente ela ficou conhecida como "a bruxa de Buchenwald", tendo a ousadia de cerrar as janelas de sua mansão dentro do campo de concentração com cortinas feitas com pele costurada.
Ilse Koch presa.
Em 1943, ironicamente, o casal Koch foi preso por seus superiores da Tropa de Proteção do Partido Nazista devido à apropriação indevida de fundos e também por métodos exagerados de tortura — como se existisse um meio termo para isso! Em 1944, o juiz nazista concluiu que Ilse era apenas manipulada, enquanto Karl era o verdadeiro culpado. Por isso, a mulher foi liberada, e o homem foi condenado à morte por seus crimes. Em 1945, ele foi executado a tiros pelo pelotão de fuzilamento nazista.
Com dois filhos nos braços, Ilse Koch seguiu a sua vida sem demonstrar um pingo de arrependimento por depositar tudo nas costas de seu marido. O mais importante é que ela estava livre para ir e vir novamente.
No mesmo ano, as tropas americanas invadiram o campo de Buchenwald. Ali eles descobriram a mansão de Ilse Koch, onde estava localizado o império de peles e membros decepados dos prisioneiros assassinados dentro do campo de concentração. Estava tudo conservado em aquários e redomas de vidros.
Após coletar o testemunho dos sobreviventes, o Tribunal Geral do Governo Militar para o Julgamento de Criminosos de Guerra prendeu Ilse Koch por seus crimes contra a humanidade. Durante o julgamento, ela insistiu que todos os objetos eram feitos de pele de cabra e não de humanos, embora muitos deles tivessem as tatuagens das vítimas. Apesar de toneladas de fotografias, não haviam provas de que a mulher ordenasse a criação desses objetos. Era a palavra dela contra a dos sobreviventes.
Em 1947, ainda presa, ela deu à luz ao Uwe Kohler e foi forçada a entregá-lo para a adoção, assim como os seus outros filhos. O governador militar dos Estados Unidos, o General Lucius D. Clay, não acreditava que tinham provas físicas o suficiente para sentenciar Ilse à morte. Ele só podia dar a ela anos de trabalho duro e um tempo encarcerada. A Alemanha, no entanto, assim que a mulher saiu da prisão, julgou-a por seus crimes e condenou-a pela terceira e última vez, só que com uma sentença perpétua.
Uwe Kohler, o filho que ela foi forçada a dar, nunca conseguiu ser adotado. Quando estava com 19 anos, vendendo jornais nas ruas, ele foi buscar saber quem foi a sua família. Ele fez várias visitas à mãe, que, abusando da carência do garoto abandonado, fez de tudo para fazê-lo acreditar na inocência dela. E, quando isso aparentemente deu certo, a mulher pediu a Uwe que contratasse um advogado para libertá-la.
Quando ela percebeu que o filho não seria capaz e, portanto, tinha falhado em manipular a última pessoa no mundo que a considerava, Ilse Koch cometeu suicídio — era 1967 e ela tinha 61 anos. Foi atribuído ao seu nome a mesma frase entalhada nos portões do campo de Buchenwald, a qual era deliberadamente distorcida a favor dos nazistas da época: “Todo mundo recebe o que merece”.