A triste história do “fantasma” de Manzanar

22/02/2021 às 04:004 min de leitura

ATENÇÃO: esse texto pode trazer conteúdos sensíveis por abordar um caso real.

Assim que o Pearl Harbor foi atingido, em 7 de dezembro de 1941, dando início a Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos já teve que lidar com o que intitularam como “o problema japonês”, que eram os cidadãos imigrantes que moravam principalmente na costa oeste do país.

Uma vez que eles se tornaram uma “ameaça ao patriotismo” vivo dos nascidos norte-americanos, que temiam que eles pudessem organizar algum tipo de ataque interno, no mesmo dia o Departamento Federal de Investigação (FBI) prendeu cerca de 5.500 cidadãos issei, como parte do processo de agrupar os povos “inimigos”.

Já em 19 de fevereiro de 1942, o então presidente Franklin Roosevelt assinou a chamada Ordem Executiva 9066, que autorizava que comandantes militares indicassem áreas onde havia agrupamentos de habitantes japoneses para que fossem removidos de lá. A ordem também autorizava a construção de “centros de realocação” para abrigar esses “páreas da sociedade”.

(Fonte: Britannica/Reprodução)
(Fonte: Britannica/Reprodução)

Ao total, aproximadamente 120 mil nipo-americanos foram encarcerados ao longo dos 10 centros de concentração espalhados pelo interior dos Estados Unidos, longe da costa e assim impossibilitando ataques ou qualquer tipo de resgate pelas tropas japonesas.

Em 21 de março de 1942, o Centro de Realocação de Guerra de Manzanar foi o primeiro campo a ficar pronto a mando da Autoridade de Realocação de Guerra (WRA), e passou a ser operado pela Administração de Controle Civil em Tempo de Guerra (WCCA), uma instituição do Exército dos Estados Unidos. Cercado por 8 torres de guarda equipadas com metralhadoras, dentro de um perímetro cercado por muros altos e cheios de arame farpado, ele ficava entre a cidade de Long Pine e a região censitária de Independence, no estado da Califórnia.

A tempestade

Giichi Matsumura. (Fonte: The Guardian/Reprodução)
Giichi Matsumura. (Fonte: The Guardian/Reprodução)

Em 1945, os residentes do centro de realocação de Manzanar já eram permitidos a deixar a instalação se quisessem, porém a maioria das famílias não tinham mais casas para onde retornar, tampouco como se sustentar, por isso decidiram ficar por lá mesmo. A família de Giichi Matsumura foi uma delas.

Em 2 de agosto de 1945, o homem de 46 anos decidir se juntar a um grupo de 10 homens que iam pescar nos lagos da Montanha Williamson, próximo à cordilheira da Sierra Nevada. Em certo momento, ele acabou se separando deles para poder desenhar a paisagem, que alguns de seus amigos alegaram que era um hobby que ele havia assumido em seus anos atrás dos muros de Manzanar.

(Fonte: Mainichi/Reprodução)
(Fonte: Mainichi/Reprodução)

Então, uma tempestade caiu de repente, ilhando o grupo em um ponto da montanha. Depois que a chuva torrencial passou, eles tentaram encontrar Matsumura, porém não tiveram sucesso. Já sem vida, ele só foi encontrado em 3 de setembro daquele ano por um casal que morava nas redondezas e costumava caminhar pela montanha.

Os oficiais não permitiram que o cadáver de Matsumura fosse retirado do local, apenas que algumas pessoas prestassem suas condolências e realizassem seu enterro lá mesmo.

Em 21 de novembro de 1945, o campo de Manzanar foi fechado definitivamente pelo governo dos Estados Unidos, lançando seus habitantes ao futuro incerto. A família do homem enterrado na montanha voltou para Santa Monica, sem sequer poder levar os restos mortais dele consigo.

Ossos sob pedras

(Fonte: ABC/Reprodução)
(Fonte: ABC/Reprodução)

Em 7 de outubro de 2019, os alpinistas Tyler Hofer e Brandon Follin caminhavam pela rota íngreme do Passo Shepherd, no Monte Williamson, quando Hofer se deparou com algo que parecia ser um osso despontando sob algumas pedras.

À princípio, assim que se aproximaram, eles acharam que estavam olhando para os restos mortais de um animal, visto que há 2 anos uma manada de cervos migrantes caiu para a morte em uma das encostas geladas da montanha. Contudo, Hofer descartou a possibilidade assim que avistou um crânio humano.

Os alpinistas removeram as pedras até que encontrassem um esqueleto intacto, que possuía até um cinto ao redor da cintura e sapatos de couro nos pés. Os braços estavam cruzados sobre o peito em uma posição encolhida, como se quisesse se preservar de algo, provavelmente do frio.

(Fonte: Rafu Shimpo/Reprodução)
(Fonte: Rafu Shimpo/Reprodução)

Hofer e Follin alertaram os oficiais do Gabinete do Xerife do Condado de Inyo sobre a descoberta. Enquanto a ossada era resgatada, policiais vasculharam seus registros em busca de depoimentos de pessoas desaparecidas nas últimas décadas, porém não encontrou nada.

Foi só depois que eles viram por acaso o documentário The Manzanar Fishing Club, lançado em 2012, e ficaram sabendo da história de Matsumura, que chegaram à conclusão de que poderia ser ele.

O fantasma de Manzanar

Lori Matsumura. (Fonte: ABC/Reprodução)
Lori Matsumura. (Fonte: ABC/Reprodução)

Lori Matsumura, a neta de Giichi, relatou à Associated Press que ficou chocada quando o sargento Nate Der, do Gabinete do Xerife do Condado de Inyo, entrou em contato com ela para dizer que acreditava que eles tinham encontrado os restos mortais de seu avô.

“Foi uma espécie de redescoberta. Afinal, nós sabíamos onde ele estava aproximadamente porque conhecíamos a história do que aconteceu”, declarou Lori em entrevista.

Em 3 de janeiro de 2020, o resultado do teste de DNA deu positivo, confirmando que a ossada na montanha de fato era de Giichi Matsumura.

(Fonte: New York Post/Reprodução)
(Fonte: New York Post/Reprodução)

De acordo com Lori, ela sempre foi assombrada pela foto que sua avó, Ito Matsumura, lhe mostrava de uma pilha de pedras onde seu avô estava enterrado nas montanhas remotas. “De vez em quando, ela mostrava e dizia: ‘Oh, isso é tudo o que eles trouxeram do seu avô’. E minha tia Kazue dizia: ‘Não mostre essa foto a ela’. Eu ficava assustada”, revelou a mulher.

O fato de que Giichi Matsumura nunca foi propriamente velado e enterrado sempre pairou como uma sombra na história da família, principalmente por ter provocado a eterna tristeza de Ito. O sentimento de abandono era tão grande que o avô ficou conhecido como “o fantasma de Manzanar”.

Ito Matsumura morreu em 2005, aos 102 anos, com a sensação de que o marido não havia falecido. A irmã dele, Kazue Matsumura também achava o mesmo. “Parece que ele foi a algum lugar e ainda não voltou. Não parece que ele morreu para mim, porque eu nunca vi o seu corpo”, confessou ela ao Manzanar National Historic Site, dois anos antes da descoberta dos alpinistas e no ano de sua morte.

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