Ciência
16/04/2018 às 09:04•3 min de leitura
Existem ditados impossíveis de serem ditos se não em sua língua original: você consegue imaginar como é “Enfiar o pé na jaca” em inglês? E você pensa que “A piece of cake”, em inglês, é só “um pedaço de bolo”? A maioria dessas expressões se restringe a seu próprio idioma, com poucas exceções. Uma delas é “Vender a alma ao Diabo”, que é reconhecível em várias línguas.
A origem da expressão é um pouco incerta, provavelmente há algumas centenas de anos com o mito de Fausto: a história do homem que querendo ter mais conhecimento do que realmente possui, acaba por evocar espíritos e Mefistóteles (o demônio “inimigo da luz”) para poder viver sem envelhecer.
No mito, Fausto passa a ser servo do Diabo pelo tempo que dura o contrato, ou seja, 24 anos, com o tinhoso ajudando em tudo o que o cara pedisse, sabendo que ao final teria a sua alma aprisionada. Fausta, porém, acaba se apaixonando e tentando desfazer o acordo, mas, é claro, não consegue.
Doutor Fausto assinando o contrato com o Diabo usando seu próprio sangue
Nascido por volta de 1480, Johann Georg Faust é supostamente a fonte inspiradora da lenda sobre o homem que vendeu a alma ao diabo. O cara era astrólogo, alquimista e mago, tendo sido contemporâneo a dois fatos históricos: a invenção da imprensa, por Johannes Guttenberg, que terminou de imprimir a primeira Bíblia em 1455, e o incentivo à leitura, promovido por Martinho Lutero a partir de meados de 1515. Além disso, tanto Faust quanto Guttenberg e Lutero eram alemães.
Sobre Faust, também conhecido como Doutor Fausto, pouco se sabe. Como sua personalidade era excêntrica, contrariando a igreja e largando o título de teólogo para ser chamado de médico, fica difícil separar o mito do homem histórico. As lendas dos feitos de Fausto começaram pouco após sua morte. Um livro publicado anonimamente em 1587 contava a história de vários magos, inclusive a de Fausto, que teria vendido sua alma ao Diabo em troca de conhecimento e poder.
Em 1683, o teólogo e historiador alemão Johann Georg Neumann foi o primeiro a investir a homem histórico por traz da lenda que já durava cerca de um século na Alemanha e começava a ganhar o mundo. Curiosamente, o primeiro historiador a pesquisar a lenda do Doutor Fausto era um homônimo dele!
Johann Faust: o homem por trás do mito
Uma coisa curiosa: na época em que a lenda de Fausto começou a se popularizar, pensava-se que o Diabo caminhava pela Terra tentando os homens, ao invés de estar vivendo no calorzinho do Inferno. Várias lendas em torno do tinhoso surgiram desse período, com o “coisa ruim” sendo uma presença quase física na vida das pessoas. O início do protestantismo, o rompimento com a Igreja Católica e a popularização da imprensa ajudaram muito a propagar essa ideia.
Outro detalhe importante é que se acreditava que o Diabo era mais direto em suas negociações, indo ao encontro de quem o invocava – ao contrário de Deus, que você “só encontrava” através de intermediários como padres e bispos. Isso acabou popularizando a figurando do capeta.
A primeira versão do mito de Fausto, publicada em fascículos, fez o maior sucesso na Alemanha, primeiro em poemas e depois em prosa. Em menos de 5 anos, ele já havia sido traduzido para o inglês e repetindo o mesmo sucesso. Com isso, novas versões da história surgiram, até o clássico “Fausto”, que virou a obra-prima de Johann Wolfagang von Goethe, lançada em 1806, após 60 anos de trabalho.
"Fausto", de Goethe, já ganhou até versão em quadrinhos