Ciência
04/09/2021 às 06:00•4 min de leitura
Em 17 de fevereiro de 1864, às 20h45, nos mares da cruel Guerra Civil Americana, o oficial de convés John Crosby, do navio de guerra USS Housatonic, viu quando a lua invernal "pegou" a silhueta de algo se movimentando nas águas do calmo Atlântico.
No instante seguinte, enquanto a tripulação do navio subia para seus postos de batalha, houve uma destrutiva explosão a estibordo da embarcação. Em questão de poucos minutos, o imenso Housatonic já estava no fundo do oceano, levando cinco tripulantes diretamente para a morte.
Aquela foi a primeira manobra de combate do H. L. Hunley, um submarino desenvolvido pelos Estados Confederados da América, que demonstrou as vantagens e os perigos do que era uma guerra submarina. Ele foi o primeiro de seu tipo a afundar um navio de guerra. No entanto, seu fim foi tão trágico quanto o de seu alvo.
No mesmo dia que atingiu com sucesso o Housatonic, o submarino se perdeu com sua tripulação antes que pudesse voltar para a base e "colher as glórias" de seu ataque considerado épico. Porém, o que há de controverso em seu fim também está impregnado pela história de seu criador.
James McClintock. (Fonte: History Navy/Reprodução)
O designer naval James McClintock, responsável pelo desenvolvimento tanto do Hunley quanto do American Diver, a pedido do engenheiro naval confederado Horace Lawson Hunley, é motivo de confusão para os historiadores. Até hoje eles tentam determinar uma linha do tempo de sua vida e entender o depoimento feito por seu neto Henry Loughmiller acerca das circunstâncias controversas de sua morte.
Em cartas para o pesquisador Eric Eustace Williams, Loughmiller explicou que seu ancestral havia sido morto em 1879, aos 50 anos, no Porto de Boston durante uma experiência com um dispositivo altamente explosivo.
Contudo, as pessoas que conheceram McClintock, em 1879, acreditava que ele estava mais próximo da casa dos 60 anos do que dos 50, além de que a explosão que, supostamente, ceifou sua vida foi ouvida por muitas pessoas, mas apenas 1 de fato viu acontecer. Não houve inquérito e nada foi encontrado boiando nas águas.
Mas quase 1 ano e meio depois, em outubro de 1880, um homem se apresentou como James McClintock ao entrar no consulado britânico da Filadélfia para oferecer seus serviços à Rainha Vitória como agente secreto do governo.
Horace L. Hunley. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)
Mas como McClintock foi de um mero criador de submarinos, que persuadiu Horace Hunley a investir em seus projetos, a espião internacional?
No outono de 1872, ele viajou para o Canadá na tentativa de vender seus projetos de submarinos para a Marinha Real Britânica. Os oficiais que o entrevistaram se mostraram fortemente impressionados com a inteligência dele sobre os conhecimentos químicos e mecânicos relacionados aos torpedos, navios e submarinos.
Entretanto, o que levou o homem a Boston é outra história. Em 1879, ele morava em New Albany, extremo sul de Indiana (Ohio, EUA), era casado e pai de 3 filhas. Ele tinha muita esperança de fazer fortuna no obscuro mercado privado de armamento para alavancar sua experiência na construção de armas secretas.
Submarino Hunley. (Fonte: Britannica/Reprodução)
Dois anos antes, ele havia estabelecido contato com dois homens que compartilhavam das mesmas ideias: George Holgate, que começava uma carreira infame como fabricante autônomo de bombas; e o misterioso piloto JC Winward, com quem McClintock trabalhou durante a guerra.
De acordo com recortes de vários jornais da época, os homens apareceram em Boston nos primeiros dias de outubro de 1879, e depois voltaram no dia 13, fretando um veleiro com um barco a remo como bote.
Jeremiah O’Donovan Rossa. (Fonte: Mike Dash History/Reprodução)
Naquele dia, Edward Swain, um homem do Nantucket e capitão do veleiro, levou-os até um ponto próximo a Point Shirley, a leste do porto de Boston. Quando Swain foi se deitar, reclamando de enjoo, McClintock carregou até o convés um torpedo mina com 15 quilos de explosivos, gabando-se de seu poder de destruição "poderoso o suficiente para explodir qualquer frota do mundo".
No momento da explosão, Wingard relatou ao Advertiser que estava olhando para o outro lado e não viu McClintock e Swain desaparecerem. Antes de sumir de Boston com Holgate, ele relatou a imprensa que encontrou apenas uma massa de estilhaços boiando nas águas e nenhum vestígio dos dois homens.
Segundo o Philadelphia Times, Holgate foi quem acionou a polícia para contar o "incidente", após recolher todos os pertences do quarto de McClintock no hotel. A maneira como ele se comportou durante toda a apuração das autoridades mostrava apenas que ele sabia que não poderia haver um inquérito sem um corpo. Sendo assim, a polícia demonstrou pouco interesse no que havia acontecido.
O que contradiz a crença de Henry Loughmiller de que seu avô morreu naquele dia, segundo o Daily Globe, é que um caçador viu o barco a remo do veleiro onde estava McClintock, movendo-se pelas águas após a explosão. Como isso poderia acontecer se o engenheiro e o capitão estavam, aparentemente, mortos?
Ironicamente ou não, no mesmo momento em que Holgate juntou suas coisas e sumiu para Nova York, foi descoberto que um grupo dissidente de uma sociedade secreta irlandesa, conhecida como Clan na Gael, começou a planejar uma nova campanha terrorista em grande escala no continente britânico. Jeremiah O’Donovan Rossa, o líder americano, procurava arrecadar fundos para a fabricação de bombas.
(Fonte: SpaceBattles/Reprodução)
Foi depois de tudo isso que o cônsul britânico na Filadélfia, Robert Clipperton, recebeu em outubro de 1880 a visita do homem que se apresentou como James McClintock, contratado pela Skirmishing Fund, de O’Donovan Rossa, para construir 15 tipos de torpedo poderosíssimos.
Ele queria oferecer a Clipperton seus serviços como um agente duplo em troca de mais de US$ 5 mil por mês para trair seus empregadores, desacelerar o trabalho, entregar amostras de armas e garantir o não fornecimento de modelos de trabalho aos terroristas.
O capitão William Arthur chegou à Filadélfia em 5 de novembro, onde se encontrou com McClintock e recomendou seu recrutamento oficial como espião. A grande questão é que ninguém sabe até hoje se o McClintock que desapareceu em Boston era o mesmo que reapareceu no consulado, porque seu rosto não foi reconhecido.
É certo que o McClintock que se tornou espião desapareceu para sempre antes que os britânicos ou os terroristas pudessem colocar as mãos nele. Enquanto isso, o McClintock criador do Hunley nunca mais voltou para casa e foi listado como morto em Boston.
Alguns acreditam que o McClintock do consulado fosse, na verdade, Holgate, que teria o assassinado para roubar sua criação "mais destrutível da história das guerras" ou, ainda, é considerada a possibilidade de que McClintock tenha simplesmente fingido a própria morte para realizar suas ambições.
Há 142 anos que ninguém tem uma resposta certa.