Mistérios
18/08/2024 às 18:00•2 min de leituraAtualizado em 18/08/2024 às 18:00
Ter um déjà vu – aquela sensação de já termos visto ou vivido uma situação que está acontecendo no presente – é realmente bastante estranho. Quando isso nos acontece, é comum nos sentirmos confusos e perdidos.
Contudo, o déjà vu abre as portas para entendermos mais sobre os mistérios da mente. E, segundo a ciência, ele ajuda a nos compreender melhor o funcionamento de nosso sistema de memória. E, para nos aprofundarmos nisso, é necessário também olhar para o fenômeno oposto: o jamais vu (que se pronuncia mais ou menos como "jamé vi" e esse "vi" na verdade é aquele "vu" feito com biquinho, clássico do francês).
É isso que constatou uma pesquisa capitaneada pelo professor de psicologia Akira O'Connor, da Universidade de St. Andrews, pelo professor Christopher Moulin, da área de neuropsicologia cognitiva, da Universidade Grenoble Alpes.
Eles observaram que o fenômeno do déjà vu surge quando o parte do cérebro que detecta a sensação de familiaridade se dessincroniza da realidade. Para os pesquisadores, o déjà vu traz um sinal de alerta sobre essa estranheza, como se fizesse um fact checking da memória.
Só que os dois cientistas quiseram entender também o fenômeno oposto, chamado de jamais vu, que ocorre quando algo que se sabe que é familiar parece irreal ou novo de alguma forma. Um exemplo é quando a gente vê um rosto familiar, mas, por alguma razão, ele nos parece desconhecido.
O jamais vu é mais raro que o déjà vu, e ainda mais estranho. Quando as pessoas são convidadas a descrevê-lo, elas dão relatos desse tipo: "enquanto faço uma prova, escrevo uma palavra corretamente como 'apetite', mas continuo olhando para a palavra repetidamente porque tenho dúvidas de que ela pode estar errada".
Ainda não se sabe muito sobre o jamais vu. Mas, segundo O'Connor e Moulin, essa é uma experiência que pode ser reproduzida artificialmente. Eles fizeram isso por meio de um instrumento conduzido com 94 estudantes universitários que passaram um tempo escrevendo repetidamente as mesmas palavras.
Em seguida, eles fizeram os participantes começar a escrever as palavras o mais rápido quanto fosse possível. Eles só poderiam parar se sentissem estranhos, entediados ou se a mão começasse a doer. A opção mais escolhida para parar a escrita foi a sensação estranha (70% relataram isso). Isso costumava acontecer após cerca de 1 minuto, com 33 repetições de uma mesma palavra, que passava a parecer estranha.
Consultados sobre as suas sensações, os participantes disseram coisas como "as palavras perdem o significado quanto mais você olha para elas" e "não parece certo, quase parece que não é realmente uma palavra, mas alguém me enganou e me fez pensar que é".
O'Connor e Moulin publicaram seus resultados, concluindo que os estudantes tiveram temporariamente uma "perda do poder associativo" com as palavras, quando elas começaram a parecer estranhas. "Jamais vu é um sinal para você de que algo se tornou muito automático, muito fluente, muito repetitivo. Ele nos ajuda a 'sair' do nosso processamento atual, e a sensação de irrealidade é, na verdade, uma verificação da realidade", anotaram os pesquisadores.
Segundo eles, é normal que isso aconteça. "Nossos sistemas cognitivos devem permanecer flexíveis, permitindo que direcionemos nossa atenção para onde for necessário, em vez de nos perdermos em tarefas repetitivas por muito tempo", concluíram.