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100 dias de morte: o genocídio de Ruanda, ignorado pelo mundo

30/11/2018 às 10:013 min de leitura

Embora a ideia de um genocídio possa parecer coisa do passado, nossa história moderna conta com um massacre sinistro, de proporções gigantescas. De abril a junho de 1994, estima-se que pelo menos 800 mil ruandeses, a maioria de origem tutsi, foram assassinados ao longo de 100 dias.

Localizado na África Central, Ruanda possui – como muitos países africanos – uma história de colonização. Primeiro vieram os alemães, em 1894: à época, o rei ruandês submeteu-se a eles sem resistência. Assim, o país passou a integrar o protetorado alemão. Mais tarde, durante a Primeira Guerra Mundial, tropas belgas expulsaram os alemães e tomaram o controle do território de Ruanda.

Uma nação dividida

Foi durante esse período de colonização que as tensões étnicas do país começaram a piorar. Embora falassem a mesma língua, habitassem as mesmas áreas e tivessem tradições similares, as duas etnias presentes no território sempre estiveram em atrito. A divisão entre hutus, parte majoritaria da população, e uma minoria tutsi existia antes da colonização, mas se agravou diante de algumas políticas colonialistas. Em 1916, a administração belga instituiu carteiras de identidade classificadas por etnia.

A segregação dos hutus e tutsis não parou por aí – os colonizadores consideravam os tutsis superiores aos hutus, por isso, ao longo dos mais de 20 anos que se seguiram, os membros da minoria tiveram melhores empregos, educação e uma série de oportunidades.

Essa preferência teria existido em razão do diferente modo de vida dessas etnias. Enquanto os hutus, primeiros habitantes da região, seriam mais voltados à produção agrícola, os tutsis eram criadores de gado – o que teria lhes proporcionado mais riqueza e, consequentemente, mais posições de poder.

A insatisfação se espalhou com o passar dos anos e, em 1959, os hutus deram início a uma violenta revolução. Mais de 20 mil tutsis foram mortos e outros muitos fugiram, buscando refúgio nos países vizinhos. Pouco tempo depois, ainda nesse constante clima de tensão, os belgas saíram de cena, declarando a independência ruandesa em 1962.

Independência e guerra civil

Sob o governo dos hutus, Ruanda tornou-se efetivamente palco de uma guerra entre as etnias. O conflito aconteceu em 1990, com uma série de retaliações dos tutsis exilados. Sob o comando de Paul Kagame, a Frente Patriótica Ruandesa (FPR) – composta por tutsis e hutus moderados – invade o país a partir de Uganda e dá início a uma guerra civil.

Com uma forte crise econômica de pano de fundo, os confrontos seguiram até agosto de 1993. Após muitos ataques e meses de negociação, o então presidente ruandês Juvenal Habyarimana, um hutu, assinou um acordo de paz. A conciliação não durou muito: em abril de 1994, um atentado derrubou o avião em que Habyarimana e outros líderes políticos da região estavam.

Ainda hoje não se sabe exatamente quem foi o responsável pela morte do presidente. Ambos os lados se acusaram, chegando ao estopim que deu início ao genocídio ruandês. Menos de uma hora após a queda do avião, a capital de Ruanda, Kigali, já estava tomada por uma onda de prisões e mortes tutsis, iniciada pela guarda presidencial. O caos se espalhou rapidamente pelo restante do país, incitando a violência generalizada.

O genocício

Lideranças políticas foram brutalmente mortas junto com suas famílias; os assassinatos também aconteceram entre vizinhos ou mesmo familiares. Muitos civis participaram do massacre por pressão do governo, ou mesmo daqueles ao seu redor. Outros receberam incentivos, como água e comida ou os bens daqueles que matavam. Bloqueios foram organizados, resultando na morte de qualquer ruandês que portasse a classificação tutsi em sua identidade. Centenas de mulheres tutsis foram aprisionadas e feitas de escravas sexuais.

Um dos piores massacres aconteceu na Igreja de Ntarama, a 40 minutos de Kigali. Procurando refúgio, muitos tutsis se abrigaram em igrejas na esperança de que esses espaços seriam respeitados. No entanto, em 15 de abril de 1994, militantes hutus entraram no local assassinando a maior parte dos presentes. Os corpos só foram encontrados três meses depois e removidos apenas no ano seguinte. Hoje, a igreja foi convertida em um memorial, que abriga mais de 6 mil vítimas.

Sem ação

Antes do início do genocídio em Ruanda, forças das Nações Unidas (ONU) e da bélgica estavam instaladas no país. Proibidas de usar sua força militar, as tropas da ONU estavam em missão de paz desde outubro de 1993. Com a morte de dez belgas em 1994, ambos os grupos foram retirados de Ruanda.

Envolvidos em outro conflito recente na África, os Estados Unidos também decidiram não auxiliar na questão. A França foi o único país diretamente ligado à situação: aliadas do governo hutu, tropas francesas foram enviadas a Ruanda em junho de 1994. A ideia era estabelecer zonas de segurança, que, se por um lado salvaram vidas, também permitiram que agressores escapassem.

Um ponto final?

Com ajuda do exército de Uganda, a FPR foi gradualmente conquistando territórios. Em julho, a Frente conseguiu tomar a capital de Kigali – ação que impôs o fim da matança. Estima-se que, com a vitória da FPR, 2 milhões de hutus tenham fugido por medo de retaliações.

Por fim, o líder da FPR, Paul Kagame, tornou-se presidente. Desde então, o governo ruandês adotou uma série de medidas para acabar com os conflitos causados pelas diferenças étnicas: não há mais diferenciação nas carteiras de identidades, e discursos de ódio sobre etnias são passíveis de prisão. No entanto, muitas são as críticas às políticas governamentais.

Juridicamente, os líderes e organizadores do genocídio foram julgados por um Tribunal Criminal Internacional. Para aqueles que foram linha de frente do genocídio, adotou-se um sistema de justiça comunitária, chamado gacaca. A ideia era julgar os muitos criminosos, mas ao mesmo tempo promover o perdão e a reconciliação em suas comunidades. Mais de 1 milhão de pessoas foram julgadas por 1,2 milhão de casos, distribuídos em 12 mil tribunais comunitários.

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