Saúde/bem-estar
07/04/2014 às 10:38•3 min de leitura
Antes de poder ser utilizados em e por humanos, medicamentos, tratamentos, dispositivos médicos etc., deveriam passar por exaustivos testes. Afinal, como saber se uma substância realmente é eficaz no combate a determinada doença e não traz mais efeitos colaterais do que benefícios ou, ainda, se determinada tecnologia é mais vantajosa e oferece mais precisão nos diagnósticos, por exemplo?
Você inclusive já deve ter ouvido o termo “ensaio clínico” muitas vezes, especialmente quando vemos notícias sobre laboratórios envolvidos em escândalos ou que foram invadidos por militantes. Mas, o que você sabe a respeito deles? Será que todos os medicamentos e tecnologias realmente são testados tão exaustivamente assim? E quem são os indivíduos que participam dos ensaios?
O pessoal do site io9 conversou com Molly Maloof, médica e consultora de tecnologias da área da saúde, que explicou algumas questões relacionadas com os ensaios clínicos e que nem todo mundo conhece. Confira:
Fonte da imagem: Reprodução/io9
Nem sempre quem participa dos ensaios são as pessoas que vão se beneficiar dos tratamentos. É bastante comum que, especialmente nas fases iniciais, os grupos testados sejam mais limitados, pois, dessa forma, é possível controlar melhor as variáveis envolvidas e, assim, simplificar o processo. Afinal, se um participante apresentar algum problema no decorrer dos testes, é necessário saber se é devido à substância administrada ou não.
Portanto, de acordo com Maloof, muitas vezes as mulheres não participam dos ensaios devido às variações hormonais que elas sofrem e que poderiam interferir com o medicamento testado, assim como pessoas com doenças pré-existentes. Isso sem falar que muitas vezes os estudos são realizados em outros países — e não os de origem do laboratório responsável pela droga —, o que significa que o grupo étnico testado também é limitado.
Fonte da imagem: Pixabay
Apesar de não existir nada de errado com isso, limitar o grupo de participantes — para obter os melhores resultados — pode significar que uma droga destinada a senhorinhas com problemas de pressão alta tenha sido testada em rapazes saudáveis e fisicamente ativos de 25 anos de idade e com estilos e condições de vida bem diferentes às do grupo para o qual o medicamento será utilizado.
Assim, apesar de os estudos serem válidos mesmo quando conduzidos dessa forma, ao reduzir as variáveis para ajudar na compreensão do funcionamento das novas drogas, os resultados podem não ser os esperados quando o medicamento é utilizado por uma amostragem maior — e mais variada — de indivíduos.
Fonte da imagem: Reprodução/io9
Enquanto que há alguns anos quem conduzia os ensaios eram os cientistas envolvidos no desenvolvimento de determinada droga, hoje em dia, quem está assumindo esse trabalho são laboratórios especializados nessa atividade. O problema é que muitas vezes, quando a substância testada não tem o resultado esperado para o fim ao qual ela foi desenvolvida, essas companhias realizam ajustes para comprovar se ela pode ser empregada para outra finalidade.
Então, imagine que determinada substância está sendo testada para ser usada como um potente analgésico. No entanto, durante os ensaios fica claro que esse elemento não é tão eficiente como se pensava. Nesse caso, os estudos podem parar nesse ponto ou continuar para avaliar se o medicamento pode ser empregado em casos menos severos de dor ou para tratar casos específicos.
Segundo Maloof, graças a essa “adaptação”, determinados ensaios clínicos estão se transformando em uma espécie de levantamento guiado sobre o que os medicamentos podem fazer. Um aspecto positivo dessa abordagem é a possibilidade de poder frear o avanço de testes com substância que não funcionam — e assim economizar tempo e dinheiro — e permitir que os pesquisadores foquem em usos específicos de novas drogas.
Fonte da imagem: Reprodução/io9
Atualmente, entre 80 e 90% dos ensaios clínicos são financiados pela indústria privada, o que significa que deslizes éticos podem acontecer no decorrer do processo. Afinal, por mais correta e cheia de princípios que uma fabricante seja, o objetivo, no fim das contas, é lucrar. E quanto antes um medicamento chegar ao mercado, melhor.
Segundo Molly Maloof, o problema com isso é que, na pressa de se lançar um novo produto no mercado, nem sempre todos os riscos associados com as novas drogas são conhecidos pelos profissionais de saúde, por mais eficazes que elas sejam. Maloof citou o exemplo do cloridrato de oxicodona, uma substância muito efetiva no tratamento da dor crônica, mas que pode ser muito aditiva.
Fonte da imagem: Reprodução/io9
Isso porque, ao contrário de outros medicamentos para a dor, não existe uma dose limite para o cloridrato de oxicodona, ou seja, quanto maior a quantidade utilizada, maior será o alívio. Outra característica dessa substância é o seu mecanismo de ação, que funciona através da liberação do princípio ativo ao longo do tempo. Contudo, se essa droga não for administrada corretamente, ela se torna extremamente viciante.
O que aconteceu no caso do cloridrato de oxicodona foi um enorme aumento nos casos de abuso, tanto por parte de pacientes como de usuários de drogas recreativas. Entretanto, apesar de tudo, não se tratou de um problema de má fé da fabricante — afinal, o medicamento é eficaz, ainda que viciante —, mas da falta de treinamento do pessoal médico para saber lidar com essa situação específica, reconhecendo os sinais de dependência antes de prescrever o remédio.