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19/01/2021 às 15:00•3 min de leitura
Era 1284, quando a cidade de Hamelin, na época um porto próspero às margens do Rio Weser, na Baixa Saxônia (Alemanha), passou a sofrer com uma incontrolável infestação de ratos. Os habitantes começaram a se desesperar porque os animais comiam as barcas cheias de milho e trigo, os bolos, os pães e o que mais havia pela frente, além de espalharem pulgas por toda a parte, tornando a cidade um verdadeiro inferno.
O prefeito então anunciou que premiaria com mil florins (moeda de ouro) quem conseguisse livrar Hamelin daquela peste desesperadora. No dia seguinte, um homem que não era familiar pela cidade vestido em roupas coloridas surgiu alegando ser um caçador de ratos. Incentivado pelo prefeito, ele tirou uma flauta do bolso e começou a tocar uma melodia.
Os habitantes de Hamelin assistiram, admirados, a milhares de ratos saírem aos atropelos das casas e comércios e, estranhamente, seguirem o som que o flautista produzia. O homem misterioso conduziu os camundongos para fora da cidade em direção ao Rio Weser, onde se lançaram e morreram afogados.
Assim que o flautista voltou à praça da cidade para coletar o seu prêmio, o prefeito apenas riu de sua cara e lhe deu 50 florins, além de acusá-lo de ter trazido os ratos com aquela sua “mágica”. Antes de ir embora enraivecido, o homem prometeu que se vingaria de toda a Hamelin pelo desprezo.
Em 26 de junho de 1284, dia de São João e São Paulo, quando os adultos estavam na igreja celebrando, o flautista voltou vestido de verde e tocou uma melodia diferente. Dessa vez, no entanto, não foram os ratos que começaram a segui-lo, mas sim as crianças: um total de 130 pequenos foi atrás do flautista e desapareceu para sempre após entrar em uma caverna.
Essa é a história do popular e perturbador Flautista de Hamelin, um conto do folclore europeu que ensinou a várias gerações o preço da ingratidão. Os notórios irmãos Grimm foram os responsáveis por terem reescrito a história pela primeira vez, em 1816, a partir do que o escritor Goethe havia retratado em seu livro 13 anos antes.
O conto do Flautista foi destacado em um vitral colocado na Igreja St. Nicolai, em Hamelin, por volta de 1384, mas que foi destruído em 1660. O historiador Hans Dobbertin se encarregou de reconstruí-lo na era moderna.
A história sobreviveu por meio do boca a boca dos cidadãos, que foram passando-a para seus filhos e netos como um conto de moral. Contudo, O Flautista de Hamelin não é mais considerada apenas uma fábula, pois há indícios claros de que foi inspirada em um fato. De acordo com o manuscrito de Luneberg do século XV, os versos se referem a 130 crianças ou jovens que teriam desaparecido em 26 de junho de 1284.
Entre centenas de especulações que surgiram ao longo dos anos, a principal teoria sustentada pelos historiadores e desenvolvida pelo linguista alemão Jürgen Udolph, é de que os jovens da cidade fizeram parte de uma migração de alemães para a Europa Oriental devido a uma depressão econômica. O Flautista seria a representação desse “recrutador” com roupas chamativas que tocava um instrumento para atrair a atenção de novos colonos.
Udolph sugere que essas pessoas tenham ido para regiões ao redor de Berlim, como Uckermark e Prignitz, já que existem muitos nomes na cidade que eram comuns apenas em Hamelin. A teoria é reforçada pelas evidências de que a região estava pronta para a colonização alemã na época, pois havia sido recém-libertada dos dinamarqueses.
A teoria de que O Flautista seria uma alegoria que representa a morte devastadora da época, causada por constantes epidemias, ainda existe. Há também a crença de que as crianças tenham sido submetidas à fracassada Cruzada das Crianças de 1212, quando foram vendidas como escravas para um recrutador da região Báltica da Europa Oriental (uma prática bem comum para a época), e que morreram. Os historiadores, porém, consideram essas teorias mais fantasiosas e repletas de falhas históricas e evidências.
Seja qual for a melhor explicação, o conto “O Flautista de Hamelin” ainda é misterioso e faz parte de uma herança cultural conhecida e respeitada no mundo. É por isso que a rua em Hamelin onde as crianças se reuniram em procissão atrás do flautista atualmente é chamada de Bungelosenstrasse, algo como “rua sem bateria”, em alemão, onde ninguém tem permissão para tocar música ou dançar em homenagem àqueles que saíram e nunca mais voltaram.