Ciência
09/06/2021 às 12:00•2 min de leitura
Em 2013, o pesquisador Marcelo Zelic, vice-presidente do grupo Tortura Nunca Mais, estabelecido em São Paulo, encontrou o notório Relatório Figueiredo, perdido há 40 anos em meio aos arquivos do Museu do Índio, no Rio de Janeiro, quando muitos pesquisadores acreditavam que ele havia sido destruído no incêndio do Ministério da Agricultura, às vésperas da Comissão de Inquérito de Figueiredo.
O documento é uma relação de mais de 7 mil páginas elaborada em 1967 pelo procurador Jader de Figueiredo Correia a pedido do Ministro do Interior Afonso Augusto de Albuquerque Lima, onde consta uma série de atos de violência praticados pelos latifundiários brasileiros e funcionários do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) – órgão antecessor à Fundação Nacional do Índio (Funai) – contra os povos indígenas entre as décadas de 1940 a 1960.
Ele expõe toda a maneira como o ataque aos índios foi institucionalizado através de métodos de tortura, escravização, genocídio em massa, guerra bacteriológica e química, abusos sexuais, prostituição e exploração do patrimônio indígena perpetrado pelos funcionários do SPI. Tudo por causa de um sistema de corrupção, deixando claro que o órgão não visava preservar os direitos e nem a vida desses povos.
(Fonte: Correio Brasiliense/Reprodução)
Naquela época, Jader Figueiredo era uma figura que não agradava nenhum partido de esquerda ou direita, porém isso não o impediu de ser convocado para o trabalho, ainda que todas as acusações que ele expôs ao mundo com seu relatório tenha o colocado contra o regime militar.
A barbárie cometida pela corrupção endêmica de um órgão que deveria proteger os interesses dos índios, teve uma repercussão forte fora do Brasil, chegando a sair na capa do The New York Times e na revista alemã Der Spiegel. O governo, por sua vez, fez de tudo para tentar minimizar o escândalo, o que também foi denunciado pelo documentário de 1970 da Aeronáutica, apontando que a matança dos índios foi neutralizada e desmoralizada pelas atividades das autoridades brasileiras.
A gravidade do Relatório Figueiredo explica o motivo de ele ter ficado escondido das vistas do público até muito recentemente. “O fato de ele ter permanecido oculto nas bases de dados da história brasileira foi intencional”, acusou Fernando Antônio de Carvalho Dantas, professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás.
(Fonte: Campo Grande News/Reprodução)
A infração de todos os direitos humanos que consta nas páginas do relatório foram analisados pela Comissão Nacional da Verdade, que reconheceu que tribos inteiras no Maranhão foram completamente dizimadas, e que o ataque promovido aos índios cintas-largas no Mato Grosso deixou apenas dois sobreviventes.
Até hoje, das 130 pessoas que Jader Figueiredo acusou em seu relatório ao Estado, nenhuma foi julgada devido à Lei da Anistia aprovada no fim da ditadura, que impede julgamentos para crimes que aconteceram naquele período.