Artes/cultura
05/01/2022 às 02:00•2 min de leitura
Emma Livry (1842-1863) era uma lenda de seu tempo. Com apenas 20 anos e uma das pupilas da notória bailarina Marie Taglioni (1804-1884), ela foi uma das últimas bailarinas da era do balé romântico, tornando-se uma das figuras mais emblemáticas de seu tempo — principalmente pela maneira como morreu.
Era 15 de novembro de 1862 quando Livry ensaiava os passos do segundo ato da protagonista Fenella do espetáculo La Muette de Portici e seu tutu pegou fogo ao encostar em uma das muitas lâmpadas a gás alinhadas na beirada do palco.
Emma Livry. (Fonte: Pinterest/Reprodução)
A jovem francesa correu em chamas pelo palco três vezes antes de ser parada por bombeiros e outros dançarinos para que o fogo fosse apagado. Seu corpo ficou totalmente queimado. O rosto e os seios foram os únicos que não sofreram danos significantes, mas as coxas, a cintura, as costas, os ombros e os braços quase derreteram com o calor.
Em um ato desesperado e equivocado, Taglioni esfregou graxa de maquiagem nas feridas, achando que funcionaria como pomada. Não adiantou. Livry sofreu por meses enquanto era tratada, mas as feridas continuaram reabrindo. Da última vez, ela não aguentou e sucumbiu à septicemia, morrendo em 26 de julho de 1863 em Neuilly-sur-Seine, na França.
Livry estava longe de ser a única que sofreria do que foi chamado "holocausto de bailarinas".
(Fonte: Tidings of Yore/Reprodução)
A morte de Livry e de centenas de bailarinos e bailarinas poderia ter sido evitada. Em 1859, um decreto imperial em Paris havia estabelecido que os trajes de balé deveriam ser carteronizados, ou seja, mergulhados em um composto químico conhecido como alume para protegê-los de pegar fogo.
No entanto, isso tornava os figurinos desbotados, rígidos e limitava a mobilidade, portanto a maioria das bailarinas se opunha à ideia de utilizá-los. Inclusive, mesmo com todo o sofrimento que passou, Livry disse que não usaria saias à prova de fogo porque eram muito feias e nada práticas, preferindo se arriscar novamente do que vesti-las no palco.
(Fonte: The Civil War/Reprodução)
Para muitos historiadores, essa estética que custou a vida de tanto profissionais marca uma diferença definitiva entre o antigo mundo do balé, em que os bailarinos detinham mais poder, e o novo, no qual o poder está nas mãos dos diretores. Há boatos de que esse passado inflamável da profissão tenha catalisado a mudança, privando os bailarinos de recusarem certos aspectos e regras.
Em outra versão da história, pode ser que muitas bailarinas tenham morrido não porque decidiram se arriscar com seus figurinos inflamáveis, e sim por ser uma ideia interessante para gerentes e diretores de espetáculos por acrescentar uma sensação real de perigo a cada apresentação. Afinal, a criação de materiais à prova de fogo já estava em andamento na indústria cinematográfica desde meados de 1600, portanto poderiam ter sido implementados anos antes.
De qual lado está a verdade?