Artes/cultura
23/05/2023 às 02:00•2 min de leitura
Peter Stanford, autor do sucesso de vendas The Devil: A Biography (1996), descobriu que a sociedade é mais interessada em Satanás do que em Deus e é por isso que, historicamente, todo o mal do mundo, causado pelos próprios humanos, é atribuído constantemente à sua imagem.
Foi a Igreja que deu força a isso, sobretudo ao cunhar um rosto e uma personalidade a algo que era intangível. De uma serpente nas Epístolas de Paulo a um dragão no Livro do Apocalipse, Satã teve características semelhantes aos deuses pagãos que os cristãos demonizavam como sendo responsáveis pelo mal do mundo e do homem. Na arte ocidental antiga, ele foi retratado como uma criatura que tinha pernas de bode igual ao deus Pan, e pelos faciais como o antigo deus egípcio Bes. Ainda assim, sempre parecendo um homem, mesmo que diferente.
Era algo parecido com isso que a Igreja esperava quando encomendou uma escultura a Joseph Geefs, que criou a estátua mais sexy e polêmica de Lúcifer.
Joseph Geefs. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)
Em meados da década de 1840, a Catedral de São Paulo, em Liege, na Bélgica, decidiu que a base da grande escadaria da igreja precisava ser adornada com um toque gótico mais exuberante, por assim dizer. Foi quando contrataram Joseph Geefs, um talentoso e reconhecido escultor de mármore, para criar uma estátua de Lúcifer, que ele intitulou "O Anjo do Mal".
Geefs criou uma peça de aparência muito humana, um homem, sentado sedutoramente em uma rocha, com o peito nu e apenas um pedaço de pano cobrindo suas partes íntimas. Seu cabelo foi esculpido encaracolado até a altura dos seus ombros, emoldurando um rosto de expressão taciturna, cujos olhos estão voltados para baixo, com o par de asas de morcego saindo de suas costas o enquadrando como uma pintura.
(Fonte: Tumblr/Reprodução)
O escultor sabia que havia atingido seu ápice profissional entregando aquela obra, que foi inaugurada em 1842, rapidamente atraindo muita atenção para a paróquia, porém não da maneira que a Igreja imaginava. A estátua foi considerada uma distração, especificamente para as garotas jovens e as mulheres — e provavelmente para homens também — por ser uma representação "muito bonita" de Lúcifer.
A Igreja ficou horrorizada quando os paroquianos passavam mais tempo contemplando a imagem do que orando, como se o Diabo as tivessem hipnotizando e desviando do propósito sagrado. Os fiéis se ajoelhavam aos seus pés por confundi-lo com outros anjos, trocando carícias e juras de amor. Como resultado, a estátua foi removida.
O espaço vago que ficou, no entanto, nunca teve a intenção de não ser preenchido. Por isso a paróquia encomendou outra estátua, dessa vez, no entanto, pelas mãos do irmão de Geef, Guillaume. Eles esperavam que o artista refizesse a obra à altura do que a Igreja realmente pensava do malfeitor das trevas.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
Guillaume nunca concordou em substituir o trabalho árduo e irrepreensível de seu irmão. Portanto, tendo como base aquela obra-prima, ele esculpiu o seu "Gênio do Mal", uma representação ainda mais provocativa, bonita e hiper-realista do que a de Geefs.
Sua estátua era a de um Lúcifer que passava uma das mãos pelo cabelo sedoso, enquanto olhava severamente para o chão, concentrado, onde a seus pés havia algemas e correntes. Suas pernas estavam em uma posição ainda mais sedutora, ligeiramente separadas, com as asas de morcego adornadas com veias. Só para não decepcionar a Igreja, Guillaume afiou as unhas do pé da estátua para que parecessem mais com pseudo-garras.
O simples detalhe teve efeito porque a paróquia aceitou a estátua e nenhum fiel se ajoelhou mais aos seus pés, a não ser os satanistas que o fazem até hoje — e é por isso que o Vaticano está considerando excomungar a obra.