Ciência
28/09/2023 às 02:00•2 min de leitura
A visita de Mark Ludwig, violista da Orquestra Sinfônica de Boston, a um "sebo" de Nova York em 1988, resultou no resgate de um dos mais impressionantes relatos de resistência aos horrores do Holocausto. Ao ler a biografia do rabino alemão Lo Baeck, o músico ficou conhecendo a história de Terezin, na antiga Tchecoslováquia, um campo de concentração onde músicos podiam compor e executar músicas para os demais prisioneiros.
Entre os milhares de campos de concentração e de extermínio construídos pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial, Terezin se destacava por ser uma espécie de campo-modelo, funcionando perante a opinião pública internacional como uma peça de propaganda viva, para popularizar a ideia de que os nazistas estavam acolhendo judeus de forma benevolente.
Chamando o local de "campo preferencial" ou "spa", a Gestapo (polícia secreta) anunciou que Terezin abrigaria judeus idosos e também aqueles que lutaram pela Alemanha na guerra anterior. Após assinarem "contratos de compras de casas", os residentes judeus da vizinha Praga foram "contemplados" com um espaço exíguo de 60 cm de largura, onde podiam dormir com os joelhos flexionados.
(Fonte: Getty Images)
Após aquela visita à livraria durante os eventos do Carnegie Hall em 1988, Ludwig passou os 30 anos seguintes viajando dos EUA até Praga por mais de uma centena de vezes. Nessas peregrinações, pesquisou arquivos, entrevistou historiadores e sobreviventes de Terezin.
A grande questão era saber como essas pessoas conseguiam fazer música em condições tão aterradoras.
Em 1991, Ludwig fundou a Fundação de Música de Terezin (TMF), uma organização sem fins lucrativos dedicada à preservação e promoção da música criada pelos prisioneiros do campo de concentração.
Gideon Klein nasceu em Prerov, na atual República Tcheca, em 6 de dezembro de 1919. Aos seis anos, começou a estudar piano com o chefe do conservatório local e, aos onze, viajava para ter aulas de piano em Praga.
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Em uma de suas visitas periódicas a Praga, Ludwig conheceu Eliška Kleinová, irmã do compositor tcheco Gideon Klein que, mesmo em um piano quebrado, continuou compondo suas obras e quarteto de cordas em cativeiro. O jovem e talentoso músico liderou diversas atividades culturais em Terezin, mas, infelizmente, não sobreviveu ao horror nazista: transferido para Auschwitz em 1944, morreu no campo de extermínio.
Kleinová lembra que os sobreviventes de Terezin se referiam ao seu irmão como “nosso Leonard Bernstein”. Ela também conhecia muitos outros compositores que estiveram em Terezin, como Pavel Haas, Zikmund Schul, Hans Krása e Viktor Ullmann. Este último era, além de pianista, compositor e maestro, também um crítico sofisticado da atuação dos outros músicos no campo de concentração.
Dias antes de ser levado para Auschwitz, Ullmann escreveu em uma de suas resenhas: “De forma alguma ficamos sentados lamentando. Nosso desejo por cultura era igual à nossa vontade de viver”. Ainda assim, Kleinová pediu a Ludwig para não romantizar a vida dos músicos e compositores. "Isto é o que eles sabiam, isto é o que eles fizeram. Se fossem pedreiros, teriam assentado tijolos", concluiu.