Artes/cultura
03/12/2021 às 08:30•2 min de leitura
Desde que foi descoberto, em 1882, o sapo Gastrotheca guentheri chamou a atenção de pesquisadores por ter algo que parecia ser um conjunto completo de dentes em forma de adaga nas partes inferiores e superiores da sua boca, algo que seria extremamente raro entre esses anfíbios.
Em geral, dentes são compostos de tecidos específicos, como a dentina e o esmalte, e são difíceis de ser encontrados em animais como sapos e rãs pelo tamanho diminuto desses animais. Sendo assim, essa seria a única espécie de sapo, entre as mais de 7 mil existentes atualmente, com dentes verdadeiros identificados em sua anatomia na região da mandíbula.
(Fonte: Daniel Paluh/Divulgação)
"Eles são tão pequenos que têm o tamanho aproximado de um grão de areia", disse o pesquisador Daniel Paluh, da Universidade da Flórida, a respeito dos dentes dos G. guentheri. Segundo o cientista, a identificação de dentes em sapos é um processo extremamente delicado e necessita de técnicas de imagens em alta resolução.
A ausência de dentes nesses anfíbios era algo que parecia muito concreto desde os primeiros registros históricos datados de 200 milhões de anos. Uma única espécie viva com uma dentição completa, portanto, parecia improvável na melhor das hipóteses e contradizia uma teoria biológica de longa data, chamada Lei de Dollo, a qual afirma que, se uma característica complexa é perdida em um organismo, ela nunca retorna.
Por outro lado, os sapos são famosos por driblar essas regras quando o assunto é dentição. Embora a forma e a anatomia básicas do corpo tenham permanecido praticamente inalteradas desde o período Jurássico, Paluh e seus colegas identificaram que esses animais perderam e recuperaram a arcada dentária mais de 20 vezes ao longo de sua linhagem evolucionária.
(Fonte: Daniel Paluh/Divulgação)
Espécies de sapos que se alimentam de formigas e cupins costumam não ter dentes, dependendo exclusivamente de suas línguas pegajosas para capturar suas presas. Já entre as espécies desses anfíbios que costumam caçar presas maiores, existe uma fileira de dentes na parte superior da boca para evitar que o alimento escape.
Em casos muito raros, alguns sapos desenvolveram algumas presas ósseas que se projetam da mandíbula inferior e se assemelham a dentes verdadeiros, mas não têm a dentina reveladora e os tecidos de esmalte. Assim, ao contrário de uma dentição original, essas presas só crescem uma vez e não são substituídas.
(Fonte: Wikimedia Commons)
Durante décadas, ninguém esteve certo se as estruturas encontradas na boca dos G. guentheri eram de fato dentes ou ossos. Haviam dois problemas para fechar essa equação: encontrar um sapo da espécie e confirmar a presença da dentina e do esmalte.
Nativa das florestas nebulosas da Colômbia e do Equador, a última observação registrada de G. guentheri foi feita em 1996, gerando temores de que a espécie poderia estar extinta. Apesar de alguns espécimes estarem preservados em museus, os pesquisadores temiam prejudicar essas amostras durante os estudos.
Para a sorte de todos, Paluh conseguiu utilizar um embrião preservado como amostra em vez de um adulto em tamanho normal. Depois de uma série de tomografias computadorizadas, foi possível constatar que as estruturas encontradas na parte inferior da mandíbula eram, de fato, dentes verdadeiros.